Capítulo XXXIV

133 17 10
                                    

Na manhã do dia seguinte, Isabella foi desperta por uma jovem de olhos azuis vítreos e cabelos loiros quase brancos. Era como uma versão mais pálida e rechonchuda se si mesma. Ela sorriu adoravelmente, deixando a mostra um par de covinhas superficiais e dentes levemente tortos.

- Bom dia, senhorita – disse a garota. Era a mesma voz reconfortante do dia anterior.

Era uma jovem Izlandesa e como tal não a chamaria de Vossa Alteza. Não existia hierarquia na terra do gelo.

- Que horas são? – inquiriu sentindo as pálpebras doloridas.

- Sete horas da manhã. Mais ou menos – Isabella se apoiou no colchão e sentou-se. Seu braço direito ardia de maneira infernal. – Me surpreende que você tenha conseguido dormir durante a noite depois de dormir o dia inteiro ontem.

Exceto que ela não havia conseguido. Ficou rolando em suas cobertas até umas três horas da manhã. Toda vez que fechava os olhos, tinha a impressão de ouvir alguma coisa do lado de fora, geralmente o som de passos na neve, então saltava de sua cama e se dirigia a janela, olhando através do vidro embaçado e criando a certeza de que havia um vulto lhe espreitando no balcão. Isabella corria para perto de Âmbar, que dormia ao pé da lareira, e o acordava implorando que fosse conferir. Ele grunhia, rosnava e resmungava, mas sempre fazia como lhe era dito.

- Não há ninguém, humana – dizia enfiando sua cabeça do lado de fora. Sua voz soava agressiva, entretanto nunca ficava verdadeiramente irritado.

Então Isabella voltava a dormir, se enfiando embaixo das cobertas e recomeçando o ciclo.

- Eu trouxe o café dá manhã e uns analgésicos – informou a garota Izlandesa, apontando para um prato de comida e um embrulho redondo e cinzento postos em seu criado mudo.

Sua Alteza inclinou-se para frente, sentindo um cheiro esquisito preencher suas narinas. Cheiro de semana santa. Havia alguns pedaços de peixe e legumes boiando em um líquido meio amarelado e brilhante em uma tigela de cumaru. O estomago de Isabella revirou. Parecia gostoso, mas peixe tão cedo de manhã era um pouco demais para ela. Já estava se acostumando com a sopa dos licryanos, contudo frutos do mar ainda seriam um desafio.

- Eu vou ficar só com o analgésico – informou franzindo o nariz.

- Então se importa se eu ficar com a comida? – indagou a jovem Izlandesa animadamente. Quando sorria daquela forma parecia tão jovem quanto uma garotinha.

- Fique à vontade.

Ela aplaudiu, pegando o prato e sentado ao seu lado. Alexandre estava sentado naquela mesma cadeira ainda ontem, encarando-a como se tivesse sido traído. O coração de Isabella se apertou. Teve a oportunidade de contar toda a verdade, contudo decidiu se manter calada. É claro que ele estaria magoado, tinha todo o direito de estar. Ela estaria magoada no lugar dele.

A Izlandesa pegou uma nesga do líquido com uma colher de pau, fazendo beicinho e assoprando vagarosamente. A fumaça viajou para frente e para trás, impregnando o aposento com o odor de peixe. Ela abriu a boca e engoliu a comida ao interim que seu rosto se iluminava.

- Sabe, legumes. frutas e verduras são coisas muito raras aqui em Izlanda – informou como alguém que estivesse a tentar justificar suas próprias ações. – Nada floresce nessa terra de gelo, então seria um desperdício jogar esse tipo de comida fora.

Agora Isabella se sentia mal por ter recusado a comida. Ela tentou não pensar muito no assunto ao passo que capturava o embrulho redondo em seu criado mudo. A jovem desdobrou o tecido em volta da bolinha, se deparando com uma bolota verde e gosmento feito mofo. Apesar de ter uma aparência ruim, o cheiro era bem agradável, entretanto não cheirava a nada que fosse comestível. Tinha um balsamo de terra molhada.

O Imperador VermelhoWhere stories live. Discover now