E esta história recheada de amor e desgraças nos leva àquele dia. A uma tarde sombria de verão, a um velório.
Quando alguém se aproximava e oferecia suas condolências, Isabelle tratava-o com toda gentileza, mas só Deus sabia o quanto aquilo lhe custava. Mais uma vez, depois de já tantas vezes, a vida lhe roubava um ente querido. A sensação que tinha era a de que não seria capaz de suportar mais aquela perda.
Nas primeiras horas daquele purgatório, ela erguia olhar sempre que alguém atravessava as portas de entrada. Esperava pela companhia de Leonard e por suas palavras de consolo, mas ele não apareceu. Em determinado momento, porém, sua ausência despertou a jovem para a possibilidade de ele sequer haver sido chamado. Eles eram noivos, mas isso poderia anular o constrangimento de aparecer em um velório para o qual não havia sido formalmente convidado?
O anel de noivado usado para selar o compromisso uma semana antes estava em seu dedo, devidamente ocultado pela luva negra. Quando se casassem, quem a levaria ao altar? Mesmo em pensamentos o cenário parecia cinzento sem seu pai.
Não fazia nem mesmo um dia desde sua morte, mas fora tempo o suficiente para que ela soubesse que aquela era mais uma ferida que jamais cicatrizaria. O corpo do falecido conde jazia exposto na catedral que seu irmão alugou para o velório, dentro de um enorme caixão de mogno impecavelmente lustrado. Apesar dos ferimentos que o acidente lhe causara, tinha um sutil esboço de sorriso nos lábios. Inspirava paz. Esperanças de uma outra vida ao lado do Senhor a quem sempre serviu.
Isabelle afastou o olhar do rosto do pai após ouvir alguém se aproximar. No instante em que os pelos claros de sua nuca se eriçaram, ela soube de quem se tratava. A mão da garota procurou pela de Edgar instintivamente, e mesmo que ele não pudesse lhe devolver o aperto que tanto precisava, ela pôde sentir seu coração se apaziguando.
— Isabelle, querida — chamou Enrico, abrindo um sorriso amável. — Por gentileza, venha receber os convidados junto a mim.
Era desconcertante conhecer alguém cujo nome mal se ouviu ser mencionado ao longo de toda a vida. É claro, Isabelle tinha conhecimento sobre a existência de um irmão do qual Edgar não era próximo e sobre o qual sua avó sequer falava. Ele era um assunto claramente proibido em suas vidas e isso fez com que a curiosidade da menina fosse reprimida desde sempre. E eis que algumas horas após receber a notícia acerca do falecimento do pai, surge Enrico em sua casa. Como uma cópia de Edgar, um retrato vivo.
Isabelle teria desabado se não tivesse sido amparada pelo abraço do tio, que surgiu tão repentinamente quanto sua própria presença. E naquele momento, já tendo passado o susto de descobrir que seu pai tinha um irmão gêmeo, ela ainda estava abalada. Sua cabeça latejava só de vê-los lado a lado, um sendo a versão da vida e o outro da morte, tão idênticos que mais pareciam terem saído do mesmo molde.
— Perdoe-me, meu tio, mas não me sinto bem — murmurou, apertando a mão fria e rígida do pai com mais força. Sua voz espelhou perfeitamente como se sentia por dentro: fraca e quebradiça. — Prefiro ficar aqui, se o senhor não se importar.
A súplica da jovem alcançou o coração de Lorde Green. Ele se aproximou até estar ao lado dela e envolveu-lhe os ombros em um abraço lateral. Sem forças o suficiente para resistir à primeira demonstração genuína de afeto daquele dia, Isabelle deitou a cabeça loura no ombro dele como teria feito se ele fosse mesmo o seu pai.
— Imagino que seja doloroso o que está sentindo — começou o conde, com toda a delicadeza. — Perder o sagrado pilar que lhe sustenta em tão tenra idade... Mas se olharmos por outro ângulo, talvez vejamos que você possui idade suficiente para entender que para cada privilégio que a nossa posição nos oferece, existe uma obrigação, e em alguns casos, uma cobrança. Olhe à nossa volta.
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Com amor, Isabelle
Historical FictionApós a morte do pai, Isabelle Green é forçada a se casar com o imponente Duque de Deville. Tudo estaria perfeitamente bem se não fosse por um pequeno inconveniente: Isabelle é apaixonada por Leonard Albers. Esse casamento estaria destinado ao eterno...
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