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Quando a gente é muito jovem, ser amado parece ser o problema essencial da nossa existência. A gente se apaixona com tanta facilidade, e com tanta frequência, que encontrar alguém que retribua na mesma intensidade parece a parte mais difícil da vida. À medida que o tempo passa, se você for honesta com você mesmo, vai perceber que a parte difícil da vida é gostar por muito tempo de alguém. Vai notar que as pessoas passam, algumas mais legais do que as outras, mas que apenas algumas delas, muito poucas, estabelecem com você um vínculo essencial. Essas pessoas que ficam são especiais – e a grande pergunta é por quê? Os cientistas e os filósofos dizem que há perguntas boas e perguntas ruins. As ruins são aquelas cujas respostas não levam muito longe no caminho do entendimento. As perguntas boas, ou certas, são aquelas que abrem horizontes e direcionam a nossa curiosidade em direção ao que realmente importa. Por que algumas pessoas ficam na nossa vida, e outras, não, é, para mim, uma dessas perguntas que fazem a diferença. Esses dias eu pensei nisso por causa dos meus gostos, peculiares, principalmente inteligencia. Culpem os que não têm qualquer interesse pelo assunto. Me envolvo emocionalmente com esse negócio de música boa, estilo, até mesmo jeito de falar, e já descobri, a contragosto, que posso ser uma pessoa melhor se tenho alguém parecida comigo por perto, mesmo que só amizade. Fico pensando como seria viver com uma pessoa que não tivesse qualquer empatia com as minhas coisas? Se ela odiasse o meu estilo, e o que poderia ser pior, poderia ser alguém – existem muitas – que genuinamente desdenha e me tratasse como idiota. Quando não há afinidade e compreensão, qualquer coisa é motivo de briga. Até qualidades. O importante dessa história boba, eu acho, é perceber que na nossa vida tem de haver gente que nos entenda e que tenha conosco um grau elevado de empatia. Sim, podemos conviver com diferenças. Claro, personalidades diferentes nos desafiam. Mas isso tudo fica melhor na no trabalho e na vida social. Na intimidade a coisa é outra. Você não quer um olhar de total incompreensão cada vez que certo tipo de filme te levar às lágrimas. Nem quer ter de dar explicações quando tiver vontade de deitar no sofá da sala e ficar quieta, preferencialmente recebendo um cafuné. Se você é esse tipo de pessoa, tem de ser o tipo de alguém que entende e participa. Ou então não rola. Minha impressão, pelo acúmulo de experiências, é as pessoas mais duradouras conosco tendem a sair de um espectro estreito de personalidades, valores e visão de mundo. Para mim é um sinal saudável – e uma pista importante – que a gente repita a preferência por certos traços na hora de escolher pessoas. É que por trás dessas coisas que a gente vê há outras coisas, mais profundas, que nem sempre se percebem, como família e história pessoal. Elas definem quem cada um de nós é, e qual a nossa capacidade de viver juntos. Esse tipo de coisa não se improvisa e nem se ignora. É como um uma música: para nos dar prazer de verdade, tem de ser parte da nossa história. Ou então não tem graça nenhuma.

Quimeras AbortadasOnde as histórias ganham vida. Descobre agora