39| Tormenta de Fogo

Começar do início
                                    

— Me passa o isqueiro. — pediu Matheus um pouco atrás de Liz, andando com as mãos abertas ao lado do corpo, como se mantendo o equilíbrio sobre uma corda bamba. E era o que fazia em sua mente.

Liz tirou o objeto dourado do bolso e jogou para ele por trás do ombro. Caminhou lentamente e deu passos desgovernados para o lado, apoiando-se nos postes a cada três passos. Estava indo na direção certa?

— Math — chamou, seus olhos insistiam em se fechar. — Para onde estamos indo?

O garoto não respondeu.

— Math!

Ela fez um esforço para virar-se, sua cabeça deu voltas como se estivesse em girando ao redor de si mesma. O vento soprou seus cabelos violentamente e Liz teve a impressão que voaria. Ela apoiou a coluna no poste de luz atrás de si, deixando que seus olhos ardessem com a forte iluminação.

— Por que está parado aí? — ela se viu a própria voz soando distante.

O garoto, que estava com a cabeça abaixada até então, encarou-a com um sorriso maligno. Matheus deu um passo a frente, olhou-a como se Liz fosse o prato principal da noite. Ele deu um trago, soltou a fumaça pelo nariz de maneira lenta e jogou o cigarro na avenida.

— Matheus não está aqui.

Apesar da tontura, Liz teve disposição para revirar os olhos.

— Essa brincadeira perdeu o potencial de assustar quando tínhamos dez anos.

Matheus riu de maneira fantasmagórica, sua risada provocou arrepios por toda a epiderme de Liz. Ele deu outro passo largo.

— Nunca perde a incredulidade, não é? — sua voz repercutiu como uma faca pontiaguda deslizando pela costela dela. Matheus riscou o isqueiro e a pequena chama oscilou até se harmonizar. — Seu amigo faria isso? — Ele colocou a língua para fora, levou o isqueiro aceso até a mesma e permaneceu com o fogo na ponta do órgão com os olhos inexpressivos. A chama não queimou, não fez nenhum ferimento e em segundos os olhos de Matheus não eram nada mais do que duas esferas negras.

Não existia mais verde a não ser o das plantas que circulavam a praia, não existia mais nada além da sensação de vazio.

Liz quis gritar, quis fazer algo, mas sua mente insistia em mantê-la trancada em uma zona de ambiguidade.

— Sei que está aí, Matheus! — disse ela forçando a voz a soar firme. Não recuou e deu um passo em direção ao garoto, cambaleando. Não sabia bem o que estava fazendo.

A criatura que possuía Matheus riu escandalosamente.

Não tenha medo! Liz gritou dentro da própria mente. Estar no escuro não significa que você não possa ver. Mostre que quem está no controle é a sua mente e não a sua visão. Ela repetiu as palavras que seu pai dissera quando esta ainda era uma criança com medo de dormir com as luzes apagadas. Tal frase nunca fizera tanto sentido quanto naquele momento.

— Seu amigo não está mais entre nós! Ele se foi! Eu estou no poder agora!

Liz jogou o ar para fora do pulmão, como se com aquele ato estivesse retomando a sanidade. Sua perspectiva tornou-se consistente, ela sentiu cada movimento ao seu redor — tanto as ondas do mar, quanto os coqueiros que balançavam com a força do vento —, como uma dose de energia correndo para dentro de si. Aquela energia era assustadora.

Por pouco tempo, pensou ela e no mesmo instante um ardor tomou conta de seus olhos. Ela pestanejou e sem que percebesse, as íris emitiram chamas azuis.

— Você não vai levar meu amigo! — sua voz soara como uma chuva de granizo.

O ser gargalhou.

As Doze Luas - Filhos do AlvorecerOnde as histórias ganham vida. Descobre agora