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Todos os dias Rodolffo fazia questão de ir levar e buscar Miguel ao colégio e todos os dias ficava encantada ao vê-lo de mão dada com Nônô.   Desde o episódio do primeiro dia, os dois não se largaram mais.
Entravam e saíam juntos do colégio.

Rodolffo e Miguel chegavam primeiro e o pequeno fazia questão de esperar a amiguinha chegar.

Há uma semana que Juliette não vinha trazer Nônô.   Estava no turno da manhã e era a bábá a sua substituta.

Rodolffo sentiu falta dela.  Trocavam poucas palavras entre eles mas a presença dela despertava alguns sentimentos.

Rodolffo esperou pela menina e depois dos dois entrarem na escola resolveu meter conversa com Alice, a bábá.

- Lá em casa é só Nônô  pra cá e Nônô pra lá.

- E na nossa igual.  Nônô diz que é o amiguinho mais amiguinho dela.
Ontem até pediu à mãe se ele podia dormir lá.

- E o pai dela?  Nunca vi ele vir trazê-la?

- A dona Juliette é solteira.  Nunca se fala do pai da menina.  Quando a patroa está de plantão de manhã sou sempre eu que a trago.  Se ela puder depois vem buscá-la à saída.

Rodolffo não queria parecer inconveniente e não perguntou mais nada.  Despediu-se e seguiu o seu caminho.

No resto do dia por várias vezes precisou de parar para se concentrar.   A imagem de Juliette aparecia do nada na sua mente.

Eram 10 horas da manhã.   As crianças tinham o seu intervalo e brincavam no pátio. Miguel e Nônô estavam a fazer uma corrida quando uma outra criança chocou com Miguel que se estatelou no chão.

Nônô correu a socorrer o amigo e apareceu logo a auxiliar para ajudar.

Miguel chorava com o queixo ensanguentado.  As mãos e os joelhos estavam também machucados.

- Vem Miguel, eu vou limpar esses machucados.

- Precisa ir para o hospital.   A mamãe está lá.

A auxiliar verificou a gravidade das lesões e concluiu que o queixo merecia atenção especial.

Solicitou o transporte e levaram Miguel.

Rodolffo foi informado do sucedido e saiu rapidamente em direcção ao hospital.
Quando chegou já Juliette estava a cuidar do filho.

- Não tem que se preocupar.  São acidentes normais.   O queixo parecia pior mas é só um golpe um pouco mais profundo.  Já está resolvido, diz ela para um Rodolffo super angustiado.

- É a primeira vez que acontece.

- Então vá-se acostumando.  A Leonor vivia constantemente no chão.  Agora acalmou um pouco.

- Como foi que aconteceu filho?

- Eu estava a fazer corrida com a Nônô e choquei com outro menino.

- E está a doer?

- Agora não.  A doutora já pôs o remédio.

- Prontinho.  Já pode ir para casa.

- Para a escola, pai.  A Nônô está lá.

- Estamos tramados com estes dois.  Não se desgrudam.

- Hoje já não vais.  Vês amanhã.

- Mas amanhã não tem escola.  É sábado.

- Olha, fazemos o seguinte; Amanhã eu não trabalho.   Queres passar o dia na minha casa com a Nônô?

- Posso?  Deixas papá?

- Não vamos incomodar a doutora no dia de descanso,  Miguel.

- Rodolffo,  não incomoda.  Se a Leonor não o vir, ninguém a vai aguentar o fim de semana.  Deixe-o lá de manhã.  Aqui tem a minha morada.

Rodolffo agradeceu e saiu com Miguel em direcção a casa.

Juliette ficou a vê-los partir.
Que homem charmoso,  pensou.

Como Juliette previu, Leonor quis saber tudo sobre os machucados de Miguel e ficou contente por ele ir lá a casa no dia seguinte.

- Mamãe,  porque é que eu gosto tanto do Miguel?

- Não sei.  Porquê?

- Acho que é porque eu queria ter um irmão.

- Mas na escola tens tantos amigos, porquê o Miguel?

- Não sei.  Gosto e pronto.

Sábado finalmente chegou.  Rodolffo já não aguentava mais ouvir o filho perguntar quando iam.

Tomaram café, saíram e passaram numa florista.  Rodolffo comprou um buquê de flores e um ursinho de pelúcia.

- O ursinho dás à  Nônô e as flores à mãe dela.  Para agradecer a gentileza dela.  E prometes que te portas bem?

- Prometo pai.

Chegaram na morada indicada e nem era tão longe assim.  Eram praticamente vizinhos.

Rodolffo tocou à campainha e logo se ouviu do interior uns passos a correr.

Abriram a porta e Leonor veio abraçar Miguel.

- Shiii, machucou mesmo, disse ela enquanto segurava o urso que ele lhe dava.

- As flores são para a tua mãe.

- Mamãe,  o Miguel trouxe flores para ti.

- Obrigada.  Entre Rodolffo.  Vamos tomar um café.

Leonor levou Miguel para o quarto dos brinquedos e Juliette foi preparar um café.

- Como ele passou a noite?  Teve dores?

- Não.   Dei o medicamento antes de dormir e dormiu a noite toda.

- As crianças são resistentes.  Quer açúcar?

- Não, obrigado.
Juliette,  podemos tratar-nos por tu?
Não sou muito bom com formalidades.

- Sem problema.   Vamos ali para a  varanda.  O dia está bonito.

Estiveram a conversar durante bastante tempo.

- Convidava-te para almoçar connosco, mas, com certeza a tua esposa está à espera.

- Não.  Não sou casado e a mãe do Miguel faleceu em Portugal.   Somos só nós dois.
E a Juliette,  é casada?

- Solteirissima.  Tal como vocês, sou só eu e a Leonor.

- E o pai dela?

- Eu adoptei-a.  Não sei quem eram os pais.  Foi abandonada no hospital onde a mãe entrou com identidade falsa.

- Que crueldade.  Isso é lá mãe?

- Não julgo.  Não sabemos as dores dos outros.  Mas apaixonei-me logo por ela.

- Ela sabe?

- Sabe tudo.

- O Miguel também.   A mãe  morreu logo após ele nascer.  O médico alertou para essa possibilidade mas ela preferiu sacrificar-se em vez de abortar.

- Uma história triste.

- Ele é a minha razão de viver.   Está comigo desde o dia que deixou o hospital.   Nasceu prematuro.

- Criaste- o sózinho?

- Sim.  Tinha uma senhora que ficava com ele quando eu ia para a faculdade.   Estava no último ano quando ele nasceu.

- Fizeste um bom trabalho.   O Miguel é adorável.

- A Nônô também.

Juliette olhou para Rodolffo e reparou que os olhos estavam marejados.

- Desculpa fazer-te recordar.

- Está tudo bem, disse ele limpando os olhos com a mão e levantou-se.

Juliette levantou-se também e deu-lhe um abraço.

Rodolffo aproveitou para inspirar o perfume dos cabelos dela e deu-lhe um beijo na cabeça.

Dá-me um abraçoWhere stories live. Discover now