Capítulo 10 - O fantasma de Adrianna

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Ao retornar para o seu reino, já não encontrou o pai, morto por conta da idade. Reinava o seu irmão mais velho de nome Jorge II. A mãe estava em seus últimos dias e a princesa assumiu pessoalmente o ministério da defesa do império. Viveu assim até apaixonar-se por um dos seus soldados, de nome Inácio, o que causou grande revolta ao rei e sua mãe. Não era aceitável que uma princesa tivesse um mero soldado como marido e foi decidido que tal afronta teria fim.

Jorge II ordenou que Inácio fosse morto. Adrianna revoltou-se com o irmão e declarou-lhe guerra, afinal ela tinha o comando das tropas reais que também estavam insatisfeitas com a decisão real. Iniciava-se o golpe de estado que culminaria na renúncia forçada do soberano e sua mãe. A justa Adrianna não retirou a vida de seus familiares, ao invés disso os condenou ao exílio e ambos nunca mais foram vistos.

Adrianna assumiu como rainha e revelou aos seus súditos que esperava um filho do amado soldado assassinado. Os nobres, no entanto, não viram com bons olhos que tal criança fosse candidata à sucessão real, tendo em vista sua linhagem impura. Foi acertado às escondidas que a rainha Adrianna deveria se casar com um homem nobre para conceber o novo rei, um herdeiro legítimo. A própria nobreza, sem que a rainha soubesse, tramou o novo casamento que acabou acontecendo, ao contrário da concepção do novo herdeiro.

O impuro filho de Adrianna cresceu forte e também foi mandado à Ordem dos Virtuosos para treinamento. Quando voltou adulto, cheio de fúria, tinha já um exército de cavaleiros. Ao descobrir sobre os planos da nobreza e deduzir erroneamente que sua mãe tinha tomado parte na trama, atentou contra as forças militares do reinado. A rainha, seu marido e seu experiente exército foram vencidos pelos cavaleiros negros e o filho ilegítimo se autoproclamou Jorge III, assumindo definitivamente o trono. Sua primeira ordem foi executar todos que ousaram chamá-lo de impuro ou pelo seu nome de batismo; a segunda foi executar a rainha deposta, na forca, fora dos muros do reinado. O corpo não deveria ser enterrado, para que servisse de exemplo aos visitantes.

— Oh, puxa! — Estela voltou-se para a estranha, deixando os desenhos na areia.

— E esta é a sina de Adrianna, menina. Amar um filho que a assassinou, impedida de descansar no Outro Mundo por não receber um devido enterro.

Então Estela percebeu que estava lidando com um fantasma. Eles eram confusos, não sabiam que não pertenciam ao Mundo dos Vivos quando não lhe diziam. O rosto da mulher fantasma não desgrudava do corpo no alto, pendurado e balançando. O semblante triste e o som do atrito da velha corda com a madeira prendiam a atenção da falecida.

Para que o fantasma tivesse alento, o corpo deveria ser enterrado e era preciso convencer o seu dono de que tinha morrido. Os acontecimentos, as feridas, tudo deveria ser esquecido. O fantasma sabia que a rainha havia morrido, mas não que era a própria falecida. Estela poderia estar passando por algo parecido? Aquilo poderia ser um sinal? Seria também um fantasma? Era preciso entender tudo, seus significados e trilhar com cautela. Nada era à toa.

Decidiu ela mesma providenciar o enterro de Adrianna. Fauna que se transformou em um rinoceronte, derrubou o poste e Estela apoderou-se do corpo em decomposição. Depois de afastar a corda do pescoço seco e de arrumá-lo da forma que era possível, o deixou de lado para providenciar uma cova. Com as próprias mãos começou revirar a terra árida sob o olhar atento do fantasma da rainha.

Fauna se mantinha estática enquanto olhava a companheira cavar. Depois de um tempo, percebendo que Estela estava se ferindo com a terra árida, transformou-se em um tatu e empenhou-se em acompanhá-la. Passada quase mais uma hora, o buraco estava feito e Estela, totalmente suja, mas feliz.

Agarrou com cuidado o corpo de Adrianna e o depositou no sepulcro improvisado. Em silêncio, com as mãos unidas, fez uma prece em honraria á defunta que também aproveitou o momento para rezar. Depois, junta de Fauna começou a cobrir a peculiar sepultura. Tudo terminado, apesar do cansaço e da sujeira, sentiu-se bem. Voltou-se para Adrianna e disse-lhe:

EstelaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora