caro amor.

3.7K 401 88
                                    

Caro amor,

isso não é outra poesia, é uma carta. Ando precisando expressar os meus sentimentos por você há algum tempo e acho que, dessa vez, todos saírão. As breves palavras não tem sido o suficiente. Nada tem.
Venho por este meio, então, falar sobre mim e você. Não sobre nós, porque não creio que este termo tenha vindo a existir.

Amei você. Meu primeiro amor; meu primeiro frio na barriga; meu primeiro coração partido. Você foi a minha hamartia, mas eu juro que toda a dor e agonia que sinto agora, valeram à pena pelo pequeno infinito que vivemos juntos. E é possível que você nem se lembre mais de mim e que você esteja bem melhor assim, mas eu... eu estou péssima sem você.
Minha vida era ruim (não que tenha deixado de ser) e eu, afundada em depressão, mal saía da cama nos últimos dois anos. Quão difícil era ter que encarar a vida quando o sol raiava? Só eu sei o quão difícil era. Mas aí, consegui encontrar um motivo que me fazia não matar aula todos os dias, para ficar olhando para o teto branco do meu quarto. Eu puxava meu corpo pesado todo o santo dia só por você; para poder ver seu rosto lindo, mesmo que de longe. O seu sorriso branco brilhante e tão feliz. Só eu sabia o quão triste você estava. Partia-me saber que você estava em pedaços e por mais que eu tentasse de tudo, parecia que eu nunca conseguia te tirar disso.
Eu tentava tirar notas boas para te impressionar, porque eu já havia desistido da tese de ter um futuro bom... de ter um futuro, então para que tirar boas notas? Mesmo assim, você me deu esperanças de um futuro bom. Mostrou-me que eu boa o suficiente; bela o suficiente. E a teoria do "suficiente" sempre se baseia em algo alto; uma expectativa absurda de ser algo muito melhor. Sempre acreditei que o sinônimo de "suficiente" fosse "infinito", já que não havia um limite para a palavra suficiente. Todas as vezes que você atinge a suficiência, ainda não é o bastante. Mas você me fazia sentir o suficiente e minha autoestima se reestabelecia gradativamente. Porque você dizia que eu era inteligente, doce, linda... absolutamente linda. Dizia que eu era uma escritora magnífica e que, um dia, eu faria sucesso com isso. Eu amava você, porque ninguém no mundo seria capaz de fazer tudo que fazia. De amar tudo o que você amava. De ser tudo o que você era.
Eu estava fascinada por quem você era; um alguém que só eu conhecia. Quão sortuda eu era? Apaixonada pela alma mais linda que eu já havia encontrado em todos os meus poucos anos de vida. Meus dias sombrios se iluminavam pelo brilho do seu sorriso  e eu te via todos os dias por menos de uma hora. Mas eu juro que isso bastava para eu suprir um amor cada vez mais forte por você. E eu e você ferimos pessoas com o que sentimos um pelo outro; e no final, quando não havia mais a quem ferir, ferimos a nós mesmo.
Eu gostava de conversar com você. Independente de quando ou onde. Nós sempre tínhamos assunto, porque parecia que eu podia contar tudo para você e você para mim. E era o que fazíamos. Não tem noção, certo? Do tamanho do que eu sentia por você. Eu odiava brigar com você, mas eu preferia estar brigando com você, que sem falar com você. Como nas vezes em que você passava dias sem falar comigo por motivos que ainda me são desconhecidos. E eu pensava que tinha feito ou dito algo errado. E quando você voltava como se nada tivesse acontecido, eu não podia te afastar, porque você era a única anestesia que eu tinha. Passei a depender de você e você sabia disso, então se aproveitou. Eu sei que sim. Eu notava e todo mundo sabia disso. Da forma como você parecia me usar e abusar do que eu sentia por você, para fazer o que quiser. Eu devia ter corrido para longe quando você fazia isso. Isso me feria, mas ao mesmo tempo que você me machucava, me curava sem perceber. Eu podia e devia ter ido embora. Tive mil chances para isso, porque você foi um babaca muitas vezes, mas mesmo assim, você era a única coisa que me fazia sentir viva. Me fazia sentir algo, depois de tanto tempo entorpecida. Eu não era só mais uma sobrevivente das tempestades que a vida manda. Eu sentia-me viva perto de você. Me fazia rir das suas piadas e do seu senso de idiotice. Só nós dois sentados na escada de piso cinza, lado a lado (ou não). Eu mal conseguia fazer contato visual com você, porque eu sempre estava nervosa, a ponto de desmaiar. Você dizia que era fofo. Eu roía todas as minhas unhas e uma vez você até pegou minha mão. Pareciamos duas crianças conhecendo o amor. E coincidentemente, em breve, seríamos duas crianças conhecendo a dor. E eu estava sempre pensando nisso, o que provocava o nosso afastamento constante: meu medo. Acontece que o medo ocorre quando você tem algo a perder. Se não tens nada a perder, não existem razões para se temer. E eu tinha medo, porque tinha tanto a perder. Eu tinha você e se eu perdesse você, o que restaria de mim? Eu mal sabia quem eu era e você me conhecia mais em alguns meses, que eu em quinze anos. Eu ficava feliz por ter algo que eu amasse tanto, que não podia viver sem; mas eu não parava de pensar que, uma hora, você se cansaria de mim, sendo eu, defeituosa, e eventualmente, eu teria de descobrir como seria viver sem você. Todo o meu corpo se tornava dor e meu coração afundava no peito com a ideia. Eu só tinha medo porque eu tinha tudo a perder. E eu perdi.

melancolia.Onde as histórias ganham vida. Descobre agora