Capítulo 27 - Não me chame de Faena

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– Clérigo! Clérigo! Fale alguma coisa!

Eladar não respondeu. Havia muitas coisas para se fazer: equilibrar-se em cima do cavalo, concentrar-se em manter a luz saindo de suas mãos, ignorar a dor da ferida nas costas... reassegurar Faena não era uma prioridade naquele momento. Ainda mais porque a energia prateada não duraria para sempre. Já as sombras...

As sombras vão cair sobre nós assim que ele fraquejar, Faena pensou. Pelo silêncio do garoto, isso não estava longe de acontecer. A dokalfar concluiu que tinham que chegar ao rio. Talvez a água afastasse aquelas criaturas; elas estavam perseguindo o garoto, embora ela não soubesse ao certo o porquê. Naquele instante, o clérigo abafou um grunhido de dor.  As sombras eram muitas, e ele estava sendo atacado. Faena percebeu que ele tentava protegê-la com o próprio corpo. Se ao menos aquelas coisas não voassem! 

– Garoto! – ela ralhou, zangada – Concentre-se em manter a luz, não em servir como escudo! 

Ele balançou a cabeça.

– Fa...ena... eu...

– Não me chame de Faena!

– Eu não consigo mais... 

Ele tinha razão. A luz foi diminuindo, transformado-se em um brilho suave, até finalmente se apagar. Mais sombras vieram, ainda mais ferozes. A elfa sabia que seu prisioneiro seria devorado vivo se ela não fizesse nada - quando ele começou a escorregar da sela, ela decidiu que tinha de tomar uma atitude.

– E... clérigo! – ela gritou – Garoto! Está muito fraco? Consegue fechar os braços com força ao redor da minha cintura? 

Ela já podia ouvir as águas do Sankar. Corriam fortes depois do período de chuva. Era perigoso, mas ou mergulhavam ou morreriam sugados por aquelas coisas. A cada minuto surgiam mais e mais, como se nascidas da própria escuridão da noite, e Eladar não tinha como destrui-las todas.

– Con... sigo – ele murmurou, entre a dor das pequenas e muitas mordidas.

– Faça! Segure firme! 

Eladar obedeceu. De repente, deu-se conta da direção que estavam tomando. Não iam passar pela ponte. 

Oh, não, é uma péssima ideia, uma péssima ideia...

– Clérigo, não me solte – Faena pediu – Não me solte por nada. Está me ouvindo? Mesmo que afundemos! 

– O que está fazendo? – Eladar gritou, com o fôlego renovado – Dok... não!

O garoto engoliu o próprio grito de protesto junto com um bom tanto de água barrenta e gelada. Faena tinha jogado o cavalo no rio, ela tinha jogado o cavalo no rio!  Veloz, a correnteza os arrastou por cerca de dez metros antes que conseguissem emergir novamente. Os braços de Eladar soltaram-se da cintura de Faena, querendo seguir o instinto de se debater e nadar, mas ela teve tempo de agarrar um dos pulsos dele. Segure-se!, a elfa gritou, abraçando o garoto como se estivesse segurando a própria tábua de salvação. O cavalo, pesado, tinha sumido, e as sombras, ao que parece, não estavam mais ali. A dokalfar teria se sentido aliviada se a situação não continuasse igualmente preocupante.

– Nós vamos afundar – Eladar gritou, tentando desesperadamente manter a cabeça para fora da água – Dokalfar! Se ficarmos assim...

– Não me solte! – ela insistiu – Me dê sua mão e pare de se debater!

Os dois agarraram a mão um do outro e deixaram seus corpos separados. El sabia nadar, e Faena também, mas aquela correnteza era uma novidade para ambos. A dokalfar tinha consciência de que devia obedecer ao curso do rio, e agradeceu pela ausência de pedras e rochas pontiagudas no caminho.

Sombra e Sol (EM HIATO - autora teve bebê)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora