Parte 2

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Liguei imediatamente para o motorista de ônibus. Disse-lhe que a professora estava comigo e que talvez precisasse de algum tempo para descansar. Ele me respondeu que levaria logo as crianças à escola. Depois, conforme fosse, a mulher que pegasse um ônibus. 

Sentada ao meu lado, imersa em seus pensamentos, ela não se manifestou. Tive um acesso de insegurança, uma perturbação por seu bem-estar. Desliguei o telefone e tentei contato: 

"Professora, você está bem? Há algo que eu possa fazer para ajudá-la?" 

Ela respirou três vezes profundamente, passou a mão em seus cabelos amarrados, recolocando entre o elástico atrás do pescoço os vários fios crespos que se rebelavam, e fixou-se em meu crachá ao peito, como se apenas então minha presença lhe fizesse sentido. Finalmente, após grave hesitação, a mulher abandonou seu ar fechado, de rosto indisposto, como se proibido à fala, para se abrir ao meu convite. Como resultado, liberou seus músculos faciais ao relaxamento de uma incrível narrativa:

Eu acabei de morrer. Ele ali, esse aqui em cima, me pegou, brincou comigo, e me esmagou. Desde que viemos para cá, ainda no ônibus, senti alguma coisa possuindo meu coração, um peso horrível. Foi como se todos os meus fracassos tivessem vindo à tona na mesma hora, de forma tão forte que fiquei até nauseada. Eu queria mudar, eu queria desesperadamente que a minha vida simplesmente mudasse. Só que nada faz sentido, e nem sei como se faz para encontrar um, então minhas buscas são só repetições, e a verdade é que eu estou fadada a uma jornada sem gosto. A estátua me seduziu, com aquela testa enrugada de sabichona, e meu estômago pesou. Veio tudo para fora, vomitado. As estátuas são gigantes e desde pequena elas me esmagam aos poucos. Hoje eu não teve jeito, não deu para resistir. Juntaram todas as minhas dores de uma só vez, para que eu fraquejasse até morrer. Vim aqui atrás de silêncio, atrás de uma sombra, atraída pela estátua. Isso me levou à dissolução, e é o que estou tentando explicar. Eu me sentei e procurei ficar quieta, porque o mormaço desse vento quente fez meu enjoo piorar. Não consegui mais mexer minhas pernas, sentindo-as dormentes numa epidemia que me tomou todo o corpo, até o ponto em que fiquei fraca demais para manter sequer os olhos abertos. Eu fazia força para abri-los, implorava para que meus sentidos se mantivessem comigo. Duas pessoas vieram ao meu lado, perguntaram se eu estava bem. Eu disse que não, que estava tudo muito ruim, só que minha boca não abria. Eu era uma massa de carne sobre um banco de concreto, sem qualquer sensação, era assim que eu me sentia. Eu flutuava, não ouvia mais os sons da praça. Pensei que não tinha como ir além e que talvez o fim fosse assim, dormente. Isso foi até que uma voz gravíssima falou às minhas costas:

- Quem lhe deu a permissão de abrigo à minha sombra?

Eu me assustei, voltei a me mexer por causa da adrenalina, e me envergonhei, é claro, por levar repreensão do dono da praça. Respondi:

- Eu achei que me sentar aqui não me traria problemas, porque sei que não significo nada. Não faço mistério da minha irrelevância.

- Por isso não a quero aqui! Há quem tolere um fraco, há quem aceite uma pequenez como a sua, mas há também quem não a queira por perto, quem sinta nojo de seu pouco caso com o poder. Saia daqui!

Minha fraqueza ameaçou voltar, porque a agressividade dele me fez sentir ainda mais estúpida. Por outro lado, pensei: meu pouco caso com o poder? Até parece que eu era humilde assim! Se fosse possível, eu seria imperiosa sim, mandaria em alguém, teria minhas vontades atendidas. Que fosse minha a última palavra, por que não? Então talvez ele estava apenas me testando. No fundo, éramos iguais e diferíamos em tamanho. Tentei argumentar:

- Por que só quem é grande tem poder? Sei que não sou estátua de praça, mas isso não diminui minhas ambições. Vivo sob a sua sombra desde o nascimento, quero o que você quer. De onde vem minha inferioridade?

As Estátuas Gigantes de MaiaraWhere stories live. Discover now