Mas eu sabia que não era.
Aquela casa nunca foi só uma casa.
— As fitas, Jade... — murmurei. — Você não devia ter tocado nelas.
— Você e suas superstições. — Ela bufou.
O som das palavras dela ecoou pelo corredor, voltando deformado.
Como se a casa tivesse repetido — num sussurro rouco, meio arrastado — as mesmas palavras.
"Superstições..."
Meus pulmões travaram.
Ela não ouviu.
— Vem, quero ver o resto. — disse, puxando minha mão.
Três, contei mentalmente.
O corredor parecia mais longo do que lembrava.
As portas estavam todas abertas agora, e eu não as tinha deixado assim.
O espelho do fim do corredor, o mesmo que minha mãe cobria com um pano preto, refletia apenas a Jade — não a mim.
Ela riu, ajeitando o cabelo. — Olha, não tem nada demais-
Um estalo.
Baixo, rápido.
O pano preto caiu.
E no reflexo, atrás dela, algo se moveu.
Algo com mãos pálidas demais.
E olhos fundos o suficiente pra devorar a luz.
— Jade, não olha pra trás. — sussurrei.
Ela riu outra vez, achando que era mais uma das minhas "paranóias".
Mas o riso dela morreu no meio.
Seco, abrupto.
Os ombros dela se enrijeceram.
O corpo tremia, e os olhos... os olhos começaram a lacrimejar sozinhos, sem emoção, sem som.
— Liss... o que é isso? — a voz dela saiu trêmula, rouca.
Eu não respondi.
Porque a coisa já estava ali.
Entre nós.
Uma sombra humana, de costas, balançando lentamente a cabeça.
Os fios do cabelo dela — ou do que restava dele — se misturavam às fitas vermelhas que agora cobriam o chão como raízes.
"Onze regras." — a voz soou de algum canto, como um sussurro que vinha do teto, do chão, do meu próprio crânio. — "E você quebrou três."
O corpo de Jade foi puxado pra trás com uma força brutal.
Ela não gritou — o ar não saía.
Só o som seco da madeira rachando, a velha passou os dedos deformado pelo seus olhos antes de quebra a sua mão em um som horroroso, um grito, foi o suficiente para arrancar uma gargalhada satisfeita dela, seus dedos subiram novamente e sua unha penetrou seus olhos, um ultimo grito, ele foi tão alto que parecia que a casa havia se mexido e logo depois, um silencio ensurdecedor.
Três regras.
Três regras quebradas.
E a casa... satisfeita.
⋅•⋅⊰∙∘☽༓☾∘∙⊱⋅•⋅
Quando dei por mim, estava correndo pela chuva.
Descalça.
Sangue quente escorrendo das mãos, sem saber se era meu.
Não lembro de ter aberto a porta.
Nem de como saí dali.
Mas lembro da voz...
A mesma que agora ouço toda noite, do lado de fora da janela:
"Você voltou, Liss.
Mas da próxima vez... Me fale sobre todas as regras."
⋅•⋅⊰∙∘☽༓☾∘∙⊱⋅•⋅
Nota da autora
Olá, meus moranguinhos! Estão bem? 🍓
Antes de tudo, quero deixar algo bem claro: não haverá notas da autora em todos os capítulos, ok? Eu definitivamente não curto isso. Porém, quando houver, será apenas para esclarecer algum ponto que eu sinta que não ficou totalmente claro. Dito isso, vamos aos três pontos importantes:
1° — Sobre a personagem Jennie
Na minha obra primária, quem morava na casa era a Jennie.
Dessa vez, decidi mudar um pouco, na verdade apenas uma troca de personagens. Para quem não leu a primeira versão provavelmente não mudou absolutamente nada, mas pra quem leu.. aqui o esclarecimento. — sim, a Jennie é intersexual.
2° — O que é intersexualidade
Intersexualidade é uma condição em que a pessoa nasce com variações nos órgãos genitais, reprodutivos, cromossomos ou hormônios que não se encaixam nos padrões típicos de sexo feminino ou masculino.
Essas características podem incluir um código genético diferente, alterações hormonais ou diferenças anatômicas, e podem ser percebidas no nascimento, na puberdade ou até mais tarde na vida.
É importante entender que a intersexualidade não é uma doença nem um distúrbio. Algumas pessoas intersexo escolhem fazer tratamentos de afirmação de gênero — como o uso de hormônios ou cirurgias —, mas isso é uma decisão pessoal.
A diferença entre hermafrodita e intersexo está justamente no conceito:
O termo hermafrodita era usado para descrever pessoas com características físicas de ambos os sexos desde o nascimento.
Já o termo intersexo é mais abrangente e atual, englobando variações cromossômicas, hormonais ou anatômicas.
Vale lembrar que o termo "hermafrodita" já não é mais utilizado na medicina, por ser limitado e inadequado. Hoje, o termo correto é intersexo ou distúrbio/diferença do desenvolvimento sexual (DDS).
No caso da Jennie, especificamente, ela possui características de ambos os sexos — uma escolha narrativa feita de propósito para a construção da personagem e da história.
3° — Sobre a cidade
Lonrailand não existe! É uma cidade completamente fictícia, criada especialmente para o universo desta obra.
Era apenas isso, kiss meus morangos
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𝓲𝓷𝓯â𝓷𝓬𝓲𝓪
HorrorO que você lembra da sua infância? O cheirinho de biscoito saindo do forno? O bolo caseiro da tarde? As gargalhadas, as brincadeiras inocentes no quintal? Pois é... essa é uma infância comum. Mas eu não sei o que é ser comum. A minha infância foi um...
