✞︎28-Quanto vale seu amor

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Maria.

Desde que tinha acordado, permaneci na cama, tive que tomar alguns medicamentos para dormir, pois somente assim conseguiria amenizar a dor insuportável do buraco aberto no meu peito.

Toda vez que abria os olhos, lembrava que não era pesadelo. Meu pai tinha partido e nada o traria de volta.

Já passava das três da tarde quando alguém bateu à porta. Apenas coloquei uma blusa por cima do pijama, pois não usava sutiã e era um tanto transparente e fui abrir.

— Pietro? — Não esperava sua visita.

— Posso entrar? — Sua boca se curvou num sorriso refreado. Dei espaço a ele.

— Você não está bem Maria, há quanto tempo não dorme direito? — Se aproximou, tocando meu braço carinhosamente.

— Tenho dormido há base de remédios, então considere isso — Ri sem humor, indicando que sentasse no sofá.

Através do reflexo dos seus olhos, pude ter uma pequena noção do quanto estava horrível. As olheiras fundos, o cabelo despenteado, não me surpreenderia se estivesse cheirando mal também.

— Que tal se sairmos um pouco? Vamos tomar um café, podemos até combinar com meus amigos e assim os conheceria — disse, pegando em minhas mãos.

— E o que vai dizer a eles? Que é meu cliente? Quando perguntarem no que eu trabalho? — indaguei, sem um pingo de vontade de aceitar aquela ideia idiota.

Me desvencilhei, indo até à cozinha, cafeína era a única coisa que poderia tornar aquela conversa mais tolerável.

Pietro soltou um grunhido, se ajeitando no sofá.

— Não precisamos falar sobre isso agora Mari...

— Não? Só ignorar o fato de que eu sou uma prostituta, que tenho HIV? No momento em que te questionarem, o que vai dizer? Inventar algo esfarrapado como "ela é atendente, balconista", ou seja lá o que? Quanto vale seu amor? A ponto de se submeter a isso, a este fardo que sempre pesará entre nós? — Fiz aspas com os dedos, enfatizando.

— Eu não me importo com isso! Nem vou de maneira alguma te constranger ou te colocar nessa situação, te pressionar a revelar uma parte da sua vida que já deixou para trás! — Levantou-se, vindo até mim.

— A questão não é o que você vai fazer, é o que eles fazem! Já basta todo dia naquela universidade, as piadinhas, os olhares nojentos, acha que suporto isso por escolha? Não, é um maldito buraco da qual eu não consigo sair! — Quase perdi o controle, exaltando a voz.

— Eu também tenho meus erros, meu passado, eu sou seu professor e o julgamento das pessoas não vai mudar o que sinto por você Maria! — As palavras escaparam com pesar.

— Não é nem de longe a mesma coisa, sabe disso, terá que fazer uma escolha, uma hora ou outra, desde muita nova, tenho que sobreviver — Senti uma brusca falta de ar atingir a boca do estômago.

— Eu escolho você, eu escolhi estar apaixonado por você, e farei de tudo para te ajudar, mas precisa deixar o orgulho de lado Maria, se permitir tentar! — Persistiu, com os olhos marejados.

O afastei de mim, recuando alguns passos e negando seu toque.

— Eu não sei como, não consigo... me sinto mal, a minha dignidade, eu... você não pode dizer isso, não diga que está apaixonado por alguém como eu Pietro — Pedi, contendo a vontade de chorar e desviando olhar para um canto qualquer.

— Eu não vou desistir de você ¹mon cher— Me puxou delicadamente de volta e me envolveu num abraço aconchegante.

— Não tenho nada a oferecer, não tenho ninguém no mundo, nem sequer mereço que me trate assim, sabendo do meu passado que ainda está aqui — sibilei, afundando o rosto entre as mãos sobre seu peito.

Somos feitos de sangue e mentiras [Finalizada]Where stories live. Discover now