2 - O outro feiticeiro

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Onde foi que eu parei? Me distraí. Ah, sim. No começo, havia só criaturas vivas formando o monstro. Depois, à medida que a batalha acontecia, partes vivas e partes mortas. No fim, aquela coisa gigante, e aquelas formas encaixadas que a formavam, estavam todas mortas. A coisa toda. Eu diria que o... o outro mago havia vencido a batalha. O adversário.

O outro feiticeiro era imensamente poderoso. Erbel era o nome dele. Os olhos dele tinham um brilho esbranquiçado. Tinha escarificações também. Símbolos entalhados no corpo como uma rede de círculos e sinais. Um símbolo para cada poder. Ele fez alguns desenhos na areia, uns símbolos, e após algumas gotas de sangue, o milagre aconteceu. O pesadelo, melhor dito. Estou arrepiado até agora. Sob seu comando, sob suas mãos, uma fera de areia de seis braços se formou, através de um espírito fortalecedor e vivificante de um encantamento. Sim! Era como um oceano de areia, que se levantou como um monstro disposto a devorar a todos.

O que aconteceu de fato? Sinceramente, não sei explicar. A princípio, a situação resumiu-se a algumas gotas de sangue caídas na areia, e com o uso de uma magia superior, o máximo de grãos de areia se acumulou e começou a esculpir, ou melhor dito, formou uma imagem insana e consideravelmente grande de um homem. A imagem não só manteve-se grande, como cresceu a cada instante. Diante deste monstro, e do outro, senti-me totalmente perdido, nanico, como se tivesse encolhido. Ali, nós éramos como formigas.

Sim. É isso. Olhando para os gigantes colossais, convenci-me de que era fraco e insignificante. Mas era fantástico. Fantástico! Pensava que não existia mais magia nesse mundo.

Se não era uma imagem falsa? Uma ilusão? Os feiticeiros não seriam grandes ilusionistas? Seria frustrante saber que a resposta é um imenso sim. Só que não. É claro que é difícil de imaginar dois gigantes lutando lá no alto; gigantes formados por redes temperamentais de criaturas vivas diversas e areia. Invenção pura? Que tal isso? Vou dar-lhes outros detalhes.

Lembro-me de ter me inclinado mais e mais para trás, para acompanhar o crescimento repentino das outrora pequenas colunas de areia. Arregalei os olhos, com o coração acelerado. O instinto gritava dentro de mim. Fuja! Fuja! Mas eu não podia simplesmente fugir com o rabo entre as pernas. Nessa hora me lembro de que pensei "porque os magos não brigam mano-a-mano, como todo o mundo?". Foi na hora em que se deu o brotamento dos braços...

Olhei para ambos os gigantes. A luz da lua batia nos insetos e nas outras criaturas, e em infinitos grãos de areia, e eles brilhavam. O brilho deles se misturava ao negror da noite. Na Fera das Feras era possível ver pontas de brilho pálido, que se projetavam como lanças. Eram as partes dos corpos dos pequenos mamíferos, répteis, anfíbios, insetos, aracnídeos e aves que formavam o gigante. Uma grande fera, formada de pequenas feras! Ela soube enfrentar de igual para igual o Gigante de Areia.

Às vezes, o monstro de areia transformava-se, e se agachava, formando o aspecto de uma gigantesca aranha. Uma aranha de areia. Todo o vale era a sua teia, e nós as suas presas. Era intimidador. Ela tinha uma movimentação perfeita, bonita até. Uma colossal besta-fera feita de grãos de areia amarela, visível à luz da lua e das estrelas.

Essa areia sepultou muitos de meus amigos e inimigos. Muitos deles sobreviveram, mas estavam cobertos até o pescoço pela areia impetuosa.

No chão, a areia começou a ficar vermelha. Sangue misturou-se a ela. É o que se espera quando se está numa guerra com monstros colossais e bestas ferozes.

Era possível ver isso sim, pois tochas acesas estavam fincadas na terra, à esquerda e à direita, em todo o lugar! Ao nosso redor, sombras lutavam ao lado dos espíritos brilhantes do fogo. Eu matei muitos, mas matei o vento umas dez vezes mais. Oh, sim, o tempo estava bem ventoso durante os confrontos.

Rolávamos pelo campo, guerreando. Vivi alguns dos momentos mais memoráveis de minha vida. Foi tudo, assim, tão carregado de dor e perdas. Foi muito intenso, estávamos embriagados na luta, assustadoramente. Um daqueles porres mortais de frenesi de batalha. A Fúria do Urso!

Calma, eu estou narrando. Tá bom? Então tá.

Deva Sopra CrocodilosWhere stories live. Discover now