Capítulo 6

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Observo o continente do convés enquanto nos aproximamos. É horrível e lindo ao mesmo tempo, uma confusão de cinzas e marrons. Humanos andando por todos os lados.

As águas pararam de ser claras e começaram a ficar turvas. Um cheiro desagradável começa a ficar forte. Há cordas, guindastes, galpões e containers por todos os lados. É barulhento. Os navios em volta fazem barulho. As pessoas no cais fazem barulho. Máquinas se movimentam por todos os lados. É desorganizado e organizado.

Nos aproximamos do cais e descemos por uma rampa até a terra firme. Jake vai na frente, com o braço jogado nos ombros de Rafael como se fossem velhos amigos. Talvez seja uma precaução para garantir que Rafael não me ataque de novo, ainda mais em público. Mesmo assim, isso não me impede de receber olhares cheios de vingança vindo por parte dele.

Nicholas caminha ao meu lado. Quando acordamos essa manhã, ele disse que, para me ajudar, eu preciso fazer exatamente o que ele disser. Por não ter uma opção melhor, sigo suas instruções.

Rafael abraça uma mulher que está parada no cais e Jake bagunça o cabelo de um menino pequeno, parado sorridente ao lado da mãe. Atrás das mulheres, dois homens de uniforme e pranchetas esperam os cumprimentos acabarem para falar conosco. Eles são baixinhos e barrigudos. Um deles possui um bigode e está começando a ficar careca. Parecem ser mais velhos, um deles possui cabelo branco.

Jake entrega alguns documentos para eles e Rafael gesticula apontando para o barco. Em alguns segundos, um guindaste está retirando a carga do navio.

A visão dos siris no barco já havia me apavorado no primeiro dia. Entretanto, ver a quantidade total de animais pescada durante os dias que ficamos no mar era brutal. Caixas e caixas gigantescas eram descarregadas. Alguns siris ainda pareciam vivos.

Sinto como se fosse parte da minha família empilhada e morta naquelas caixas. Convivemos diariamente com siris no meu povo, alguns estão soltos pelo coral, outros são animais de estimação. São seres inteligentes e teimosos. Já levei diversos beliscões por não lhes dar comida quando bem quisessem.

Não consigo evitar de chorar baixinho. Por estar olhando fixamente para o descarregamento da mercadoria não percebo os fiscais e Jake vindo na nossa direção.

- Documento, senhor - um deles diz firme. Nicholas retira algo do bolso e o entrega. O homem anota algo na prancheta.

- Identidade, senhori- Ele vê que estou chorando e olha confuso para Nicholas e Jake - o que há com ela?

Os dois arregalam os olhos e se encaram como se houvesse uma comunicação telepática que os permitissem decidir o que fazer.

- Ela é vegana, senhor - Jake diz - está com pena dos siris.

O homem começa a gargalhar. Jake e Nicholas dão uma risadinha sem graça. O outro fiscal fala:

- Esses jovens hoje inventam cada coisa!

- Nem me diga Jorge! Tenho uma sobrinha vegana, juro que não sei o que essa guria come.

Os dois senhores desatam a debater sobre a juventude e como antigamente tudo era melhor. Esquecem que estavam falando comigo e vão fiscalizar o próximo barco.

Quando ficamos sozinhos, Jake diz:

- Tire logo ela daqui Nicholas.

Ele me puxa pelo braço para dentro do porto.

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⏰ Last updated: Mar 02 ⏰

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AdharaWhere stories live. Discover now