Capítulo 23

1.3K 256 228
                                    

Meus joelhos viraram gelatina, e eu cai para frente. Rolei para manter meu rosto fora do chão. Meu corpo parece uma estátua de bronze puro: pesada, dura, inquebrável e imóvel.

O pavor de mim mesmo foi expelido do meu corpo em forma de lágrimas ásperas.

Segurei-me para não matá-la, então a salvei, sim, eu a salvei de virar almoço de lobo. No entanto, a destruí, como quem destrói secamente uma flor.

Ace, eu te... O que está acontecendo? O-o-o que aconteceu com você? Por que está chorando? Não me diga que... — a voz carregada de preocupação do Nicholas é a coisa mais doce que eu poderia receber depois de tudo o que fiz. Não tentei expeli-lo da minha mente, nem esconder-lhe nada.

— Veja com seus próprios olhos... — apertei os olhos, cobrindo-os com as mãos frias e rígidas.

Voilà. Liberei cenas sórdidas cobertas por uma penumbra sobressalente, como um filme atingo assistido de um celular com pouca luz.

Senti os pensamentos de Nick se tornarem pulsantes como corações batendo sonoramente em uníssono.

Ó, Ace, o que você foi fazer? — Nicholas manifestou-se com um choramingo.

Retirei as mãos do rosto e abri os olhos, baixandos-os para meu pé nu. O tênis fora arrancado pelo lobo, agora, morto.

— Me desculpe... — deixei mais lágrimas se esvairem de meus olhos cemicerrados.

Vem até aqui, rapaz. Vou lhe preparar um copo bem grande de seu chocolate quente. Precisamos ter uma breve conversa...

Tudo o que preciso, Nick, é de um pouco de rispidez, um psicólogo e uma grande forca.

Então posso cortar o "psicólogo" da lista? Você não vai precisar de terapia se estiver sucumbindo à morte numa forcaessa foi a tentativa de Nicholas fazer-me rir; ignorei, depois em senti mal por não ter sorrido.

— Não interessa, Nick. É só o que eu preciso... — mal sabia o que estava falando. Minhas palavras soam tão vazias e irrelevantes quanto um bolo de lama recheado com clips de papel

Tudo bem. Está tudo bem...

— Você sabe que nada está bem, não sabe? Percebe que eu acabei de destruir duas vidas?

O lobo iria matá-la, Ace. Você a salvou. A garota está viva agora. Isso não é o mais importante? — a voz de Nick é um monte, bem grande, de compreensão, o que me faz sentir culpa por estar sendo tão ríspido.

Me pergunto o que Nick estava pensando quando me abrigou do sol em todas as suas casas espalhadas pelas cidades mais nubladas e frias do mundo. Eu não conseguia lê-lo, Nicholas me mostrou como poderia ler qualquer outro vampiro, como distinguir as mentes humanas e como discernir as mentes das pessoas que sempre moraram à quilômetros e mais quilômetros de nós.

Eu deveria mesmo ouví-lo; não deveria ter aparecido para a Senhorita Mountain. Ele me mandou manter distância dos humanos... E o que eu fiz? Eu segui aquela humana, eu apareci para ela como um passe de mágica.

Não se culpe tanto, Senhor Nevasca. Logo, logo isso vai passar, nos mudaremos de cidade na primavera e, se quiser, não voltamos para International Falls. Viveremos... Sei lá, no Alasca, em Prospect Greek ou na Rússia? Você escolhe. Podemos encontrar vampiros jovens por lá, vampiros que bebem sangue de hospitais.

Tudo bem. Nós podemos ir à qualquer lugar...

Senti o sorriso de Nicholas se aflorar fino e curto, mas, pouquíssimos segundos depois, senti sua expressão murchar e fragmentar as camadas de pensamentos difusos arquivados bem lá no fundo de sua mente gigantesca. Me perguntei o que havia de mais errado, saboreando a pergunta, pensando se a faria ou não.

Primavera & Chocolate (livro um)Where stories live. Discover now