IX: Desequilíbrio

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Não dá pra definir com certeza aquele momento. Milhões de informações inundaram minha mente ao mesmo tempo, junto com tantas sensações que pensei que meu corpo fosse entrar em colapso pelo excesso.

Primeiro, ao constatar a dura realidade, veio a loucura. Eu estava sonhando, aquilo era mentira, uma invenção, uma alucinação, uma brincadeira de mau gosto do meu cérebro. Não podia, não era verdade, não tinha como ser!

Depois, veio o medo, o desespero. Eu fiquei pregada no chão, meu queixo caiu e, apesar dos tremores, não podia me mexer um centímetro que fosse. Não sei de onde, mas as lágrimas vieram, e caíram como uma cachoeira dos meus olhos. Era verdade, a mais pura, injusta e detestável verdade. Eu não podia fazer de conta que não.

Então, veio a coerência, a razão e a raiva. Eu tinha que matá-lo. Eu era uma caçadora – até mesmo Jonas sabia disso. A coisa certa a fazer era atingi-lo, imobilizá-lo, fazê-lo sofrer para, enfim, matá-lo. Mas, eu não podia.

Tudo isso em um minuto. Quando notei que era verdade, que eu estava chorando, e que não era forte o bastante para conseguir me obrigar a matar aquele vampiro bem diante de mim, me movimentei direto para a porta, para longe dele, e gritei com tanta força e tanto ódio que meu grito poderia ter partido a Terra ao meio.

E eu chorava. De raiva? De dor? De tristeza? Por amor? Nunca saberei dizer. Uma enorme mistura de tudo, eu acho. Meus olhos embaçados e encharcados com as lágrimas não eram capazes de ver minha direção. Num momento, estava lá, naquele inferno construído especialmente para mim; no outro, eu estava no meu carro, dirigindo para o nada.

As horas se passaram. Ruas vieram e se foram. Luzes fortes, carros, buzinas, sirenes, freadas. Tudo num turbilhão irregular e distorcido pelos meus olhos molhados. Eu dirigia em velocidade que certamente não daria tempo de frear antes de causar um acidente.

E talvez, pensei, fosse esta a solução. Morte. Fim da linha. Era tudo o que eu queria naquela hora, bater o carro num muro e morrer sem tempo de socorro, ficar livre daquilo tudo. O mundo era completamente intolerável agora.

Eu pensei que ele me amasse. Eu achei que havia uma maldita chance, ainda que mínima e única, de me abrir de novo. Realmente imaginei que alguém tão imensamente amaldiçoada quanto eu poderia ser feliz.

Mas não. Nada disso. Porque desde que levaram a pessoa mais importante para mim embora e eu descobri a existência da escória assassina da Terra, minha vida virou um caos. E, uma vez no meio do caos, não havia mais volta. Não existia segunda oportunidade.

Jonas tinha me vencido, afinal. Eu tinha sido fraca e me deixado conquistar por palavras bonitas e atitudes pensadas. Eu podia negar o quanto quisesse, mas estava apaixonada pela droga de um vampiro, meu pior e mais natural e odioso inimigo. Tanto que era incapaz de seguir meus instintos de caçadora e decapitá-lo.

E agora? O que eu ia fazer agora que sabia da verdade? Como eu poderia suportar viver, como aceitaria respirar, sabendo que cada vez que o meu coração batesse o escutaria gritando e sofrendo pelo meu amor por um monstro? Como eu poderia vê-lo todos os dias, e desejá-lo apesar da minha repulsa, depois disso?

Estupidez minha acreditar que nada de pior poderia acontecer comigo depois de ter perdido Lucas. Embora eu não me julgasse invencível, estava crente de que nada jamais me atingiria com a mesma intensidade de novo, como se a dor fosse apenas ricochetear e ser lançada para longe pelo meu casulo protetor.

Como eu tinha sido tola de pensar isso. Meu casulo tinha deixado de me proteger quando eu permiti que o Jonas adentrasse em minha vida. A dor que eu sentia agora era inacreditável, até mesmo para mim. Pior do que ter seu coração arrancado é não ter um para arrancar – a dor passa por você, inicialmente insensível, preenchendo o seu buraco com uma falsa esperança, para depois tirar pedaço por pedaço de você, no lugar do que usualmente tiraria, até que não te resta mais nada.

Vermelho SangueTempat cerita menjadi hidup. Temukan sekarang