Capítulo 3

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Cheguei exausta na Coreia. Até colocar os meus pés no hospital tentei falar com Rebeca, minha irmã mais nova. Claro que não consegui. Se eu estava nós braços de um Deus do sexo enquanto o meu irmão precisava de mim, sabe-se lá deus onde essa menina está. Juro a mim mesma que se tiver que ir buscá-la em Nova York ela vem descabelada.

Estou a meia hora deitada com a cabeça apoiada na barriga do meu irmão. Renato não acordou desde quando cheguei. Seu machucado mais grave foi um pedaço de vidro que perfurou parte do fígado. Quem não estava nada bem era Hong-joo. Está na UTI em coma, ela foi atirada pelo para-brisa do carro. Causando uma grave lesão na cabeça. Não sei nem com que força vou contar a ele. O carro está destruído e sua esposa à beira da morte, meu irmão vai ter um colapso.

Sinto as lágrimas descendo pelo meu rosto. Mais uma vez estava aos prantos no hospital. Primeiro nossos pais e agora isso. Me pergunto quando terei paz. Ouço meu telefone tocar e atendo na esperança de ser Rebeca, mas sinto uma calmaria me invadir quando a voz de Jimin ecoa no meu ouvido.

- Como você está? -a forma como se preocupou em me ligar toca meu coração.

- Quero outro abraço. -confesso rindo sem humor enquanto limpo minhas lágrimas.

- Dou assim que eu voltar. Chego em duas semanas. Consegue esperar até lá?

- Vou cobrar por esse abraço.

O silêncio toma conta da nossa ligação, mas sei que ainda está ali. Posso ouvir sua respiração. Assim como ele pode me ouvir chorando. Jimin permanece comigo. Mesmo quando digo para desligar por conta do fuso horário e seus compromissos.

- Bia...

A voz de Renato me chamando acelera o meu coração. Desligo de Jimin às pressas. Abraço Renato com desespero, as lágrimas se intensificam mais uma vez.

- Tato! -o chamo manhosa pelo apelido que dei a ele quando mal conseguia falar.

- Como está a Joo? -pergunta me abraçando e deixando um carinho em minha cabeça. Não consigo responder.- Bia, cadê a Hong-joo?

- Eu vou chamar um médico, tenho que avisar que você acordou. -tento levantar mas ele agarra meu pulso.

- Beatriz Mendes!

Fecho os olhos e respiro fundo, odeio com todas as minhas forças ser chamada assim. E ele sabe disso. São tantas lembranças que vem à minha mente. Dietas. Roupas extravagantes. Exposições. Passarelas. Flashes. A maldita da fama.

- Ela está na UTI. -digo ainda de olhos fechados.- Um médico vai saber lhe explicar melhor.

Não preciso nem fazer forças para me soltar. Quando ouve a palavra UTI seu mundo cai. A mulher dele estava morrendo e agora ele sabia. Acho que não sou nem capaz de imaginar como se sente. Não existem palavras suficientes para descrever perdas como essa. Fico parada encarando a porta do quarto enquanto o médico está lá dentro. Um milhão de coisas passa pela minha cabeça, tantas perguntas sobre o acidente. Meu celular toca me tirando dos devaneios.

- Oi... -atendo Rebeca pensando em onde ela poderia estar.

- Tá tudo bem com o Tato? Tem um hospital me ligando e estou começando a ficar nervosa. Onde você está? Quer que eu vá para lá ficar com ele? -nós duas estávamos desesperadas de preocupação.

- Não precisa eu já estou aqui. Cheguei ontem.

- Ah...

Quando foi que a nossa família se tornou tão distante?

Cada um em um canto do mundo. Sem nem saber do outro. Acho que ainda nos falamos por causa do Renato. Não faço ideia do que será de nós três se ele sair dos eixos. Rebeca vive sua vida de modelo como se cada dia fosse o último. Eu fujo de qualquer contato com a mídia desde o dia que abandonei minha carreira de modelo ao lado da Rebeca. Ela nunca me perdoou por isso. No meio de todo esse caos Renato é o único que tem uma vida calma e feliz, administrando a empresa de nossos pais com toda sua sabedoria.

- Hong-joo está em estado grave. -quebro o silêncio entre nós.- Está em coma.

- Meu Deus, o Tato já sabe?

- A julgar pelo vaso que ele acabou de quebrar, acredito que saiba. -posso ouvir os cacos caindo um por um no chão.

- Eu estava em um evento da agência. Não dei importância, mas insistiram até essa madrugada. Resolvi atender. -conhecendo Rebeca sei que ela está se culpando por não ter feito nada até agora.

- Pelo menos estava trabalhando...-solto um suspiro, estou uma confusão de sentimentos.

- Você não estava? Foi para Vegas fazer palestras. Eu vi.

O comentário de Rebeca me deixa chocada e emocionada. Então ela pesquisava sobre a minha vida "secreta" de escritora. Onde uso nosso outro sobrenome e nunca faço aparições públicas.

Achava que não tinha seu apoio.

- Estava lá, mas...

Nós éramos como melhores amigas. Sabíamos cada detalhe uma da outra. Até eu entrar no primeiro avião de volta para casa e abandonar Nova York para sempre. Acho que é por isso que para ela sei que posso confessar a verdade.

- Eu fraquejei e dormi com alguém famoso. -me culpo mentalente por ter tido a melhor noite da minha vida quando meu irmão precisava de mim.

- Calma. -sua voz suave me acalma como antigamente.- Usou camisinha?

- Sim, estou mais preocupada em sair em alguma revista não com isso.

- DST e gravidez são mais importantes que isso.

- Quando foi que você ficou mais responsável que eu?

- No dia que você me deixou e tive que encarar o mundo sozinha.

- Tinha 22 anos já, não seja tão dramática. -um silêncio constrangedor se instala entres nós e penso que foi besteira minha ter desabafado.

- O quão famoso? Te conhecendo não deve ter sido nada demais, sempre gostou de discrição. -volta ao assunto mostrando que ainda se importa.

- Você conhece o BTS?

- Desligo agora se me disser que dormiu com Jeon Jungkook. -seu piti me arranca uma risada no meio de todo esse caos.

- Por Deus, não! -vejo o médico sair do quarto me dando um sorriso sem graça, acredito que meu irmão não esteja no meu melhor humor.- Park. -respondo somente o sobrenome tentando ser um pouco discreta quando ela insiste em saber.

- Valei-me senhor!

Tenho certeza que ela está se abanando nesse momento. Rio comigo mesma no corredor. Rebeca me consola e tenta colocar na minha cabeça que não tinha como eu saber. Então não devo me culpar. O que mais me deixa feliz não é seu conselho e sim o fato desta ser a conversa mais longa que temos em três anos. No casamento de Renato ela não pode ir por estar em um desfile. Desligo a ligação e volto para dentro do quarto. Vejo que Renato não quer conversar. Está nitidamente transtornado e tentar conversar só geraria confusão.

Cada dia que passava, enquanto Renato melhorava e inclusive foi liberado, Hong-joo não dava nenhum sinal. Nada. Estava realmente parada no tempo e meu irmão seguiu pelo mesmo caminho. Ia para casa quando eu o forçava para tomar banho e comer. Ou quando tinha alguma reunião importante da empresa. Até o dia que fui expulsa de estar por perto.

O flagrei trabalhando no hospital para não sair do lado dela. Brigamos pela primeira vez em muito tempo. Por mais que entendesse sua preocupação, estava lá para ajudá-lo. Mesmo assim ele não falava comigo, quando me respondia era um milagre e na maioria eram resmungos. Deveria ter ficado, mas não aguentava mais suportar aquilo sozinha. A única pessoa que tentou me consolar um pouco foi o médico deles. Minha irmã e minha melhor amiga estavam em um fuso horário completamente diferente do meu. O tempo realmente não estava a nosso favor.

Estou no aeroporto esperando que anunciem meu voo quando meu telefone toca. Até o último momento desejei que fosse Renato. Uma simples palavra, mudava de ideia na hora, mas não. Era Jimin. Confesso que tentei conversar com ele algumas vezes, mas todo meu medo me impedia. E não queria que se preocupasse com um problema que não era dele.

- Desculpe Jimin, mas é melhor assim. -deixo tocar até cair na caixa postal.

Meu voo é anunciado quando meu celular toca mais uma vez. Solto o telefone dentro da bolsa e caminho para o portão. Pronta para deixar a Coreia.

{...}

Nosso destinoWhere stories live. Discover now