— Então a Raynha te furou com o salto dela. E pelo visto o veneno já está fazendo efeito.

“Veneno... Então ela teve a mesma ideia.”

Avancei num impulso, forcei os os movimentos e realizei uma prolongada consecutiva de golpes. Alguns ele conseguia aparar, outros cortavam o vazio devido as suas esquivas, mas logo eu me via com o seu sangue em meu busto. Afinal, ele não era um pugilista tão bom assim. Eu apenas brincava ele, mas depois que ele me revelou do veneno, o ódio subiu a minha cabeça. Eu deveria ser tão rápida, quanto mortal.

“Não é de graça que eu vou morrer. Levarei mais um comigo.” Não sei se as frases saiam de minha boca ou eu apenas as imaginava. Via o meu adversário recuar e o meu fôlego me faltava a cada investida. A dor me castigava, a visão falhava e eu continuava. Cansaço, suor frio. Me joguei contra ele e esfaqueei o máximo que pude. Vi ele levantar a mão pedindo para parar; desci a lâmina, decepei dedos, fatiei a orelha, arranquei um olho.

— Piedade! — Ele suplicava.

— Piedade? — Desci a lâmina, abri um sorriso naquele rosto desacreditado que era forçado a chorar lágrimas de sangue. Um pedaço de sua língua veio na ponta da adaga. — Por acaso vocês tiveram piedade das mulheres que foram mortas. Vocês não só mataram elas, vocês arrancaram as almas delas, abusaram de cada uma, torturaram. — Não deixei sequer de enterrar meu punhal em seu rosto. Nenhuma vez. — Vá! Pro... Inferno! — A cada palavra, uma apunhalada.

Parei somente quando o seu braço estendido caiu, como a carne dura de um animal recentemente abatido. Finquei a ponta da adaga no chão e me apoiei nela para subir. Da ponta da minha arma branca ainda escorria o líquido rubro de seu sangue.

— Próximo! Não vê que ainda tenho forças para continuar. — Recuperei a minha arma de fogo. — Se eu estou de pé, é porque ainda posso lutar. — Novamente a minha visão ameaçava a ficar turva, dessa vez acompanhando o infortúnio meu olfato falhava. Era longe que eu sentia o cheiro do sangue do barman sobre mim. — Vamos. — Insisti novamente ao fantasma que não aparecia. — Eu já disse que havia sentido mais de uma presença.

— Não precisa se preocupar comigo. Eu não sou sua adversária.

A voz surgia ao meu lado. A poucos metros.

— Poderia baixar a arma, por favor. Como pode ver, eu não estou armada.

O novo fantasma cujo a presença da sua voz que denunciava era uma mulher. Ela surgiu pela mesma rua por onde eu havia passado, porém não veio pelo beco. Ela atravessou pelo outro lado da loja - o mais iluminado. Embora fosse uma mulher, havia algo de estranho nela. Seu andar, o jeito de falar, até a maneira como me olhava da cabeça aos pés; me analisando. Seu cabelo comprido da cor do mel estava preso num rabo de cavalo, suas roupas ocultas por um jaleco marrom comprido. Ela se aproximava devagar, dessa vez olhando para a minha arma.

— Eu sou a Doutora Sarina Havard.

“Uma médica?”

— O que uma médica quer comigo? Creio que eu não possa oferecer o que você esteja procurando.

— Pode sim. Porque o que eu procuro é uma assassina. Quero que me ajude a matar uma pessoa. Posso explicar melhor se puder guardar as armas.

Vendo que ela não apresentava uma ameaça decidi guardar as armas e ouvir o que ela tinha a dizer.

— Um dos alvos se chama Jenance Ishzark, um comerciante ilegal de órgão humanos. Assassino e sequestrador. É de suas vítimas que ele adquire os órgãos para o contrabando, geralmente a sua coleta provém de adolescentes e crianças...

— É estranho ouvir isso de uma médica. — Interrompi com um pouco de antipatia que eu não consegui evitar. No estado que eu estava não tinha tempo para conversas, quem dirá para um novo contrato.

— Bem, eu não sou uma médica. Do mesmo modo que você não seja uma profissional do sexo. — Ela me fitou com uma cara incompreensível. — Você não me parece muito bem.

— Impressão sua, eu estou ótima.

Ela continuou a me olhar com a mesma cara, decidida a se aproximar mais. Dessa vez ela não temia a arma em minha mão. Eu tentei disparar, mas não tive forças.

— Eu não preciso ser médica pra saber que você não está bem.

— Rá! Você não pode me ajudar. Nem se fosse médica.

Ela sorriu parecendo ter a solução para o meu problema.

— Eu me esforcei muito, e o veneno já infectou meu organismo.

Ela quase pulou de felicidade.

— Minhas roupas não são um disfarce. Garanto que enquanto estiver ao meu lado você não morrerá.

— E o que pretende fazer? Um milagre?

— Digamos que sim. Consegue caminhar até a ambulância?

— Ambulância?

— Você não me viu chegar de ambulância? — Ela acenou para alguém se aproximar. Eu olhei para a direção de onde ela tinha vindo e avistei a ambulância se aproximando. Ela não mentiu em relação a isto. — Aí está bom, Falkner. Jonas, pode vir me ajudar?

— Sim, Sarina. — Um homem respondeu saindo do veículo. — O que quer que eu faça?

— Venha, eu te ajudo a subir. — Decidi ceder a sua boa vontade. — Sente naquela maca, por favor. — Depois ela se virou para o amigo. — Pode dar um jeito naquele cadáver?

— Claro. — Ele respondeu.

Aquele homem também tinha as vestes escondidas num jaleco marrom. Ele se aproximou do corpo estirado ao chão e tirou uma garrafa de cana de dentro do jaleco. Aquela atitude de cada um deles - nem mesmo o veículo - não mudaria minha concepção de que tudo era um disfarce. Não. Ela não poderia me ajudar.

— O rosto desse cara está irreconhecível. Me lembrem de não tirar brincadeiras com essa mulher. — Ele tirou a tampa da garrafa e deu um gole.

— Achei que ía queimar o corpo dele. — Recriminou Sarina olhando para ele de dentro da ambulância.

— Calma garota. Eu apenas estou molhando a garganta. — De repente ele virou a garrafa derramando o líquido sobre o corpo do barman. Depois tirou um isqueiro de dentro do jaleco. — Mas já estou resolvendo o problema. — Em seguida vimos as chamas consumir o cadáver. Não me lembro de ter visto ele jogar o isqueiro. — Satisfeita.

— Vamos sair daqui antes que alguém apareça. — Jonas voltou e subiu no veículo. — Preparada para o que vai ver? — Perguntou voltando o entusiasmo para mim.

— Vamos Doutora. Realize logo o seu milagre.

Ela se aproximou pondo a mão em meu ferimento, por um momento eu pensei ter visto luzes entre os seus dedos. Depois não vi mais nada.

Minha nossa! Jonas, me ajude aqui. Deite-a sobre a maca.

Contos De Anti-heróisWhere stories live. Discover now