— Deve ser porque não tenho outra. — respondi, juntando as sobrancelhas. Não estava nem um pouco confortável com aquela situação. O que as pessoas diriam se soubessem que estava enfiado no quarto com a garota mais feia de toda a escola? Já podia até ouvir o barulho da minha reputação indo pelo ralo.

— Que bom, porque eu gosto bastante desta ai. — Se sentou, apoiando os pés na borda da cama. — Eu gosto de ficar aqui, sabe. Tudo neste quarto tem cheiro de Rigel Oliphant Stantford, cheiro de outono mesclado a menta com discretas notas de pachoulli.

— Eu não tenho cheiro de menta, ou de outono. — retruquei. — Beene, olha a cor dos seus sapatos, você está sujando a droga da colcha. Levanta daí, vai. Se quiser. pode se abancar na poltrona.

Ela revirou os olhos e, em vez de se sentar na poltrona, como eu havia sugerido, desabou sobre o tapete.

— Tem sim... Todo mundo tem um cheiro que é só seu. — Seus olhos se arregalaram. — Qual é o meu?

— Qual é o seu? — devolvi com uma risada. — Você não tem cheiro de nada.

— Impossível, como eu já disse, todo mundo tem um cheiro característico. O Arran, por exemplo, tem cheiro de bacon, Lilian de primavera, Dean de livro antigo, meu pai de creme de barbear, mamãe de lavanda e, eu, segundo Jason, tenho cheiro de morango.

— Morango? Você não tem cheiro de morango, tem cheiro de balas de cereja. — despejei sem sequer me dá conta da besteira que estava fazendo.

— Engraçado, ainda há pouco disse que eu não tinha cheiro de nada.

— É que balas de cereja e nada são a mesma coisa. — Tentei consertar, mas o estrago já estava feito.

— Não importa, Jason disse que tenho cheiro de morango e eu acredito nele. — Ela tirou os óculos e os esfregou na barra do suéter verde com estampa de alce, limpando as lentes, então continuou: — Mas ele tem cheiro de suor de fim de treino, deve ser porque está sempre treinando. Eu lhe disse isso uma vez e ele riu bastante, depois afirmou que eu precisaria me acostumar com seu cheiro, porque quando deixar a escola pretende se tornar um jogador profissional. Mas que antes, vai tirar um tempinho para conhecer alguns países. Eu contei que sua mãe disse que Paris é um sonho, mas ele pretende ir para a Oceania e...

— Para! — interrompi. — Essa conversa está me dando dor de cabeça. Eu não estou nem ai para isso, tanto faz se esse tal Jason pretende ir para a China ou...

— A China fica na Ásia e, não na Oceania. — Foi a vez dela interromper. — Ao que parece, está precisando de umas aulas de Geografia.

— E você está precisando de umas aulas de boas maneiras.

— Não estou não, eu tenho boas maneiras. — afirmou prontamente, juntando as sobrancelhas avermelhadas.

— É claro que tem. — ironizei com um sorriso de esguelha. — Invadir o quarto de alguém sem pedir licença, comer feito um trasgo e enfiar os sapatos sujos na cama de outra pessoa são notórios exemplos de boas maneiras.

Ela fechou a cara e cruzou os braços.

— Quem inventou as boas maneiras?

— Responda você, você é a sabichona.

— Eu não sou uma sabichona. E, com toda certeza, essa bobagem de boas maneiras foi inventada por alguém muito infeliz, alguém que queria que todos fossem infelizes. — Será que ela seria bem tratada no hospício? Ou será que a isolariam em algum tipo de quarto branco? — Para quê fazer pose de sofisticada e recusar comida quando estou com fome? Para quê agir friamente com as pessoas quando na verdade quero abraçá-las e dizer que gosto delas? Para quê sempre bater na porta se surpresas são tão legais?

Viola e Rigel - Opostos 1Onde histórias criam vida. Descubra agora