Capítulo 1 - Dias Atuais

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Um minuto para tocar e eu fazia a contagem regressiva. Segunda-feira, dia mundial da preguiça para muitos, e de felicidade por ter um trabalho que eu adorava para mim.

Assim que o despertador cumpriu a sua função, o desliguei. Levantei-me, fiz toda a minha higiene, me arrumei e fui para a cozinha preparar um café, com o intuito de começar o dia com energia. Enchi uma caneca, fiz uma torrada e sentei na bancada. De maneira automática, eu mordiscava o pão endurecido e bebericava o líquido negro. Não prestava atenção no que fazia, mas sim me lembrava das minhas eternas noites, na companhia de um homem imaginário.

Quase ninguém sabia sobre a minha sina. Apenas minha mãe e a minha melhor amiga, Letícia, que me aconselhou a procurar uma ajuda espiritual. Eu não tinha preconceitos com religiões, mas também não era adepta de nenhuma. Preferia me manter distante. Dessa forma, tentava levar a minha vida da melhor maneira possível, mesmo que me sentisse incompleta. Afinal, eu era apaixonada por um homem que só me visitava em meus sonhos. O quanto de insanidade há nisso? Mínima ideia, eu diria.

De toda forma, ninguém poderia imaginar que eu era louca a ponto de não namorar, não é? Porque eu namorava! E, pelo amor de Deus, nunca fui uma virgem esperando pelo homem dos meus sonhos, literalmente falando.

Eu era uma jovem, quase balzaquiana, com uma vida sexual ativa e satisfeita. Nunca tive namoros longos, não conseguia me apegar a tal ponto. Quando acreditava que o relacionamento caminhava para algo mais sério, eu começava a me distanciar. Não sentia necessidade de ficar com alguém durante muito tempo, nem queria fazer a outra pessoa sofrer. Na única vez que pensei em levar um namoro adiante, pensando em um relacionamento mais sério, senti uma pressão tão grande no peito, junto a uma tristeza profunda e vontade de chorar, que desisti. Eu compreendia que isso não poderia ser algo de todo normal, mas sempre creditei esse evento à minha forte personalidade e ao meu medo de compromissos. Era como se eu sentisse necessidade de ficar livre.

Mesmo na adolescência, com os meus namoricos, temia me envolver com mais seriedade, pois acreditava que meus estudos não podiam ser prejudicados. Ao menos, eu colocava a culpa nos estudos. No entanto, tudo piorou aos dezoito anos, quando comecei a sonhar com o meu homem sem rosto. A partir daí, minha ânsia de liberdade só fez aumentar.

Nada de relações sérias demais. Namorava sim, porém, com prazo de validade estipulado na minha insana cabeça. Isso até eu querer dar um basta e levar algo à frente. Aí, veio o medo. Um temor tão grande e forte, que me fez dar um passo atrás e voltar a minha vida de sempre. Eu nem gostava mesmo do tal rapaz a ponto de me amarrar. Foi mais uma crise dos vinte e seis anos. Irrelevante e rápida. Ainda bem.

Mas tudo isso ainda não chegava perto do mais estranho na minha vida. Não mesmo. A coisa mais esquisita era a sensação de que faltava algo em mim. Eu não me sentia uma pessoa completa. Nunca consegui explicar isso e nunca contei sobre esse sentimento para ninguém, nem para a minha mãe e muito menos para Letícia. Era como se eu tivesse perdido alguma coisa, que eu nem sabia que estava lá em primeiro lugar. Loucura, eu sabia. Em um determinado dia, pensei em compartilhar essa esquisitice com a Lê — apelido carinhoso que eu e minha mãe havíamos colocado em Letícia. Contudo, como mal eu havia começado a confessar e ela já repetia a conversa sobre o tal auxílio espiritual, desisti de falar. Nunca mais voltei a tocar nesse assunto.

Balancei a cabeça, tentando afastar essas malditas lembranças e consequente autoanálise. A mudança no sonho havia me feito mergulhar no passado, resgatando memórias e sensações que estavam há muito adormecidas.

Levantei e coloquei a xícara suja na pia. Me apoiei na bancada e olhei para a parede na minha frente.

— Ah! — gritei, frustrada. — Eu deveria era transar, isso sim!

Fui na sala e peguei a minha bolsa. Precisava andar cerca de três quarteirões para chegar ao meu trabalho. Uma caminhada tranquila e revigorante.

Saí do meu apartamento e apertei o botão do elevador. Enquanto esperava o equipamento chegar ao meu andar, pensei mais uma vez sobre uma possível transa.

Ainda bem que, mesmo com as minhas loucuras, o sexo nunca tinha sido um problema. Pelo contrário, sempre foi excelente, obrigada! Entretanto, eu costumava ser bem seletiva com os meus pares. Regras simples, porém bem claras.

Nunca no primeiro encontro;

Cara legal e próximo da minha idade — no máximo cinco anos mais velho e dois mais novo;

E, por último, pelo menos um mês de encontros frequentes — essa podia ser quebrada, dependendo do caso.

Do jeito que eu estava me sentindo, era bastante provável que abrisse uma exceção para elas. Apenas para eu melhorar. Depois dessa última noite, precisaria que algo excepcional acontecesse para me fazer parar de pensar. Algo com o que eu pudesse me entregar... Uma transa boa seria uma opção.

Nesse instante, o elevador chegou ao meu andar e eu entrei. Decidida a não mais pensar nos meus conflitos existenciais — incluindo meu homem imaginário e uma possível necessidade de sexo — entrei na caixa apertada de metal e fui para o trabalho.

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