II

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Renato procura entre os enlatados e comidas congeladas algo que possa oferecer a uma pessoa que não se alimentava direito há dias. Depois de revirar a cozinha algumas vezes ele acaba por se decidir em preparar uma porção individual de nhoque com omelete. Em menos de meia hora estaria pronto.

Enquanto isso no segundo andar, Anna tenta relaxar seu corpo tenso na água morna da banheira. Dolorida, cansada, destruída. É como se sente. Fugir não é fácil. Mas não tem outra opção. Não enquanto não puder provar sua inocência.

O cheiro quem vem da cozinha atiça sua fome. Não comia há quase dois dias. Sai da banheira e se seca na única toalha que tem no banheiro. A tolha tem o cheiro dele. Algumas lembranças insistem em voltar, mas ela se recusa a pensar nisso agora. Olha suas roupas jogadas no chão. Estão terrivelmente sujas.

Decide vestir a camiseta do Ramones que está pendurada atrás da porta. Mesmo não sendo muito comprida, é melhor que uma toalha. Pega suas roupas e vai em direção à escada. É a segunda vez que passa por ali. No entanto, só agora presta atenção a sua volta. Ao chegar à sala, reconhece de imediato o pôster emoldurado do filme Psicose com o vidro ainda rachado. Ela sorri ao lembrar-se da noite em que fizeram aquele estrago. O quadro é mais uma prova de que ele não deixou o passado dos dois para trás como deveria ter feito.

- Será que posso lavar as minhas roupas? - Anna pergunta da sala. É possível ver a cozinha de onde está já que apenas um balcão divide os dois cômodos. Renato está distraído demais com o fogão para prestar a atenção nela.

- Claro. A máquina fica logo ali - ele aponta para porta no canto da cozinha. Só quando ela passa para ir até a área de serviço, é que ele percebe que ela está usando apenas a sua camiseta.

Renato balança a cabeça. Isso não é dar certo. Conhecia muito bem com Anna funciona. Como ela o provoca intencionalmente nos mínimos detalhes. Mas ela está ali porque precisa de ajuda. Não é como se ele tivesse escolhido se torturar dessa forma? Ele se questiona se realmente fez a coisa certa enquanto serve a comida dela em um prato que estava no amontoado de louça lavada que ele nunca guarda no lugar certo. Encosta-se a pia. Anna, ao reaparece na cozinha, com um sorriso tímido pergunta se não há problema em ter pego a camiseta.

- É que eu não tenho outra...

- Sem problemas - ele a corta - Espero que goste da comida. Vou estar lá encima, caso precise de mais alguma coisa. - ele vai em direção à porta.

- Não vai me fazer companhia?

- Tenho que arrumar umas coisas lá encima - ele para, mas não olha para ela.

- Esqueci que você faz isso - ela revira os olhos ao falar.

- Isso o que? - ele finalmente a olha.

- Esqueci essa mania irritante que você tem de fugir de mim - diz olhando diretamente nos olhos dele.

- Não estou fugindo. Se isso fosse verdade, não teria aberto a porta da minha casa para dar abrigo a uma fugitiva - ele se irrita com o comentário porque sabia que no fundo ela está certa. Anna congela no lugar como se tivesse levado um tapa. Nem ele acredita nela, é o que pensa. No mesmo instante, Renato percebe e se arrepende do que disse.

- Acho que é melhor eu ir embora. Não vai dar certo eu ficar aqui por muito tempo - o acumulo de situações limites por que passou faz com que ela se exaspere por nada. Ela vai decidida em direção à porta da frente.

- Enlouqueceu? Você não pode sair daqui - ele a detém, segurando pelo braço.

- Você não me quer aqui. Me deixa ir - ela tenta se soltar. Ele segura com mais força.

- Cala a boca, Anna - eles se encaram por um momento que parece infinito. Uma mistura de sensações boas e ruins é passada de um para o outro. Ainda há muitos mal resolvidos entre eles. Ambos estão machucados. Mas também há cumplicidade, um entendimento que é só deles. Renato a puxa para um abraço passando os abraços pela cintura da garota. Sussurra com o rosto escondido nos cabelos dela - Desculpa.

- Eu que te peço desculpas - ela dá um beijo discreto no pescoço dele - Você está me ajudando. Eu não posso de pedir nada mais do que isso depois do que eu te fiz. Prometo que logo vou embora - ficam um tempo parados ali, apenas se olhando, até que ele se afasta.

- Não pensa nisso agora. Vai comer. Depois pode ir dormir no meu quarto lá encima. Vou dormir no sofá.

Lose ControlWhere stories live. Discover now