Prólogo - As Loucas

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Eles amam as loucas, mas casam com outras — ou no cenário atual, nem casam. Afinal de contas, ainda existe amor em São Paulo?

 Afinal de contas, ainda existe amor em São Paulo?

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Ponto G, uma coluna por Giovanna Antonelli.



Bem vindos a mais uma das minhas crônicas temáticas sobre o dia dos namorados. Graaaaande dia dos namorados. Há algo mais paulista do que o dia dos namorados, afinal de contas?


Pra quem não sabe, o dia de São Valentim, data comemorativa ao redor do mundo todo, e cronicamente conhecida como Valentine's Day, não é celebrada no Brasil por um objetivo meramente capitalista. Um fanfarrão well-know da antiga cidade de São Paulo criou uma data imaginativa, feita pra vender, já que em junho o comércio não era lá muito próspero.


Então, a variedade do dia vai ser sobre uma história que escutei a alguns tempos em uma noite de drinks no Balsa, lá no centro. Histórias do centro sempre são tão boas, né?


Uma arquiteta hypada de BH veio para Sampa Town, tentar a vida, obviamente. Atraente, louca e espirituosa, uns peitos que são uma loucura, e um cabelo de Cher dos anos 70 que eu honestamente invejei, imediatamente deu match com um dos solteiros tipicamente elegíveis da Faria Lima (se é que eles existem). Tom, nosso dreamboy tinha quarenta e dois anos (10 a mais que ela), trabalhava como um banqueiro de investimentos na XP, e devia tirar mais de 2M por ano. Por duas semanas, eles se beijaram, deram as mãos para que todo o bairro Jardins visse e então, em um dia quente de outono, ele a levou para a casa que estava construindo no Guarujá.


Ele queria saber o aval dela de arquiteta, contra o que já havia sido contratado.


"Eu queria dizer ao arquiteto para preencher essas grades no segundo andar, para que as crianças não caiam no futuro.", disse o banqueiro, à enchendo de pretenções.


Conseguiu pegar a expectativa ai no fundo?


"Com aquele papo todo, no mínimo eu esperava que Tom fosse me pedir para morar com ele."


No domingo à noite, Tom a deixou em seu apartamento e a lembrou que eles tinham planos de jantar para terça-feira, coisa boa na Oscar Freire. Na terça-feira, ele ligou e disse que teria que fazer uma reunião às pressas no horas em que combinaram. Quando ela não teve notícias dele depois de duas semanas, ela ligou e disse a ele: "Reuniãozinha longa, não é?".  Ele riu, e disse que ligaria para ela no final da semana. Ele nunca ligou, é claro.


Mas o que me interessou foi que ela não conseguia entender o que tinha acontecido.


Talvez em BH, conhecer e compartilhar essa vivência com outro banqueiro, significasse alguma coisa. Então eu percebi, é claro: ela é de BH. Ninguém contou a ela sobre o Fim do Amor Inevitável em São Paulo. Então eu pensei: Ela vai aprender na marra (se ninguém me avisou na minha vez, não sou eu quem vou avisar). Novos moradores, sejam todos bem vindos à Era da Inocência. As luzes brilhantes de SP que serviram de pano de fundo para os vestidos da vitrine da Pat Bo da Cerqueira César ainda estão brilhando, mas o palco emocional está vazio – Criolo tinha razão.


Não. Existe. Amor. Em. São Paulo.


Sexo com certeza, de todas as formas, mas amor não. Parece que ninguém tem assuntos para puxar – e a disposição pra se fazer interessado no outro é mínima e nada comovente. Como entramos nessa bagunça? Truman Capote entendeu nosso dilema dos anos 2020 —A coisa toda do Amor X Negócios — muito bem.


Em Bonequinha de Luxo, Holly Golightly e Paul Varjak se depararam com algumas restrições sentimentais (ele era um homem bancado, ela era uma mulher bancada) mas no final eles evoluem espíritualmente e escolhem o amor em vez do dinheiro. Isso não acontece muito na cidade da Garoa hoje em dia.


Somos todos seres humanos bancados - por nossos empregos, por nossos apartamentos e, em seguida, alguns de nós pelas reservas caras em rooftoops hiperfaturados, pelos beach clubs de Santos, por ingressos para apresentações no Espaço Unimed na primeira fila - e gostamos de viver assim.


A autoproteção e o fechamento do negócio são primordiais em São Paulo. Gosto de dizer que o Cupido pulou os trabalhos na cooperativa. Quando foi a última vez que você ouviu alguém dizer: "Eu te amo!" sem marcar o complementável (se não dito) "como amigo". Quando foi a última vez que você viu duas pessoas olhando nos olhos uma da outra sem pensar, apenas por olhar? Quando foi a última vez que você ouviu alguém anunciar: "Estou realmente, loucamente apaixonado por X"? Parece que realmente desperdiçamos os blues do Djavan – e creio que dificilmente esse cenário possa vir a ser reversível, no fim das contas.


Acho que na verdade, em verdade verdadeira, ainda há muito sexo em São Paulo, mas o tipo de sexo que resulta em amizade e negócios, não romance. O que é o romance além de mais uma criação comercial, no fim das contas?


Hoje em dia, todo mundo tem amigos e colegas: mas ninguém realmente tem amantes — mesmo que tenham dormido juntos algumas vezes.


De volta a nossa querida arquiteta de BH: Depois de seis meses, mais alguns "relacionamentos" e um breve caso com um homem que costumava ligar para ela de fora da cidade para dizer que ele ligaria para ela quando voltasse à cidade (e advinha, ele nunca ligou), ela ficou inteligente. Astuta, Loba!


"As relações em São Paulo são sobre desapego", disse ela.


"Mas como você mantém o desapego quando vê que está se apegando?"


"Aí querida, você sai da cidade, tá?"


Eu não minto que gostaria de viver um amor avassalador, de primeira capa de jornal, colunas sociais influentes e passeios no parque Trianon, mas sejamos realistas: Esse é o sentimento mais out de se ter na maior cidade do país. Fartos de hipocrisia, os amantes do fim do mundo disputam vagas em filas gigantescas nos melhores restaurantes da Vila Mariana, entram na guerra pelos melhores quartos de Motel – e em algumas circunstâncias, em suites presidenciais de hotéis statement da cidade – enquanto que os solteiros se planejam na divisão de homens e meninos: Os que vão à caça, trepam com o primeiro solteiro ou compromissado que aparece pela frente, e acordam no dia seguinte atrasados para trabalhar com uma mensagem no whatsapp esfarrapada, e os outros que ficam em casa aguardando o filme temático do fim de noite de dia dos namorados passando no canal aberto, com algum delivery promocional festivo.



O da vez não foi Bonequinha de Luxo. Mas o combinado de sushis intitulado de "in love" estava excelente.

Sex AppealWhere stories live. Discover now