Cap. 21

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Naomi foi a primeira quem pressentiu que algo acontecia, enquanto eu conversava com o povo. Ela se aprumou e se colocou em posição de guarda, se aproximando de mim. Eric se alarmou com o comportamento da rainha e tratou de se colocar a centímetros da minha frente, na diagonal do palco. Eu, não percebia nenhum desses movimentos, porque estava absorta contando ao povo o que faríamos a seguir e como eles poderiam me ajudar. Seguindo as instruções de Eric, não comentei nada sobre Soleil fazer parte, ou não desses planos, apenas que ela estava em segurança, até onde me constava.

-Sei que parece complicado, também, mas quero que vocês conheçam uma pessoa muito especial. –disse olhando para Eric e fazendo sinal para que abrisse a porta e deixasse Ivy sair para ficar ao meu lado. Eu não tinha certeza se ela mesma já sabia que éramos irmãs, se Eric tinha conversado com ela, mas sentia que provavelmente sim e sentia que devia aquela demonstração pública de aceitação à minha mais nova caçula. Peguei pela mão e passei meu braço pelo seu ombro. –Esta é Ivy. Ela é minha irmã. Ela é vossa princesa. –muitas pessoas se sobressaltaram, algumas até tentaram puxar uma vaia, mas eu mantinha o meu orgulho e isso pareceu derrubar qualquer problema, ou mesmo qualquer manifestação contrária. Eu sorria e olhava para Ivy, esperando que ela entendesse que também deveria levantar o queixo. –Não posso mentir para vocês e dizer que o casamento dos meus pais era um mar de rosas e que eles se amavam ternamente. Eles amavam Althea dessa forma, não um ao outro. Ivy é fruto de um amor sincero, mesmo que extraoficial e nós não soubemos dela, até recentemente. Minha família acabou de ficar maior, meu coração acabou de receber mais amor e eu espero que vocês não tenham dificuldade em ver, o que eu já vejo. –olhei para Ivy que, assim como eu, sorria. –Uma verdadeira princesa.

Assim que terminei de falar essa sentença, senti apenas uma dor latejante e institivamente olhei para o meu braço. Um corte tinha sido feito, com uma bala que passara de raspão. Meu braço ardia, mas não o suficiente para me ferir de verdade, ao ponto de abaixar a cabeça. Mas apenas no momento seguinte, quando vi uma mulher, caída no chão, com sangue borbulhando de dentro de um buraco feito em seu peito que eu entendi que tinha se tratado de um ataque indireto a mim. Talvez até uma aviso.

O grito saiu automaticamente e eu me ajoelhei à frente da multidão que se aglomerava. Ia descer do palanque, mas Naomi me segurou.

-Você não deve fazer isso!

-Eu preciso! –exclamei pra ela.

-Mas não pode! –Naomi segurou o meu braço bom e fez sinal para Eric se aproximar, sendo ele quem me tirou do meio da confusão, rapidamente me colocando dentro da carruagem. Meu braço sangrava pelo corte feito pela bala e Ivy permanecia calada, enquanto segurava com firmeza um pedaço de tecido, que eu não sabia de onde tinha surgido, em cima do meu machucado.

-Não era para ninguém morrer. –balbuciei, ainda encarando o chão.

-O que você disse? –Naomi indagou, colocando a mão sobre a minha.

Eu a tirei com rispidez, levantei o rosto e senti as lágrimas escorrendo na minha bochecha. –Não era para ninguém morrer! –exclamei trocando olhares com a Dracon. Sem margem alguma para que ela pudesse fazer algum comentário sagaz, ou fazer qualquer tipo de grosseria. Aquele era o meu povo e o meu povo estava sendo morto desse jeito? Silencioso, rasteiro, cruel. –Com que frequência isto tem acontecido, Eric? –perguntei depois de um tempo respirando profundamente, em busca de alguma calma.

-Com muita frequência. –ele respondeu, mas seu rosto estava virado para a janelinha da porta da carruagem.

-Quem era aquela mulher?

-Mãe de Loyde. –finalmente Eric olhou para mim. –Ela era responsável pelos anúncios da Rádio Informativa. Ela deve ter sido morta por isso. –seus olhos estavam murchos e cansados, assim como eu vinha percebendo-o desde que começamos a nos aproximar de Althea. –Vou chamar o conselho. Temos muito que conversar e decidir.

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Eu pensava que ia ficar na casa de Eric, uma casa com um quintal grande que, por mais torto e estranho que isso possa soar, eu tivesse alguma condição de ficar tomando um ar puro de vez em quando, mas quando chegamos ao local que ficaríamos, percebi que estava enganada. Na verdade ficamos em um galpão abafado, cheio de tendas, cheiro de ferro e pessoas suadas. Uma tenda central aparecia aos meus olhos e conforme nos aproximávamos dela, as pessoas que me viam curvavam-se em cumprimento.

Assim que entrei na tenda central, tive um dejá vù completo e fiquei levemente atordoada. Era como se estivesse de volta ao circo e todos os meus medos voltaram como uma avalanche. Medos de decepcionar, medos de não ser boa o suficiente e medo de estar fazendo tudo errado. De repente não consegui fazer o meu corpo se mover. Era como se estivesse frente à Hungru e suas palavras de família, confiança e comunidade começaram a invadir a minha mente. Senti-me fraca.

-Luna? –Eric se aproximou de mim e segurou meu braço. –Você está bem?

Mas eu não estava.

Tudo ficou preto.

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Meus olhos estavam tão pesados quanto o resto do meu corpo. Meu braço doía e quando levei a mão no rosto, senti uma presença perto de mim. Sentei-me exasperada, mas me deparei com Tevrone, o único dos sete representantes da nação Altheana que há dez meses não tinha opinado de maneira ríspida sobre mim.

-Acalme-se, Alteza. –ele disse daquele jeito calmo e paternal. –Você está em segurança.

-Quanto tempo eu fiquei desacordada?

-Algumas horas. –suspirei com a resposta. –Vossa Alteza está se sentindo melhor?

-Relativamente. –olhei o curativo no meu braço. –Isso não é nada demais, não é?

-Agora não é mais. Cuidamos para que vossa alteza não ficasse mais tonta. –meneei com a cabeça agradecendo. –Vossa Alteza precisa de algo? Água, comida, Eric?

Com esse último, não pude deixar de corar. Eric era uma opção de necessidade? Mais ainda, Eric era uma opção de necessidade para mim, especificamente? Sorri entregando o meu completo embaraço.

-Apenas complicado? –ele sugeriu, mantendo o tom paternal e eu me surpreendi em pensar como me sentia a vontade perto daquele homem que tivera apenas um breve contato, há meses.

-Apenas...Tevrone, Eric contou para vocês sobre o documento do meu avô?

-Sim. O que vossa alteza pensa sobre isso?

-Eu estava querendo saber o que você pensa sobre isso. Da última vez que conversamos você tinha ideias muito interessantes sobre o caso.

Ele parecia agradecido sobre isso. –Já que vossa alteza se lembra da nossa última conversa, deve-se lembrar que disse que não tinha dúvidas sobre a liderança ser real em si, porém...

-Latente. –completei, como uma boa aluna.

-Exato. –já estava ficando cabisbaixa pensando que talvez ele fosse reafirmar o que tinha me dito naquele tempo, no entanto. –Agora é diferente. Seu olhar é diferente. Você não se curva, mesmo que pareça estar triste. Acredito que tenha aprendido uma das maiores lições que se pode aprender como um líder. –ele deu uma breve pausa, até que tivesse certeza que meus olhos estavam fixos nos dele. –É preciso envergar, mas não se pode quebrar. É preciso se manter firme, mas não se pode exigir. Vossa Alteza está diferente, não há dúvidas, e o seu discurso me fez acreditar que tem algo a me dizer.

-Sim. –respirei fundo e firmei ainda mais o olhar em Tevrone que parecia ter esperado muito tempo para ouvir isso da minha boca. –Estou pronta para ser Rainha.

Assim que essas palavras saíram dos meus lábios, Naomi passou pela entrada da tenda, trazendo um rebuscado papel cartão e jogando no meu colo. –Eles morderam a isca. Você foi convidada para ir ao castelo.

Peguei o papel e encarei aquela letra que me convidava a ir no "por do sol do dia seguinte ao castelo, jantar em busca de um meio termo diplomático para a atual situação de Althea". Eu conhecia aquela letra e não entendia como as coisas poderiam se encaixar, ou mesmo fazer sentido naquele momento. Aquela era, sem sombra de dúvidas, a letra de Soleil.

Diamante da LuaWhere stories live. Discover now