Capítulo 5

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- Princesa...quanta insolência!

Resmungo enquanto me dirijo para a entrada, onde minha carruagem já deve estar me esperando. Estou tão revoltada com o que aconteceu e com as coisas que Lorde Ribeiro falou, que não percebo a presença de alguém ao meu lado.

Somente quando a pessoa toca levemente em meu ombro é que percebo, em um sobressalto. Penso que pode ser o Lorde insolente novamente, incansável em suas tentativas, mas então levanto meu rosto e percebo que é Lorde Oliveira.

- Você parece abalada, aconteceu algo?

- Nada que eu não possa resolver.

E posso resolver, não é a primeira vez em que tenho que lidar com um nobre arrogante e cheio de si. Só me parece um pouco estranho esse tipo de atitude vinda de um bastardo, talvez seja exatamente por isso que ele aja assim.

Cresceu ilegítimo e foi ensinado a tirar proveito das pessoas para seu próprio benefício. Não sei quem é sua mãe e pouco me importa quem ela seja, só preciso que ele se comporte daqui em diante.

Se nossa conversa serve de algum indicativo, espero que ele se adeque aos modos da corte.

- Soube que você tem outra reunião hoje.

Ele fala, chamando minha atenção.

- Sim, quero saber como estão as soluções para o problema de fornecimento de água.

- Seria pedir muito, que me deixasse lhe acompanhar?

- Algum motivo em específico?

Nosso encontro de ontem e as coisas que falei ainda estão frescas na minha cabeça. Sempre fomos muito discretos, o que significava não ficarmos sozinhos por muito tempo. Isso incluía viagens de carruagem.

Me lembro de dividirmos minha carruagem em visitas oficiais, mas sempre havia uma terceira ou quarta pessoa conosco. Isso tudo me leva a questionar o motivo de seu pedido e somente por isso fiz a pergunta.

- Camila, por favor.

Ele diz em um tom de voz em que somente eu possa ouvi-lo.

Olho dentro daqueles olhos verdes e sinto que não devo questionar além disso, me parecem suplicantes e tenho certeza que o curto percurso entre o castelo e a sede não nos trará problemas.

- Claro que pode vir comigo, só não sei exatamente quando voltarei para casa.

- Não há problema.

Eu o encaro por um momento, pensando qual motivo ele tem para ir comigo. Ele chega para o lado e gesticula para que eu vá na frente. Passamos pelos corredores, sem trocar uma só palavra, até chegar na entrada principal.

Lorde Oliveira me ajuda a subir na carruagem e logo em seguida entra e fecha a porta. Quando os cavalos começam a sair do lugar ele começa a falar.

- Acho que precisamos conversar.

Fixo meus olhos nele e espero que ele diga o que quer. Sei que não é nada em relação ao reino pois ele poderia ter me falado enquanto estávamos dentro do castelo.

- Nosso último encontro me fez refletir bastante, continuo com o mesmo pensamento mas gostaria de tentar uma última vez.

- Tentar o que, exatamente?

Tenho uma noção do que possa ser, afinal o que mais seria? Tive minha cota de pressuposições que me deixaram parecendo uma inútil manipulável, aprendi minha lição e sempre espero que digam diretamente o que querem dizer com suas palavras.

- Quero que você pense sobre nós, sobre o que passamos e tivemos nesses últimos anos.

Ele faz um tipo de pausa dramática, acreditando que eu precise desse tempo para pensar em nós. Como se eu não tivesse pensado nisso todos os segundos a partir do momento em que fechei a porta do escritório dele.

Não preciso que ele saiba disso, não preciso parecer fraca ou meramente apaixonada por ele. Mantenho o contato visual e a cabeça levemente levantada, uma máscara de impassibilidade se espalha pelo meu rosto.

- Vou ignorar o fato de você ter acabado de me dar uma ordem, fingir que foi uma sugestão e lhe dizer que não preciso refletir sobre nosso relacionamento.

- Camila...

- Não sou uma debutante ingênua à caça de um título, não tenho uma família me forçando e não pretendo me casar tão cedo.

Percebo uma leve agitação naqueles olhos.

- Você estava falando sério, então. Você me mandou procurar uma esposa.

- Achei que me conhecesse bem o suficiente para saber que não costumo proferir palavras em tom de brincadeira. Se lhe disse para procurar uma esposa, é isto o que significam. Procure uma esposa.

- Não há nada que eu possa fazer para...

- Isso significaria que não sou capaz de tomar decisões sozinha, que não sou capaz de enxergar as coisas.

Eu o corto novamente, sentindo cada vez mais a irritação borbulhar dentro de mim.

- Você é a pessoa que mais me conhece e entende neste reino, não me faça ter rancor.

- Só quero ter certeza.

Nos encaramos por um momento. Sei lidar com os nobres, sei lidar com os homens que me subestimam e sei lidar com as expectativas de todos em cima de mim. Nesses anos em que sou a rainha eu tive de aprender a ler as pessoas.

Por conta disso raramente sou pega de surpresa em uma conversa, pois consigo enxergar os indicativos. Olhando para ele eu me pergunto o motivo desta conversa, qual a razão dele insistir tanto.

- Não uso meias palavras ou significados escondidos, André.

Ele pula de seu assento e senta ao meu lado, agarro um punhado de tecido do meu vestido e ao perceber isso ele pega as minhas mãos. Ficamos assim por um tempo, eu observando nossas mãos juntas enquanto ele as acaricia com os polegares.

- Sei o quanto você sacrifica, vejo você vestir essa máscara todos os dias. Não sou idiota, eu lhe faço bem e quero continuar fazendo. Camila, não sou leviano em minhas atitudes.

- Não posso... não posso fazer isso agora.

E então eu cometo um erro, o erro de levantar os olhos. No momento em que meus olhos encontram o verde, vejo algo que não consigo identificar. Desejo e pesar talvez, as duas coisas se intercalando.

Ele passa seus olhos vagarosamente por meu rosto antes de suspirar e inclinar a cabeça para frente. André segura meu rosto com uma das mãos e descansa sua testa na minha, deixando nossos lábios a um sussurro de distância.

- Quero que você seja minha esposa, Camila.

E então seus lábios encontram os meus. É um beijo doce, leve e que busca mostrar o quão calma nossa relação pode ser. Ele não se apressa, não percorre meu corpo com suas mãos e passa seus lábios e língua por meu pescoço. André se afasta e continuamos assim por alguns segundos.

- Não espero que isso continue acontecendo depois que você estiver casado.

- Sua resposta ainda é não.

Não é uma pergunta, portanto não digo nada. Chegamos mais perto de meu destino final, uma área mais movimentada. Bastante consciente que alguém pode nos ver sentados ao lado um do outro, eu me levanto e sento no outro banco.

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⏰ Last updated: Oct 23, 2021 ⏰

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