Capítulo 1

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Era escuro. Estávamos apenas nós duas em um lugar que nem eu mesma sabia ao certo onde era. No fundo, uma luz que se aproximava lentamente.
Olhava no fundo de seus olhos cor de mel. Seu semblante era calmo, sem preocupação. Ela parecia saber o que acontecia.
Eu queria gritar. Gritar para que alguém nos tirasse dali, nos salvasse, mas minha voz não saía. Senti minhas pernas amolecerem, minha visão ficar turva. Até meu corpo desabar como uma cascata.

Acordo com o corpo dormente. Meu colchão encharcado de suor. Minha cabeça lateja como nunca. Mais uma noite difícil, antes era raro isso acontecer, mas agora, os pesadelos me atormentam dia após dia.
Como sempre ao levantar, vou correndo para a balança: 52.30. Meu peso atual. Gorda como sempre. Se eu continuar assim, nunca vão deixar de me ofender e me chamar de obesa na escola.
Meu nome é Sophie Bettencourt Albuquerque, tenho quinze anos e 1,66 de altura.
Tudo começou quando eu tinha sete anos. Estava na segunda série, era nova na escola. Achava que seria um dos melhores anos da minha vida, mas não. Foi aí que tudo começou.

- Oi, meu nome é Sophie, sou nova na escola. - Disse para uma menina com lindos cabelos castanhos.
- Ah, oi - Disse ela se afastando - Eu sou a Alice e vou falar com as minhas amigas. Tchau. - Alice se afastou e eu a segui como uma criança iludida.
Havia um grupo de cinco meninas e Alice parecia ser a pequena líder delas. As garotas conversavam animadamente entre si, até que eu tomei coragem e tentei entrar no assunto também:
- Oi meninas, do que vocês estão falando?
- O que essa gorda tá fazendo aqui? - Uma morena de olhos puxados perguntou - Alice, você já não mandou ela deixar a gente em paz?
- Desculpa, é que eu sou nova na escola e queria fazer amigas.
- Aqui você nunca vai fazer amigas. Só garotas bonitas como a gente fazem amigos! Você é gorda e feia.
A cada palavra que saia dos lábios finos da menina, uma lágrima escorria pelas minhas enormes bochechas gordas.
- Por que vocês estão fazendo isso comigo? Eu só quero fazer amigas!
- Porque você é gorda!
Depois disso, as garotinhas que compunham o grupo saíram e meu deixaram ali chorando.

Isso foi se agravando, se tornando cada vez mais forte. As palavras que diziam eram cada vez mais pesadas, até que eu tinha 12 anos. Uma menina de apenas 12 anos e com 80 quilos e apenas 1,60 de altura. Eu era o ponto de referência, rolha de poço, gorda, entre outros adjetivos.
Minha rotina era sempre a mesma: escola de manhã, a tarde chegava em casa com um sorriso no rosto - apesar de sofrer agressões verbais constantes na escola - , dava um "Oi" para minha mãe e subia para o meu quarto. Lá ficava a tarde inteira chorando, me perguntando o porque de eu não ser normal como as outras meninas da minha idade.
Até que eu decidi parar de sofrer, decidi que iria ser magra e bonita como todas elas. A partir deste momento, minha vida mudou radicalmente.
Minha rotina era simplesmente acordar, tentar ignorar ao máximo Alice e seu clubinho na escola, chagar em casa e não almoçar. Só simplesmente ir para o meu quarto e ficar a tarde inteira assim, até anoitecer e eu dormir.
O tempo passou, eu ainda não tinha conseguido perder muito peso e estava sofrendo de mais por conta de não me alimentar. Entrei em um site na Internet, onde mostrava dietas rápidas para perder vários quilos em apenas alguns dias. Fui clicando em vários links, até que achei o que realmente precisava. Este site dava dicas de como ficar magra rapidamente: dizia que eu deveria comer poucos alimentos e depois vomita-los. Realmente muito fácil e prático, não acham? Então eu o fiz. Fui tendo resultados ótimos, mas ainda não estava bom. Eu tinha que emagrecer mais, muito mais.

Depois de alguns meses praticando a, chamada pelos médicos, Bulimia, eu estava digamos: "menos gorda", minhas coxas estavam bem mais finas, meus ossos apareciam de leve, a grande barriga que eu tinha havia diminuído um pouco, mas sempre que me olhava no espelho, via a mesma obesa de sempre.

Começaram a aparecer alguns efeitos colaterais, que eu eu já sabia que uma hora ou outra aconteceriam: meus cabelos começaram a cair, minhas unhas quebraram e eu mesma comecei a ficar mais fraca. No mesmo site onde encontrei o meu "antídoto", dizia que quando isso começasse a acontecer, eu deveria tomar um tipo de vitamina comprada em farmácias que deixariam o meu corpo forte novamente. Não sabia se realmente iria funcionar, mas comecei a tomar a tal vitamina. Meus cabelos pararam de cair, minhas unhas ficaram fortes novamente e meu corpo que antes estava completamente frágil, começou a ter um pouco de força. A partir daí eu comecei a gastar minha mesada em vitaminas.

As aulas tinham acabado a três meses atrás, e isso significava que as férias estariam acabando. No dia seguinte o clubinho de Alice veria uma Sophie mudada, mais magra.
Amanheceu, o primeiro dia de aula do 6° ano do ensino fundamental. Arrumei-me e esperei o ônibus escolar vir me buscar. Quando chegou, sentei no fundo e esperei chegar ao meu destino. Durante o trajeto, uma menina loira de olhos castanhos senta ao meu lado. Ela era linda. Sua boca carnuda tinha um tom rosado. A típica boca que da vontade de beijar. Ela tinha um delicioso cheiro de baunilha.
-Oi, sou nova na escola. Meu nome é Maya, sou do 6° ano. - Disse ela, me cumprimentando.
- Oi, meu nome é Sophie e também sou do 6° ano - Respondi.
- Que legal, vamos ser colegas - Maya disse rindo.
Seu sorriso era lindo e mesmo de uma distância relativamente grande, pude sentir seu hálito com cheiro de hortelã.
-É, vamos sim. - Falei extasiada pelos olhos de Maya.
Depois disso nos ficamos mais próximas, cada vez mais. Até que eu percebi que gostava dela. Não como uma simples amiga, mas eu gostava muito dela. E foi aí que eu percebi que gostava de garotas, ou como a sociedade fala: sapatão.
Alguns dias depois que tive a real certeza de que gostava de Maya, me declarei para ela. Achava que ela iria entender, ou até mesmo sugerir que tentássemos ficar juntas e ter um relacionamento, mas não. Ela riu de mim, disse que eu era iludida e no dia seguinte, a vi beijando um menino dois anos mais velho no banheiro feminino. Depois desse, a vi se pegando com outros três, na mesma semana. Não era nada fácil ver Maya com um a cada dia, mesmo que nós não tivéssemos nada, isso me machucava e me matava dia após dia.
Me lembro como se fosse hoje, tinha treze anos, e vi Maya transando com um garoto que eu nem conhecia no mesmo banheiro que havia a visto beijar um outro a poucos meses atrás. Aquilo foi a gota d'agua, sai correndo para sala de aula e peguei a minha mochila. As aulas já tinham terminada então só sai da escola.
Naquele dia fui andando para casa, precisava pensar. Andava rapidamente recusando que as lágrimas descessem. Entrei em casa como um furacão e fui diretamente para o meu quarto. Lá sim eu poderia chorar. As lágrimas caiam como cascatas sobre minhas bochechas. Sob a mesinha que havia ao lado da minha cama, tinha uma gilette. Havia a usado para cortar alguma coisa que no momento não me lembrava. Me levantei da cama e a peguei. Meu coração acelerado, minhas mãos tremiam e com um movimento involuntário a passei sobre meu antebraço. Esse foi meu primeiro corte. Não senti dor, foi prazeroso, logo depois vieram mais, um após o outro até eu ter um pouco de noção e parar. Percebi o estrago que tinha feito e chorei mais.
Depois de limpar bem os cortes, coloquei uma camiseta de manga comprida e me deitei. Não dormi, apenas fiquei pensando.

Bom gente espero que gostem, essa é minha primeira criação, então deixem nos comentários o que gostaram e o que não gostaram, pra eu ir adaptando com o tempo. Cada comentário vai ser super bem vindo, desde críticas, até elogios. Quem quiser mandar sugestões pode ficar a vontade. Beijos, até. <3

Por você (EM REVISÃO)Where stories live. Discover now