Capítulo um - Esquisitão

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O caminho a pé da minha casa até o colégio não dava mais do que dez ou quinze minutos, mas eu nunca negava a carona que minha mãe me oferecia, mesmo que o trabalho dela ficasse em uma direção completamente oposta à da escola. A pequena cidade de Bela Aurora* onde sempre morei tinha um clima geralmente ameno, mas os meses de verão eram quentes, e a ideia de ficar suada e com a maquiagem borrada não era, definitivamente, uma opção.

Quando o carro parou em frente ao portão do Colégio Machado de Assis, desci, acenei para a minha mãe e irmã e, após dar uma rápida ajeitada nos cabelos longos e castanhos, comecei a caminhar em direção à escola. Mal passei pelo grande portão de ferro e avistei uma das minhas amigas no pátio.

— Ei, Elisa! — ela chamou ao também me ver, acenando alegremente.

Fui até ela, cumprimentando-a com dois beijos no rosto.

— Caiu da cama hoje, Ju?

Juliana fez careta.

— Passei o fim de semana com o meu pai. Sabe como ele é chato com horários.

— Alguém precisa ser, já que não é o seu caso nem o da sua mãe.

— Elisinha, hoje é segunda-feira, não me venha com sermões, please!

Preguiçosa, resolvi seguir a sugestão. Afinal, sabia que aquela discussão seria inútil. Conhecia Juliana e Natália – minhas duas melhores amigas – desde a creche, estudamos juntas a vida inteira, e eu sempre fui a mais disciplinada e pontual do trio. Ah, e a única que tirava notas decentes também. Não que eu fosse mega inteligente nem nada do tipo, mas pelo simples fato de ser mais atenta à aula e, ao contrário delas, gostar de estudar e prezar por boas notas. Essa talvez fosse a maior diferença entre nós, porque, no restante, tínhamos basicamente os mesmos gostos, os mesmos ídolos e opiniões constantemente parecidas.

Seguimos juntas até um banco do pátio, onde conversamos até o sinal tocar. Daí fomos para a sala e sentamos, como sempre, uma ao lado da outra, juntando as carteiras para ficarmos mais próximas.

— Você vai no meu aniversário, não vai? — Ju perguntou enquanto mexia no celular.

Tive que rir. Já estava mais do que cansada de responder a essa pergunta todo santo dia.

— Pelo amor de Deus, Ju! Ainda faltam dois meses!

— Um mês e dezesseis dias! E eu acho que já está mais do que na hora de a senhorita começar a correr atrás de vestido, sapato, escolher o penteado...

— É seu aniversário, Juliana. Não é um casamento nem uma coroação real.

— Exatamente: é meu aniversário. E será a maior festa que essa cidadezinha já viu!

Novamente ri, embora soubesse que a afirmação não era falsa. Primeiro, porque eu precisava mesmo correr atrás de vestido e sapatos novos, já que abominava a ideia de repetir roupas em eventos importantes. Segundo, porque as festas de aniversário da Ju eram sempre um acontecimento. Todos os anos os pais dela alugavam a maior casa de festas da cidade, e a coisa era tão grandiosa que nem mesmo o prefeito deixava de comparecer.

Talvez essa fosse uma das maiores, e poucas, vantagens de ter pais divorciados que se odeiam. Os da Ju faziam de tudo para atender às vontades dela, como se vivessem em um eterno duelo de quem fazia mais. Meus pais também se divorciaram, mas, ao contrário dos da Juliana, conseguiam viver em uma relação pacífica e civilizada. Porém, nunca tive motivos para reclamar. Apesar de não realizarem extravagâncias como os pais da Ju, os meus não costumavam negar as minhas vontades.

Contando EstrelasWhere stories live. Discover now