Estranho

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Abri os olhos e tentei me acostumar com a escuridão, mas não fui muito bem-sucedida. O quarto estava um breu por causa das pesadas cortinas blackout. Enquanto tentava ainda me situar, ouvi novamente os passos de alguém andando pelo quarto tranquilamente. No mesmo instante, fiquei apreensiva, mas respirei fundo e tentei pensar de forma racional.

Ora, quem poderia querer fazer algo de ruim comigo? Provavelmente é um funcionário da casa que entrou no quarto errado, ou Diego, o guitarrista, querendo fazer alguma brincadeira boba. Pelo que Tony sempre me contou e eu me lembro da única vez em que o vi, ele é dado a piadinhas sem graça.

Quando meus olhos se acostumaram um pouco com a escuridão, acompanhei com o olhar o vulto deixar suas coisas em cima do aparador, tirar algum tipo de casaco e os sapatos, entrar no banheiro, fechar a porta, acender a luz e ficar por lá.

Ora, mas que pessoa mais atrevida! Entra no meu quarto, larga suas coisas e ainda vai defumar o meu banheiro! Olha, se até o capeta faz pacto para entrar no corpo das pessoas, o que leva essa pessoa a achar que não precisa de permissão para entrar no quarto de outra pessoa e responder ao chamado da natureza?

Pensei em ir bater na porta — que pelo menos ele fechou, imagina se fosse mandar um número 2 de porta aberta? — e pedir ao estranho que fosse fazer suas necessidades em outro lugar, mas ouvi o barulho do chuveiro sendo ligado.

Levantei da cama, acendi a luz da luminária na mesinha de cabeceira, peguei a bolsa e fui em busca do celular. Acabei achando um chiclete muitíssimo bem-vindo — eu devia estar com um hálito de múmia vingativa — enquanto checava as horas no smartphone e fechava a bolsa. Duas da manhã.

Mal-humorada por aquela invasão repentina, masquei o chiclete intensamente e prendi o cabelo numa trança enquanto pensava no que fazer, até que um barulho me assustou: a mochila do vulto havia caído do móvel como uma fruta madura no chão.

Mesmo desejando o mal para o invasor, fui até suas coisas e comecei a recolhê-las com cuidado. Coloquei a mochila de volta no aparador e fiz menção de voltar para a cama e aguardar uma explicação do homem abusado, mas quando vi um coldre com uma arma despontar de dentro do que vi ser um terno, não um casaco, como eu tinha imaginado, parei imediatamente.

Olha, até que é um bom terno, o tecido... Espera, eu tô pensando em roupas? Tem uma arma no meu quarto!

Meu coração disparou de nervoso, e eu pensei em correr do quarto e chamar a segurança. Logo afastei a ideia, já que, se tudo fosse um engano, eu soaria como louca histérica. O estranho invasor poderia, inclusive, ser um dos seguranças da mansão.

E foi só a ideia de ter um segurança tomando banho no meu banheiro vir a mente, que um pensamento passou pela cabeça: e se fosse Gabriel? Betty disse que ele não viria, mas e se aquilo tivesse sido uma brincadeira dela? Ela realmente estava agindo de modo suspeito com aquela coisa de arrumar o closet!

Achei melhor conferir. Peguei meu celular e disquei o número dele, que Betty havia me passado na lista de contatos de todos da banda. Na hora, nem me dei conta do que isso significaria, para ser sincera.

Fiquei em silêncio, esperando o celular tocar, mas não ouvi nenhum som vindo de dentro da bolsa, nem mesmo uma vibração. Olhei para a tela do aparelho e vi que alguém havia atendido a ligação. Ou seja: não era Gabriel quem estava tomando banho no banheiro.

Meu peito se apertou com o medo mais uma vez, mas não me deixei abalar. Afinal, a chance de a pessoa ser mal-intencionada era minúscula, tendo em vista que nenhum ladrão ou assassino profissional entraria no quarto da vítima e largaria sua arma para tomar um banho! Fora que a segurança era impecável na mansão, eu sempre soube disso.

Amor nas AlturasWhere stories live. Discover now