Capítulo 12

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O CALOR terrível estava deixando até mesmo as flores de rua desanimadas. E Emê de Martnália só queria chegar logo em casa e ligar o ventilador, e depois ficar com rosto bem na frente para aproveitar melhor o vento. Mas sabia que as coisas não seriam simples assim.

Como havia saído mais cedo da escola nesse dia, e não teria treino de vôlei, provavelmente encontraria sua mãe antes que ela fosse para o trabalho. E o pior, Fiona, sua irmã, também estaria em casa. Era por isso que Emê passava o dia inteiro na escola.

Tentou fazer o mínimo de barulho possível ao abrir a porta da sala para entrar. Ouviu vozes vindas da cozinha e soube que sua mãe realmente estava em casa junto de Fiona. Andou na pontinha dos pés pelo piso de cerâmica até o seu quarto e suspirou ao perceber que ninguém tinha reparado em sua presença. Seria melhor assim.

Jogou a mochila em cima da cama e se deitou no espaço vago do colchão. Emê precisava de alguns instantes para... respirar. Fechou os olhos e realmente respirou fundo. Ainda conseguia ouvir as vozes vindas do outro cômodo, mas sua mente não estava ali, e sim nos colegas que deixou para trás, mais especificamente em Elcione e Aguinaldo.

Estava incomodada por estar incomodada.

Martnália não era nenhuma inocente, muito menos idiota. Já esteve nessa situação antes, sabia que não adianta ficar negando aquilo. Como Aguinaldo havia dito alguns meses antes, não dá pra controlar quando ou se vai acontecer. Simplesmente acontece. Mas isso não a impedia de se sentir mal por estar se deixando afetar por algo tão bobo.

O que acontecia era que Emê de Martnália estava sentindo coisas, diferentes, por Aguinaldo. Era estranho admitir para si mesma, e ela até tentou ignorar durante os nove meses que se passaram, mas era a verdade. Esse pequeno chilique foi só mais um sintoma da doença que já crescia dentro dela, porque para Martnália, gostar de alguém era como ter câncer. Aparecia de repente e mesmo que você tentasse tratar, suas chances eram baixas. Também era desesperador. Contudo, ela entendia que ter câncer era com toda a certeza mil vezes mais sério e preocupante do que sentir algo por outra pessoa.

Os outros sintomas já estavam aparecendo há algum tempo, desde que conversou com ele pela primeira vez e rejeitou sua declaração. No começo, foi pena. Sabia que ele era bonzinho e não merecia sofrer por ela. Depois, sempre que olhava para ele, seus olhos se encontravam e ela sentia algo muito bom ao saber que ele estava pensando nela. Aguinaldo realmente gostava de Emê, e não tinha olhos para mais ninguém.

Bem, isso era o que ela pensava até perceber a estranha aproximação entre ele e Elcione.

Para Martnália, eles não faziam o menor sentido. Aguinaldo e Elcione eram o completo oposto um do outro. Ela combinava muito mais com ele, e não era difícil de perceber, eles tinham a mesma vibe. Já Elcione... preferia nem pensar. Não combinavam.

— Tem como você me levar lá amanhã? — Fiona falava para sua mãe enquanto entrava no quarto de Martnália, sem perceber que ela estava ali. — É que vai ficar muito difícil pra mim ir sozinha.

Andou até a mesa do quarto de Emê e deixou ali uma xuxinha roxa. Logo atrás de Fiona, Abadia, que era a mãe das duas, entrou. Ambas tomaram um susto ao ver Emê de Martnália deitada na cama.

— Misericórdia Martnália! — Abadia colocou a mão no peito para se recuperar do susto. — Quando foi que você chegou?

Emê olhou bem para as duas e franziu o cenho. Aquela situação era muito estranha, ela nunca tinha imaginado que enquanto estava na escola, sua mãe e sua irmã invadiam seu quarto com tanta naturalidade.

— O que vocês estão fazendo no meu quarto?

Abadia e Fiona arregalaram os olhos e olharam uma para a outra.

— Eu vim devolver uma xuxinha sua que peguei emprestado, só isso — Fiona respondeu e tocou a xuxinha sobre a mesa.

— Não lembro de ter te emprestado essa xuxinha, Fiona. — Martnália estreitou os olhos.

Fiona Valentina engoliu em seco e olhou outra vez para sua mãe. Nunca sabia como lidar com Emê de Martnália. Apesar de serem irmãs, a mais nova sempre pareceu por algum motivo odiar Fiona e tudo o que ela fazia.

— É que eu estava precisando e você tem muitas...

— Mas eu nunca disse que você podia pegar — Martnália a cortou e se levantou, pegou a xuxinha e guardou em uma gaveta embaixo da mesa.

Outra vez, Fiona e Abadia se entreolharam e respiraram fundo juntas. Sabiam que bastava uma pequena palavra dita da forma errada que aquela situação se transformaria em algo muito maior.

— Tá legal, me desculpa. — Fiona ergueu os braços em forma de rendição enquanto andava para trás.

Emê de Martnália revirou os olhos e bufou. Seria muito melhor tentar dormir um pouco do que ficar ali e esperar receber o mínimo de consideração de uma daquelas duas. Era difícil estar em casa pois sempre estavam em um tipo de guerra fria. Abadia e Fiona contra Emê de Martnália.

As outras duas saíram do quarto e foram para a cozinha, que ficava ao lado do quarto de Emê. Mas dessa vez, a mente de Martnália estava concentrada nelas, e ela estava prestando atenção ao que diziam.

— Se estiver precisando de alguma coisa, é só me pedir filha. Você sabe que é melhor não mexer nas coisas da Martnália — Abadia falou.

— Eu sei mãe! Só queria que pelo menos uma vez na vida a Martnália agisse como uma irmã normal e não como uma psicopata louca que desconfia de tudo o que eu faço — Fiona reclamou.

Emê fechou os olhos e podia jurar que estava de tornando uma criança de cinco anos olhando o álbum de fotos da família outra vez.

— Vamos falar sobre outra coisa, tá bom, esquece ela — Abadia falou.

— Tá bom. A senhora pode me levar na sessão de fotos amanhã?

— Claro filha, com o maior prazer.

Emê de Martnália olhava o álbum de família e percebia que não tinha nenhuma foto sua ali, mesmo que já tivesse cinco anos. Ela perguntava para sua mãe o motivo e Abadia respondia que era porque sua irmã, Fiona Valentina, era uma mini miss e tirava muitas fotos. Essa foi a primeira vez, de muitas outras, em que Emê de Martnália percebeu que sempre receberia as sobras da atenção que sua mãe dava para Fiona.

Ao longo dos anos, se conformou com isso, mas não conseguia sorrir e fingir que não percebia as fotos, os presentes, os passeios, tudo o que perdia para Fiona. Ela só queria encontrar algo que fosse apenas seu, e alguém que a colocasse como prioridade.

E odiava o fato de que agora precisava dividir a atenção de Aguinaldo com Elcione também. Ele tinha dito que gostava dela, e quando ela começava a sentir algo correspondente, o idiota tinha que dar atenção para Elcione e estragar tudo.

Também, se fosse bem sincera, odiava Elcione. Ela era irritante e estava sempre querendo chamar a atenção e dar uma de boazinha. Ninguém podia ser tão feliz e tão idiota quanto ela. Só podia ser fingimento.

Estava cansada de ser deixada de lado e de lidar com essas pessoas fúteis.

Sentiu seu celular vibrar dentro do bolso, e quando o pegou, viu que eram mensagens de um grupo que Elcione havia criado com elas duas, e Aguinaldo e Beltassamo. Emê não leu nenhuma, apenas saiu do grupo e desinstalou o aplicativo de mensagens. Não queria saber de mais ninguém, só de si mesma e das merdas que estava sentindo.

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Oiê, tudo bem? 🤠

Eu não ia postar hoje não, mas eu gosto tanto desse capítulo que precisei postar 💃.

Então, Emê de Martnália bad girl, com daddy issues hehe (no caso seria family issues, mas a gente releva), quem diria ein...

Você esperava por essa? Me conta aqui! 😆

Até o próximo capítulo 😘

Todos Nós Que Estamos VivosWhere stories live. Discover now