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‘bem vindo a clareira’

3 anos atrás

Os passos apressados da corredora ecoavam pelos corredores silenciosos do labirinto. Seus pés chutavam algumas das eras que mais cedo usou para marcar o caminho de volta ao mesmo tempo que suas mãos trabalhavam prendendo seus longos fios no topo da cabeça. A alguns meses, Nina e alguns outros trolhos corajosos se voluntariaram para explorar a parte mais curiosa de toda a clareira.

No início foi difícil convencer Alby e Newt a deixá-los fazer aquilo, mas a garota era irritantemente insistente e persuasiva, e quando colocava algo em sua cabeça ninguém mais conseguia fazê-la mudar de ideia. Além disso, Nina era uma corredora excepcional. Sua memória e sua táticas para se lembrarem do caminho por onde vieram e como não se perder no meio dos muros que estavam em constante mudança eram brilhantes.

Nos sete meses que estavam vivendo presa atrás daqueles muros, a garota viu a clareira tomar vida e todo mês ganhar um novo habitante que não se lembrava de nada além de seu próprio nome. Sempre era uma imensa surpresa para todos eles descobrir a existência de uma única garota no meio daquele monte de brutamontes desajeitado, e ainda mais surpreendente quando descobriam da influência dela sobre aquele lugar e o respeito que lhe era direcionado por todos os demais.

— Alguma novidade por hoje, capitã Nina? — uma voz ofegante se fez presente tirando a garota de seus pensamentos.

O garoto agora corria ao seu lado em um ritmo calmo, ambos seguindo em direção a porta leste. George era um cara muito alto, de cabelos castanhos lisos e olhos como de um cachorrinho pidão. Chegou dois meses depois de Nina na clareira e desde o momento que a garota, pois os sobre o fedelho novo, soube que seriam inseparáveis. Nina sentia uma ligação profunda com o garoto desconhecido, como se o conhecesse a séculos, porém não conseguia lembrar de onde, se sentia confortável perto dele e George era um dos poucos que conseguia fazer com que ela fosse sincera e agisse como ela mesma.

— Já mandei parar de me chamar de capitã seu mértila ridículo. — esbravejou com um sorriso ladino. — Mas não, nada muito alarmante. Os muros se moveram novamente, apenas isso.

— O mesmo do outro lado. — contou o garoto ainda mantendo o mesmo ritmo. — Estava pensando...

— E desde quando você pensa? — zombou.

George forçou uma risada sem ânimo apenas fazendo com o sorriso da outra se alargasse ainda mais.

— Eu tenho uma ideia do que podemos testar dessa vez. — anunciou chamando a atenção da garota para o assunto.

— Por que sinto que não vou gostar dessa sugestão?

— Por que talvez você não goste nada dessa sugestão.

Nina desviou o olhar para a porta leste que se aproximava a sua frente sendo banhada pelo pôr do sol exageradamente alaranjado da clareira e respirou fundo se preparando para o que quer que fosse escutar daqui pra frente.

— Fale de uma vez. — mandou ainda correndo.

— Ainda não tentamos passar uma noite no labirinto. — apontou após soltar um longo suspiro nervoso.

Uma risada desacreditada escapou dos lábios da garota ao escutar a sugestão sem cabimento do outro corredor. Aquilo séria um completo suicídio, ninguém nunca tivera passado uma noite no labirinto, e apenas pelos sons que os verdugos faziam quando as portas se fechavam era bem compreensível o por quê disso.

— Nem por cima do meu cadáver. — respondeu sem encarar o garoto.

— Nina, você não está me entendendo, olha se...

— Você tem plong no lugar de seu cérebro pequeno, George? Não. Não vamos passar uma noite dentro do maldito labirinto.

A garota agora atravessava os limites da clareira enquanto corria olhando para trás com uma expressão nada boa em seu rosto. Aquilo era uma ideia absurda, além de terem poucos corredores e a maioria ainda estar em fase de adaptação, Nina não iria arriscar algo tão grande com tão pouco recursos. Ela não poderia perder ninguém por um movimento impensado.

— Nina!

— Esse assunto está...

Antes que a garota pudesse colocar um ponto final na insistência de George com aquela ideia maluca, um corpo forte e aparentemente desengonçado colidiu contra o seu próprio, fazendo com que a corredora e o outro trolho desgovernado fossem de encontro ao chão de terra da clareira. Nina semicerrou os olhos enquanto encarava o céu e resmungou xingamentos baixos se apoiando nos cotovelos para se levantar. Antes que o fizesse, suas iris azuladas pousaram sobre um garoto asiático que também estava caido de costas para ela  a alguns centímetros de distância. A forma como seu peito subia e descia e as lamentações que ele deixava escapar entregavam que o garoto parecia prestes a ter um ataque de nervos ao analisar os arredores do lugar em que se encontrava no momento.

Aquele deveria ser o novato do mês, todos eles acordavam exatamente da mesma forma. Assustados, desmemoriados e alguns até agressivos como foi o caso da garota. Algo naquele garoto fez Nina se recordar de quando ela própria acordara dentro da caixa sem se lembrar de absolutamente nada, a diferença é que agora haviam seis pessoas que poderiam ajudá-lo a sobreviver, diferente de Nina que só tinha Alby e talvez muita sorte.

No momento em que ele se virou e seus olhos negros puxados se fixaram nas iris azuladas da garota, um arrepio cruzou o corpo da corredora que ainda se mantinha parada no chão. O mesmo parecia acontecer com o novato, já que sua respiração ofegante pareceu ficar presa em seus pulmões enquantos seus olhos se mantinham sobre a garota. Havia algo naqueles olhos negros que a memória de Nina se recusava a lembrar, assim como os demais fatos sobre seu passado, ela sentia que se tivesse se esquecido de algo importante, algo que ela não deveria esquecer, mas ironicamente não se lembrava.

Os dois clareanos teriam continuado a se encarar em completo silêncio se George não tivesse atravessado no meio da visão da garota, lançando mil e uma perguntas ao mesmo tempo com seu instinto de irmão mais velho sempre prevalecendo. Nina negou todos  os questionamentos sobre possíveis ferimentos e se levantou batendo as mãos nas calças largas que usava para tirar a terra da mesma. O garoto também já estava de pé, ainda a encarando com a curiosidade nítida em sua feição. A corredora julgava estar ficando louca de fome e cansaço, pois pode jurar que quando seus olhares se cruzaram outra vez, um brilho prateado cruzou as iris escuras do desconhecido tão rápido que quase era imperceptível.

— Nina. — George chamou a tirando do transe. — Temos que passar as mudanças dos muros pro papel.

— Certo. — assentiu lançando um olhar a Newt que se aproximava do grupo.

— Tô vendo que já conheceram nosso novo fedelho. — comentou bem humorado o loiro.

O outro corredor deixou um risinho escapar enquanto se recordava da queda que agora parecia hilária em sua memória se arrependendo quando um cotovelo acertou suas costelas.

— É melhor olhar por onde anda daqui pra frente, fedelho. — alertou a garota de fios escuros — E nem pense em continuar correndo até lá.

O asiático franziu as sobrancelhas formando uma carranca no rosto enquanto cruzava os braços sobre o corpo bufando. Quando estava prestes a retrucar a fala da garota, Newt apoiou uma mão em seu ombro negando com a cabeça, como se dissesse que não valia a pena entrar numa discussão contra a corredora.

Nina lançou um sorriso sarcástico em direção ao garoto, com a sensação incômoda ainda lhe apertando o peito e forçando sua caixa vazia de memórias a funcionar. Algo nele a fazia sentir uma sensação de conforto ou familiaridade, algo naquele brilho prateado em seus olhinhos puxados a fazia sentir algo que não sentia a muito tempo.

— Bem vindo a clareira, fedelho. — gritou dando uma última olhada no garoto, disparando para a casa de mapas com George em seu encalço.

END GAME - minhoWo Geschichten leben. Entdecke jetzt