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Uma semana depois disso meus colegas de quarto haviam ido para a cidade, aproveitar a folga. Eu ainda estava restrito à isso e completamente desanimado para fazer qualquer coisa, então me pus a ler um livro para passar o tempo. Após algumas batidas na porta do quarto Adam entrou, se certificando de que não havia mais ninguém. Houve um breve momento constrangedor onde nenhum de nós sabia o que dizer. Percebi que ele estava com os ombros machucados, marcados com hematomas. Tive um espasmo nervoso na mão direita, lembrando da briga. Ele percebeu.

- John, eu quero te agradecer por tudo que você fez. - Ele tocou meu punho com cuidado e delicadeza. Eu dei de ombros. - Aquilo é uma garrafa de vinho?

Adam apontou para uma garrafa guardada sob a cama. Também peguei do esconderijo dois copos, que enchi e entreguei um a ele. Finalmente fechei o livro e me sentei no chão, encostado no triliche de camas. Ele fez o mesmo.

- Eu nunca vi alguém tão irado quanto você naquele dia. Fiquei com medo. - Meu amigo comentou com um ar risonho.

- Eu não me lembro de nada. - Virei meu segundo copo e ri, após um soluço. A bebida já fazia efeito. Adam comentou mais algumas coisas sobre o incidente, pontuando diversas vezes o quanto eu parecia irado.

- Sabe, é engraçado. - Ele disse. - Não entendo o motivo de tanta raiva. Aquilo não era sua culpa, nem estava acontecendo com você.

- Ora, não deveria acontecer com ninguém. Eu me preocupei, foi só isso. - Apoiei o rosto em uma das mãos. A névoa causada pelo álcool fazia tudo parecer mais ameno, menos grave. Observei o corpo masculino ao meu lado e balancei a cabeça para espantar uns pensamentos que me vinham.

- Você já esteve em um lugar parecido com o meu, alguma vez?! - Ele parecia afirmar e perguntar ao mesmo tempo, tropeçando nas próprias palavras. Eu ri.

- Hum... Talvez. Você quer saber se eu sou gay? - Eu disse e encarei seu rosto, virando o corpo de lado. - Eu não sei.

Um breve sorriso lhe percorreu os lábios e então se inclinou na minha direção. Sua boca tocou a minha e dali sucedeu um beijo. Não era nada mal, eu pensei. Lembrei de Louise, a menina da festa. Havia uma diferença, é claro, mas para mim era igualmente bom. Talvez fosse o vinho, a carência, ou só eu. Nossas línguas se afastaram em pouco tempo e o gosto de sua boca ainda permaneceu na minha.

- É uma pena você não ser inteiramente gay. - Ele deu o veredito de que eu era um homem indeciso. Tornamos a rir e terminamos a garrafa.

Adam ficou comigo por um pouco mais, e logo eu comecei a pegar no sono. Beber me trazia sono. Mas antes de ir ele agradeceu outra vez e disse para que eu não me preocupasse caso o mundo não parecesse justo. O que importa, ele disse, é que cada um seja o que gostaria de ver no mundo. Foi uma frase bonita, e eu a teria respondido se não tivesse dormido logo que ele se despediu.

Um mês depois ele foi dispensado de volta para casa. Nunca mais nos vimos.

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