✞︎23-Horas contadas

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Kaylian.

Sempre pensei no que me unia ao Gael, sinceramente, agora não tinha praticamente nada que nós tínhamos em comum. Principalmente quando a questão era família, pois eu nem sequer sabia mais qual era o lugar de quem ali.

Passaram anos, a minha vida toda praticamente mentindo para mim e por alguma razão, eu sentia vergonha de contar isso a ele ou a qualquer outra pessoa, incluindo Maria ou Taissa.

- Kaylian, por favor, diga alguma coisa - Implorou Jorge, ainda sentado àquela mesa na qual estava fazia quase uma hora. Eu não conseguia olhá-lo nos olhos.

- Filho, você é tudo para mim, é minha vida, por favor... diga que me perdoará um dia - Colocou a mão em cima da minha, e eu a retirei.

Eu tinha planos, queria recomeçar, principalmente depois de descobrir tudo, esse era o impulso final que daria a certeza na qual eu precisava.

- Vou pegar o dinheiro da poupança, abrir um negócio de tatuagens e sumir daqui, construir uma vida, longe de vocês e de tanta mentira - Apenas avisei, embora não merecessem, ainda tinha essa consideração por eles.

- Não faça isso, seu irmão, o Bernardo é muito apegado a você e não vai suportar que fique longe dele...

- CHEGA! EU CANSEI! SERÁ QUE UMA VEZ NA SUA VIDA, PODE PARAR SE USAR AS PESSOAS COMO DESCULPA? - Espalmei a mesa bruscamente.

- Se eu fiz o que fiz, foi pelo seu bem! Se quer a verdade nua e crua, aí vai - Levantou-se e apontou o dedo. - Seu tio era um viciado em drogas, usou cocaína durante praticamente toda adolescência e quando sua mãe descobriu que estava grávida, fazia poucos meses que tinha terminado com ele - Tomou força para continuar.

- Aí você ajudou seu irmão, se envolvendo com a ex-mulher dele e ainda grávida? Puta que pariu! Como é caridoso! - Bati palmas.

- Sua mãe não sabia se era meu ou dele, então acabou registrando como meu, porque seu tio sofreu um acidente no dia em que ela contaria e ficou em coma por quase um ano, quando acordou, fizemos o teste de paternidade e contamos tudo, ele estava se recuperando e não quis estar daquela maneira na sua vida! - explicou, nervoso.

Então eu ainda fui rejeitado pelo meu pai? É isso?

Tamar.

Lilith me alimentou e me deu roupas limpas, também mostrou um lugar aonde se banha, seria um alívio, se não fosse pelos constantes e perturbadores gritos vindos de uma área cinzenta tenebrosa.

Caminhando pelos corredores largos e vastos que causavam arrepios, até chegar à uma porta muito alta e larga, tinham ossos entalhados em cima formando uma cruz e as maçanetas eram de bronze em formato de argolas. Estava aberta, a empurrei devagar e entrei.

O quarto era extremamente espaçoso, dava o dobro em largura do que eu tinha na minha casa.

- Educação não é forte de vocês humanos, não é? - A voz imponente ecoou pelas paredes douradas do quarto, me fazendo estremecer por dentro.

Quando meu olhar o encontrou, Lúcifer estava debruçado sobre o parapeito de uma janela larga, observando a vista além dela.

- Nem a cortesia de vocês demônios - retruquei, ríspida. Ele me lançou um olhar flamejante, como se quisesse cortar minha garganta ali mesmo.

- O que quer aqui? - Sentou-se em sua cama de rei a poucos metros da janela.

- Negociar - falei, mais corajosa do que realmente me sentia.

- Por que eu negociaria com você? O que tem a me oferecer? - Ergueu a sobrancelha com desdém.

- Sei que deseja ele morto, eu posso te ajudar com isso - disse, firme.

Ele deu uma risadinha em escárnio. Aquilo não valia nada ao diabo.

Me aproximei mais, ficando de frente para ele.

- Eu mesma o mato, em troca, quero que convença Azazel a me tirar daqui - Dei a condição, esperançosa de que conseguiria algo.

Lúcifer se manteve em silêncios por alguns segundos, talvez considerando a proposta.

- Por que não diz você mesma a ele? - A voz era intesa feito tempestade, erguendo sutilmente a cabeça e fazendo os cabelos negros despencarem de lado.

Engoli a seco.

- Ele não me dará ouvidos, além disso, é muito amiga do... pensei que talvez, pudesse ter outra maneira - Ergui o vestido, exibindo minha coxa, a qual coloquei entre suas pernas.

Lúcifer me lançou um sorriso lascivo e aproximou a boca da minha.

- Está tentando enganar o rei da mentira? - Seu hálito quente atingiu minha pele que gelou.

Lúcifer me agarrou pela coxa e me jogou na cama segurando minha cintura.

Cada canto da minha pele suava frio.

- Sua beleza é uma arma, aprenda a usá-la Tamar - Passou o nariz pela minha bochecha e os cabelos, apreciando meu cheiro como se eu fosse algo incrivelmente envolvente.

Meu coração quase saia pela boca e talvez tenha saído e voltado quando Lúcifer me olhou direto nos olhos, a luz flamejante igual ao que havia em Lilith me fez sentir um inexplicável fascínio, uma vontade estranha de sentir... de sentir ele. Sentir sua pele macia como pêssego contra a minha, seus lábios carmim...

- Viu? É assim que se usa a arte da sedução - Deu um selinho em minha bochecha e se afastou, me deixando com o vazio do calor de seu corpo.

Voltei a si.

Lúcifer era assustador. Pensamentos intrusivos vieram a minha mente e eu os sufoquei, antes de me envenenarem.

Lembrei de Lilith falando todas as crueldades e senti o estômago embrulhar.

Tinha praticamente me enfeitiçado, a facilidade com que fez isso foi ainda mais aterrorizante.

Eu não deveria achá-lo belo e me atrair, entretanto depois de sair sob aquele efeito, ainda era extremamente lindo e sedutor. Demorei a assimilar aquilo.

- Você é desprezível, como se atreve? - Sai da cama, indo até ele, disposta a fazê-lo engolir aquelas palavras sujas.

- Ah! Não me diga, não vou conseguir dormir com esse peso hoje a noite! - Pôs a mão no próprio peito de maneira teatral. Perdi o pouco controle em mim e agarrei a primeira coisa que vi pela frente, avançando nele para feri-lo.

Lúcifer previu o meu ato impulsivo e agarrou meu pulso no ar, tomando o punhal da minha mão esquerda rapidamente.

- Acha que pode me matar? - Abriu um sorriso largo, parecia se divertir com aquela situação, seus olhos escuros brilhavam. Ele me soltou e pôs novamente o punhal na minha mão, abrindo a túnica dourada e expondo o peito, segurou meu punho e colocou a ponta dele contra seu peito.

- Faça - Ordenou com uma lentidão perigosa tomando os olhos negros.

Estremeci, quase sem conseguir me mover, os músculos do meu corpo pareciam querer explodir.

Lúcifer tomou o punhal de volta e pegou meu indicador, deslizando a lâmina antiga por minha pele fina, fazendo sangue surgir, seus olhos sombrios fixaram-se aos meus quando levou meu dedo a seu lábio inferior e passou o sangue lentamente nele.

Em seguida saboreou o gosto do meu sangue, ainda me olhando nos olhos.

- Pode ir se quiser, eu vou ajudá-la, se me trouxer aquele bastardo, eu mesmo o matarei - disse, quase em sussurro.

- Convencerá Azazel? - indaguei, mais perto. Suas mãos me puxaram com força para si e sua língua entrou em conexão com a minha feito uma ventania imparável, o beijei como se não soubesse quem era, os movimentos lentos se tornaram cada vez mais ávidos e excitantes, nada se comparava a sentir o gosto do mal e querer mais.

Lúcifer sorriu, segurando meu queixo com pressão.

- Suas horas estão contadas, mas talvez seja possível - Me deu um selinho.

Maldito!

Desgraçado!

Somos feitos de sangue e mentiras [Finalizada]Where stories live. Discover now