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Minha reclusão dramática durou apenas algumas horas.

Tinha mandado Ciel embora várias vezes, mas ele se recusava a ir, chorei vergonhosamente pensando em todo que eu perderia e qual seria meu futuro, tentei digerir o que foi me dito e tive uma pequena crise de identidade me perguntando parte do que eu era, mas nem eu nem Ciel conseguimos uma resposta.

Parei de me lamentar quando comecei a sentir fome.

Porque não há motivo melhor para se animar que comer alguma coisa, principalmente doce.

Pelo menos foi o que tentei dizer a mim mesma e também porque Ciel estava começando a me encher a paciência com isso...

Sai do meu quarto e me deparei com um longo corredor. A minha esquerda, a três portas de distância estava uma escada que levava a um andar abaixo.

— Se você quer ir para a cozinha você deve descer — disse Ciel atrás de mim. Perto demais, mas uma parte bem pequenininha de mim estava grata por isso, minhas pernas estavam como gelatinas e eu não sabia se eu poderia descer aquela escada rolando.

— Você quer parar de me seguir? — reclamei mesmo assim — você parece um stalker me seguindo para todos os lados, existem momentos que as pessoas querem ficar sozinhas sabia?

—Só se cale e me agradeça — ele disse irritado, mas menos irritado do que o esperado.

Descemos a escada (não admitirei que Ciel quase teve que me ergue para que eu descesse os degraus ou teria caído vergonhosamente). Quando chegamos a porta quase que imediatamente encontramos Blake, ele sorriu e nos arrastou para o que chamavam de cozinha, que na verdade parecia um grande refeitório, três mesas de madeira de lei, rusticas, como mesas de piquenique estavam disposta paralelas e um balcão que parecia um buffet separava a cozinha das mesas, fora nós três que chegávamos agora estavam mais seis pessoas jantando. Dois homens e quatro mulheres.

— Começo lhes apresentando — Blake apontou para duas das meninas sentadas — Natsume e sua companheira Yukihime, Natsume é japonesa e está aprendendo o nosso idioma ainda, nós a resgatamos a uns 3 anos e Yukihime é uma mulher das neves... Elas são muito gentis... Peço que tenha paciência com Natsume por causa da linguagem... Mas ela e excelente aluna — ele sussurrou — cuidado com Yukihime... Ela pode ser meio assustadora e superprotetora.

A diferença entre servos e bruxos era extremamente evidente, sentadas em uma mesa estavam duas meninas lado a lado, uma parecia ter minha idade, uma garota asiática de cabelos escuros lisos e compridos e se vestia como uma garota comum e moderna com calças jeans surradas e uma camiseta escrita qualquer coisa com kanjis. Ela era provavelmente uma bruxa, já a outra em seu lado com certeza era um demônio, tinha a aparência de uma garotinha também asiática, sus cabelos eram brancos azulados cortados chanel e a pele extremamente branca, seus olhos eram apenas orbitas de azul-gelo perolado, não havia íris ou pupilas, vestia um quimono antigo com flocos de neve bordados e seus lábios eram azulados como se estivesse com frio.

Ambas me cumprimentaram com um aceno de cabeça e Blake passou para os próximos na sequência: um homem negro de mais de dois metros de altura e uma garotinha loira que parecia diminuta perto dele, os dois me pareciam normais, exceto pelo tamanho daquele homem. Meu complexo de Napoleão me deixou um pouquinho irritada.

— Esses são Taú e Iana. No momento Taú é o bruxo mais velho nessa casa, ele tem 27 anos. Veio da África — Blake explicou — e Iana é uma dríade, diferente da crença popular elas ficam perto das arvores por opção, mas não precisam ficar presas num lugar fixo... Temos uma grande diversidade aqui, esperamos que possa se sentir bem vinda também.

— São todos estrangeiros aqui? — perguntei, observando Ciel que mais uma vez parecia extremamente reservado perto dos outros.

Blake sorriu.

— Na verdade não existem tantos de nos quanto queríamos... São poucos os esconderijos que existem, então na maior parte as pessoas podem escolher onde vão ficar — Blake explicava como um professor cada detalhe — aqui é um lugar mais tranquilo como pode notar, em geral as pessoas mais sossegadas costumam ficar aqui — encontramos a mesma mulher cervo de antes, mas agora ela estava completamente vestida, seu rosto parecia um pouco mais humano e sua galhada estava menor — acho que você já conheceu Sasha — Blake disse divertido — e esse é Toru — ele apontou para o rapaz que estava ao lado de Sasha, ele tinha cabelos verde claro e olhos que puxavam para o vermelho, por um momento me pareceu familiar, mas não lembrava de onde o tinha visto — você também o conheceu.

— Conheci? — perguntei confusa e Toru riu.

— Como você pode se sentar em alguém e não se lembrar? — disse o rapaz de cabelos verdes numa voz que misturava manha e sarcasmo.

Minha ficha caiu. Era o dragão. Mas como diabos eu ia saber?

— Me desculpe, mas você me parecia um pouquinho diferente na ocasião... — respondi com a mesma ironia — sabe... Um pouco mais escamoso e menos humano...

Toru ergueu uma sobrancelha, insatisfeito, como se não estivesse acostumado a ter pessoas respondendo-o, ele fechou a cara e ficou em silencio. Aquelas criaturas não deviam ter séculos de idade? Como eram todos tão mimados? Era culpa de quem eles serviam? Ou pelo menos tinha algum tipo de creche para deixá-los?

Olhei para os lados esperando ver os cabelos cor de areia de um certo alguém.

— Onde está Eliot? — perguntei a Blake.

— Ele é um pirralho mimado que se recusou a sair do próprio quarto até agora — respondeu Ciel em uma voz neutra, mas eu podia ver a irritação e triunfo em seus olhos.

— Faltam Eliot e Arthur para completar todos aqui — disse Blake ignorando o comentário de Ciel, era assim que lidavam com birrice? — ah! — ele se virou para mim — e Elizabeth ainda temos algumas coisas para discutir sobre sua estadia aqui, então...

Ele deve ter visto minha cara de enjoada ou então foi amedrontado por Ciel, pois ele parou de falar rapidamente e transferiu o compromisso para o dia seguinte.

Eu realmente não queria ter uma estada ali... Principalmente uma estadia longa. Quando eu poderia ir pra casa? E se minha mãe voltasse de viagem e não me encontrasse lá? Eu teria uma ficha de desaparecida?

Não tive muita fome, nem vontade de fazer mais nada naquele dia, Sasha, Iana e Natsume tentaram ser amigáveis e conversar comigo, mas eu não estava com humor nenhum para conversas. Elas pareceram notar depois de pouco tempo e me deixaram em paz.

não vi mais Eliot naquele dia e não fui procura-lo, amanhã eu poderia te me desculpar, mas naquele dia eu só queria ficar sozinha... Mesmo assim a única pessoa de quem não consegui me livrar foi Ciel. Mesmo tentando fugir. Mesmo fechando a porta em sua cara e dizendo que queria ficar sozinha ele nunca deixou de estar por perto.

Dado certo momento cogitei se Ciel se culpava por minha situação atual e por isso me seguia como um cãozinho sem dono, mas quando ele me mostrou um de seus sorrisos irônicos minha pena passou e eu fechei minha porta na cara dele mais uma vez.

Guerras dos Magos Mestiços I - PassadoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora