Bem-Me-Quer

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Rasgue minha roupa

Mas por favor não dê beliscão

Eu fico nua

Depois você reclama quando eu chamo atenção










A noite do Alegorias claramente não acabou no estúdio 7.


É óbvio. Poderia acabar de uma maneira mais óbvia do que aquela?


A noite do primeiro episódio da temporada do Alegorias acabou numa noite de sexo já conhecida pelos meus hormônios, numa suíte charmosa do Staybridge, que o ator carioca estava hospedado, já que as gravações de Shangrilá eram feitas no Rio. Sempre Rio, nunca SP? Porque utilizar SP em produções esotéricas, afinal de contas; a minha cidade não tinha sido feita para aquilo.


Rio foi feito para a fantasia popular, e SP, pra o choque de realidade mais amargo. E olha pra escritora, escrevendo mais uma crônica sobre uma noite de sexo... Memória múscular, claramente um acesso de memória muscular.


Então cá estou eu, nas mesmas roupas da noite passada + uma jaqueta de couro preta claramente não-feita para caber em mim, andando de óculos escuros dentro de um Uber X, fingindo para todos que me encaravam de fora e me ignoravam que eu também era legal o suficiente para encará-los e ignorá-los também.


Ignorei meu telefone veemente: é uma regra minha que tenho toda vez que faço uma coisa grande. Lancei o primeiro episódio do meu podcast, 12h sem contato virtual.Lancei meu livro de crônicas na Bienal? Um fim de semana inteiro sem topar no meu telefone. Meu primeiro Natal depois da fama súbita? Eu não entrei sequer no grupo da família.


Eu não sei lidar com críticas, minha taróloga diz que isso está ligado com meu alinhamento astrológico: bullshit. Eu sabia que isso muito tinha haver com a criação de palcos que eu havia recebido na infância. Papai é empresário imobiliário, mamãe é esposa troféu, e eu, a ovelha negra criada para ter me tornado médica, uma dermatologista, no cenário mais feliz de mamadi.


Então, eu fingia que ia pro cursinho pré vestibular, sentava num cybercafé distante da minha casa com meu notebook monstruoso, e começava a escrever uma coisa ou outra sobre o lugar, sobre as pessoas, sobre as coisas. Economizei toda grana do cursinho e angariei uns fundos de trabalho de modelo de catálogo, suficiente para conseguir dividir um apê universitário com as amigas bolsistas da escola.


Não, eu não consegui passar para medicina. Mas consegui uma bolsa para Publicidade na ESPM, e pulando de estágio em estágio, com uma contribuição secreta do meu paizinho querido, eu consegui me virar até a publicação dos meus textos se tornarem reais, e conquistei meu espaço no mercado falando sobre o que ninguém tinha coragem de falar naquela cidade: Sexo.


Sim, a heroína dessa história tem bagagem cultural, um passado obscuro, quase uma vida dupla, pasme! De estagiária na Varium, até cronista e escritora, o caminho foi longo. Então, de uns 3 anos pra cá, eu me tornei alguém na cidade. Dei palestras, cresci meu blog, expandi para o áudio, e cá estou eu. Eu, meu par de sapatos caros patrocinados, entrando no meu residencial de torre única ainda mais caro em Higienópolis.


Cumprimento o segurança, cumprimento o porteiro. Recebo uma caixa do porteiro — minha caixa de protótipos! Minha primeira caixa de produtos licenciados em parceria com a Allure: minha própria linha de prazer pessoal com uma empresa enorme no seguimento.


Sex AppealWhere stories live. Discover now