- Boatos de que eu estava na merda. - Guaxinim é o último a chegar e se joga no banco. - Só queria confirmar os boatos.
- Qual é cara, nem todo mundo sabe o que vai fazer quando acabar o ensino médio.
- Com todo mundo você quer dizer eu e você né? Até a sua namorada já sabe o que quer. - ele solta e sinto Rafa ficar tenso.
O pessoal se reuniu na cafeteria para discutir o que fariam no futuro. Afinal, daqui a uma semana o ensino médio acaba. Eu tinha me inscrito em um curso de letras nos Estados Unidos e não sabia se ganharia a vaga. Quando contei para o meu namorado a briga durou exatamente dois dias. Rafa disse que me apoiava mas não falamos mais sobre isso. Recentemente completamos três anos de namoro e estávamos indo muito bem, obrigada. Eu amava Rafa com todo o meu ser, mas me amava acima de tudo. Queria ter essa chance.
- Você sabe que pode continuar com o seu canal no YouTube. - abracei meu namorado pelo pescoço para diminuir a tensão. Rafa tinha criado um canal de gameplay a dois meses e crescia cada vez mais. - Você é um sucesso.
[...]
Quando o resultado saiu no site, Rafa estava do meu lado com o notebook no colo.
- Você sabe que a gente ainda pode casar né? - ele alisava meu cabelo. - Chamar ninguém e ficar com o buffet inteiro só pra nós dois.
- Qual o resultado Rafa? - encarei ele e tentei sorrir.
- Você passou.
- Sério? - Rafa acenou. - SÉRIO?
Comecei a gritar e a pular na cama, era tudo o que eu queria. Aquele curso ia me ajudar com tudo o que eu tinha dificuldades e quem sabe eu não me tornaria a próxima autora best-seller? Okay, parei de sonhar.
Meu pai abriu a porta do meu quarto ofegante com uma vassoura nas mãos.
- Onde... tá... a barata? Eu mato. - ele deve ter corrido quando me ouviu gritar. Lembro da escada e minhas pernas doem só de pensar.
Começo a rir e me jogo nas costas dele, mania que aderi quando tinha seis anos.
- Eu passei pai! EU PASSEI!
- O quê? - ele processou por um tempo até ver Rafa com o notebook. - Você passou? VOCÊ PASSOU! Precisamos contar pra sua mãe.
Ele largou a vassoura no chão e saiu correndo pra falar com a minha mãe. Sorri com aquilo, sentiria falta deles. Virei para o Rafa e ele estava calado encarando a parede.
- Ei - tirei o notebook do seu colo e me sentei. - Sabe que a gente pode fazer isso dá certo.
- Não, a gente não pode Julia. - ele suspirou passando a mão no rosto - Eu amo você mas não quero te prender aqui, nem quero me prender a você. Entende? - acenei que sim com a cabeça. Senti que se falasse, poderia desabar a qualquer momento.
- Eu amo você Rafa. - o beijei com tudo de mim. Senti que precisava fazer isso. Precisava mostrar a ele que era muito mais que palavras.
Bom, foi minha última noite com Rafael. Ao menos, naquele ano.
[...]
Quando chegou o dia da viagem, todo o pessoal estava comigo no aeroporto. Todos menos ele. Eu comia a terceira fatia de torta de uma lanchonete maravilhosa do aeroporto, enquanto esperava chamarem o meu voo.
- O que tá rolando? - Alex colocou a mão no meu ombro.
- A única coisa que tá rolando sou eu de tanto bolo que comi. - abandonei o pratinho descartável na mesa.
- Tentou falar com ele? - Maethe me encarava com pena.
- Não vou mandar mensagem. - cocei os olhos, a vontade de chorar só aumentava.
- Você já mandou né? - Olívia, que recentemente tinha pintado o cabelo de rosa e ficado parecido com um algodão doce ambulante me abraçou.
- Já mandei porque sou otária. - a abracei mais forte.
- Ele não visualizou? - Alan perguntou em tom calmo, se até o Alan notou que eu estava desabando, eu era mesmo uma péssima atriz.
- Não, sem contar os recados na caixa postal. Eu sei que a gente terminou mas ele precisava mesmo fazer isso? - senti as lágrimas escorrendo pelo meu rosto e me senti fraca. Rafa tinha esse poder em mim, quando estava com ele era inquebrável. Sem ele, era só eu.
Ouvi a última chamada do meu voo e me despedi dos meus amigos.
Peguei minhas malas e levei o celular a orelha pela última vez.
- Vamo lá Rafa, se você atender eu desisto de tudo. Eu fico por você. - murmurava sozinha apertando o celular cada vez mais forte enquanto minhas lágrimas caiam.
Quando caiu na caixa postal, guardei o celular e tentei sorrir.
Abracei o Alex e o André com toda força que restava em mim.
- Traz uns jogos bem legais pra mim tá?- o pirralho falou enquanto limpava as lentes do óculos na camisa.
Meu pai me abraçou por um tempo mais demorado que o de costume.
- Querida, tome cuidado nas festas. Eles colocam drogas nas bebidas. - minha mãe falava enquanto segurava meus ombros.
- Sério isso mãe?
- Sério.
- Eles colocam droga na bebida de GRAÇA? - minha mãe me deu um tapa e riu.
Decidi deixar a vida me levar, nem que seja para o fundo do poço.