Capítulo Dez

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É domingo. Está um dia bonito. Mas me lembro de que Lexie está no hospital, e tudo desmorona outra vez. Como cereal e me arrumo o mais rápido possível, pois já passa das nove. Escuto um barulho na sala, e já penso no pior. Ou é um bicho ou um ladrão. Pego um taco de beisebol que encontro no corredor, e desço as escadas devagar. Ao chegar na sala, sinto passos atrás de mim.

Não penso duas vezes e acerto Theo no braço.

— Ai! Bom dia para você, também.

— Theo! Não sabia que era você. Me desculpe.

— Tudo bem. É que a porta estava aberta, então entrei.

— Estava? Que susto você me deu garoto!

— Pensou ser um ladrão?

— Sim... Não sei, só sei que ia te bater bem muito se não fosse sua voz, que reconheci. Porque você parece um ladrão com essa touca. — Ele ri. Mas é verdade, com essa touca preta e uma camisa de manga comprida cinza, ficou irreconhecível. — O que está fazendo aqui?

— Vim te convidar para sair, tomar um ar.

— Eu bem que gostaria, está um dia tão bonito. Mas tenho que ir para o hospital. — ele me olha assustado.

— Por quê?

— Lexie. Teve que fazer uma cirurgia no útero.

— O que ela tem?

— Endometriose. Mas, parece que não é tão ruim a situação.

— Então, por que a cirurgia?

— Prevenção.

— Posso ir com você?

— Tem certeza de quer ir ao hospital no domingo?

— Por que não? Dizem que o café de lá é ótimo. — consigo sorrir em meio a tudo isso.

— Ah, claro. — saímos de casa, e paro na esquina para esperar um táxi. Theo continua andando e, quando percebo que ele não vai parar, o chamo.

— Ei, para onde está indo?

— Vamos à casa do Logan, pegar o carro.

— Não precisa...

— Vamos lá, Heather, hoje é domingo. Não vai aparecer um táxi tão cedo. O Logan nem vai usar o mesmo, só vive no quarto jogando videogame.

— Está bem. Agora vamos logo, já está tarde.



Ao chegarmos no hospital, encontro minha mãe, que pegou as coisas que eu lhe trouxe e foi tomar banho e se alimentar. Theo e eu ficamos no quarto olhando Lexie dormir, e fico pensando em como diremos para ela a doença. Ela vai ficar arrasada. Como quando teve asma. Ficava triste o tempo inteiro, e o meu pai a distraía quando uma crise lhe deixava nervosa. Ele estava sempre com ela. E agora, que precisa dele de novo, não estava mais lá. Só percebo a ausência de Theo quando ele volta, com um copo de água para mim, e café para ele.

— Sério? — digo apontando para o copo e sorrindo para ele.

— Até parece que não faço o que falo. E este está ótimo.

— Sim. — minha mãe volta com um homem de jaleco, com os cabelos grisalhos, porém jovem. Está com uma prancheta na mão, e percebo ser o médico que está no caso da Lexie. Seu crachá diz seu nome: Dr. Matthews. Ele faz um sinal com as mãos para sairmos da sala.

— Então Dr. Matthews, como ela está?

— Bem, o caso dela é muito raro. É muito difícil garotas de quinze anos apresentarem essa doença. São mais atingidas mulheres aos trinta anos — ele faz uma pausa olhando para nós três.

 — Como deve saber, senhora Stinfer, a endometriose é benigna, mas, tem todo o processo como as outras doenças. Ela estava tendo um sangramento intenso ontem, e, ao examiná-lá através da ultrassonografia, vi que havia um cisto se dilatando e provocando ainda mais as dores. Tive que fazer uma laparoscopia para ver como estava. Seu estado está no início, então só vou passar uns analgésicos, pois ainda não posso passar medicamentos pesados.

— Quando poderá ir para casa? — pergunta minha mãe.

— Ainda hoje. Irei esperá-la acordar para fazer mais alguns exames e poderá ir.

— O caso dela é raro? — eu continuo processando tudo o que ele disse.

— Sim. Principalmente por nem você, nem sua mãe terem endometriose. Mas, isso não torna as coisas complicadas. É só preocupante.

— Doutor... Ela vai mesmo ficar... Estéril? — diz minha mãe, aflita.

— Provavelmente. Se uma mulher adulta tem 20% de chance ter esterilidade, ela aos quinze pode vir a ter na frente.

Tento segurar as lágrimas, e Theo me abraça. O médico se retira e nós voltamos para o quarto. Lexie está acordada tentando se sentar. Minha corre em sua direção, se sentando ao lado e perguntando como ela está.

— Estou bem, mãe. Feliz por não sentir mais dor.

— Que bom querida. Vou chamar o médico para vê-la. — minha mãe sai à procura do médico.

— Oi, Theodore, que bom que veio.

— Como você está garota? — diz ele sorrindo.

— Bem melhor. — responde, tentando se levantar, mas sente dor e eu a repreendo.

— Não se levante. Fez uma cirurgia ontem. Não deve fazer esforço.

— O quê? — ela pergunta e levanta seu pijama de hospital, ou seja lá o que for aquilo. E se assusta ao ver alguns pontos em seu abdômen. — Não sabia. Então quer dizer que estou doente? Estou com aquela doença que a mamãe falou?

— Lexie, você está bem. É isso o que importa.

— Não foi isso que perguntei. — minha mãe entra na sala acompanhada do médico e se depara com Lexie quase chorando e ela já entende o porquê, começando a explicar.

— Você está com aquela doença que te falei, lembra? Não é nada grave.

— Então, por que tem pontos em minha barriga?

— Foi só para você não sentir mais dor, você tinha um cisto. Era o que causava mais dores. Amanhã você recebe alta, é só esperar os pontos cicatrizar. — o médico diz, me livrando da barra. — Agora, se me dão licença, preciso sair. — e sem esperar reposta, se retira.

Ficamos lá por muito tempo conversando. Theo começa a contar a série nova que começou a assistir. E Lexie se distrai e demonstra um certo interesse, e não acho que seja pela série, porque é medieval, sobre guerras e tudo mais. Ela demonstra interesse pelo Theo, que está tão deslumbrado pela série, que nem percebe o jeito como ela o olha.

— Bom, eu já vou tenho umas coisas que preciso fazer.

— Tem que devolver o carro?

— Também.

— Te levo até lá.

Caminhamos até o estacionamento do hospital e para minha surpresa ele me abraça.

— Vocês vão ficar bem. Sempre deram um jeito. E Lexie é forte. Sei disso.

— Você é tão otimista quanto eu.

— Isso é bom?

— Claro que é.

Pelo menos, é sempre nisso que tento acreditar.


A HerdeiraWhere stories live. Discover now