Os Sentinelas do Leão

6

-Depois a gente conversa sobre isso, chefinho. Eu preciso que o senhor abra a Spectron pra mim.

-Eu não vou ablir a boate agola, Lucas Navalo! Eu acabei de chegar de lá.

-O senhor mora na mesma quadra da sua boate, senhor Takeshi. Não seja tão dramático. Pra chegar de lá, basta dar a volta no quarteirão.

-Cadê minha moto, Lucas Navalo? –insistiu o Senhor Takeshi.

-Eu vou dizer direto que assim dói menos. Sua moto já era. Espatifou-se no asfalto.

-E você tá inteilo? Lucas Navalo, você tá me loubando!

-Pense o que quiser, Senhor Takeshi. Eu trabalho de graça até quitar o valor da moto, tudo bem assim? Mas se não quer ir comigo agora até a Spectron, então me entregue a chave da boate e me diga qual a senha para acessar as filmagens feitas pelas câmeras de vigilância.

-Eu não vou te entlegar nada, seu ilesponsável destluidor de motos! Pla quê você quer ver essas filmagens?

-Chegando lá o senhor vai entender. Vamos?

-É ela! –exclamou Lucas, assim que reconheceu a ruiva misteriosa no vídeo gravado pelas câmeras de vigilância, chegando sozinha na boate. Imediatamente pausou a imagem e bateu uma foto com o celular.

-Agola chega, Lucas Navalo! Essa blincadeila não tem glaça! –replicou o Senhor Takeshi, mais irritado que o habitual.

-Que brincadeira, Senhor Takeshi? Isso é sério! Essa garota explodiu um avião!

-Essa galota não é telolista, Lucas Navalo!

-Como o senhor pode ter tanta certeza disso?

O senhor Takeshi baixou os olhos, engoliu seco e respondeu cabisbaixo:

-Essa galota... ela é... minha namolada.

Lucas soltou uma sonora gargalhada, constrangendo o senhor Takeshi.

-Por que a lisada, Lucas Navalo? Acha que só você pode ter namolada bonita?

-Eu nunca tive namolada. –afirmou Lucas, imitando o senhor Takeshi e prendendo os lábios para não dar outra risada.

- Mas todas as galotas gostam de você, não é mesmo? Acha que nenhuma galota pode gostar de mim só porque eu sou um anão? –questionou o senhor Takeshi com firmeza, deixando Lucas sem jeito.

-Desculpa senhor Takeshi, eu não quis dizer isso! –respondeu Lucas, arrependido.

-Nem todas as galotas plefelem você, Lucas Navalo. Ela me disse que eu ela um homem muito mais intelessante.

-Peraí, o senhor tá me dizendo que vocês conversaram sobre mim, é isso? –perguntou Lucas, saltando da cadeira.

-Ela só disse que não gosta de calas abusados como você. E eu falei soble seu comportamento. Nada demais.

-Esse namoro já dura quanto tempo, senhor Takeshi?

-Uma semana. –respondeu encabulado, já prevendo a pergunta que viria a seguir.

-Foi ela que lhe abordou, não é? Provavelmente aqui mesmo, na Spectron.

-Tá bom Lucas Navalo! Eu já entendi aonde você quer chegar! –irritou-se.

-Essa garota não é sua namorada, senhor Takeshi. Ela estava te usando pra pegar informações ao meu respeito.

-Dloga! Dloga! Dloga! –esperneou o senhor Takeshi. –Lucas Navalo tem lazão! Eu sou mesmo muito bulo. O que uma galota bonita como ela ilia queler comigo? –perguntou com os olhos cheios de lágrima.

-Calma senhor Takeshi. Também não é assim.

-Depois daquele dia aqui na Spectlon, nós saímos pla jantar apenas uma vez. Eu perguntei se a gente tava namolando e ela disse que sim. Mas na hola que me estiquei pra dar um selinho, ela vilou o losto e foi embola. Disse que ia me ligar e nunca ligou.

-Você nem ao menos sabe o nome dela, não é?

-Não. –respondeu cabisbaixo, enquanto as lágrimas escorriam pelo rosto. E pela primeira vez desde que começou a trabalhar pro senhor Takeshi, Lucas viu no patrão mais do que o anão caricato de voz estridente e sotaque carregado a quem nunca deu bola.

Enxergou nele um ser humano carente e solitário. Tinha pena de sua ingenuidade e ao mesmo tempo, certeza do seu bom coração. Afinal, só mesmo tendo um coração de ouro para tolerar seus abusos. Por mais que soubesse que se fosse demitido, a boate esvaziaria, no fundo sentia que não era apenas por isso que mantinha o seu emprego. Apesar de tudo, o senhor Takeshi admirava seu jeito atrevido. E amava ele como um filho. Por alguns segundos, deixou de ser o rapaz indiferente e petulante que o patrão conhecia, e abraçou o senhor Takeshi com carinho.

-Por que fez isso, Lucas Navalo? –perguntou, enxugando as lágrimas.

-É isso que os amigos fazem senhor Takeshi. –respondeu, com um afetuoso sorriso.

O celular do senhor Takeshi começou a tocar. Ele então tirou o aparelho do bolso e arregalou os olhos quando viu na tela: chamada não identificada. Já supondo quem estava no outro lado da linha, Lucas tomou de sua mão o celular e atendeu a ligação no viva voz.

-Agora entendo porque nunca demitiu esse abusado do Lucas Navarro. Ele é mesmo muito esperto. –disse uma voz metálica.

-Não plecisa disfarçar a voz com esse som metálico, luiva do mal. Eu sei que é você! –afirmou o senhor Takeshi, com uma coragem que até então Lucas desconhecia.

-Desculpa partir seu coração, "amorzinho"! Mas não é com você que eu quero falar! –ironizou a voz metálica.

-Você tem meu número! Porque não ligou direto para mim? –perguntou Lucas, enquanto vasculhava o escritório. Logo notou uma pequena luz vermelha piscando no topo do monitor onde assistiam o vídeo e encontrou o que procurava: uma micro câmera que os filmava naquele exato momento. Desligou o computador e a luz vermelha também se apagou.

-Vejo que descobriu meu segredo, Lucas?

-Nos vigiando pela própria webcam do senhor Takeshi! Aposto que ele te deu a senha do sistema de vigilância da boate. –afirmou, encarando o patrão com um olhar de reprovação.

-O que foi? Ela me disse que havia se perdido de uma amiga. Eu falei pla ela ver nos vídeos se a amiga tinha ido embola. –replicou o senhor Takeshi, constrangido.

-Não foi pra discutir meus métodos que liguei Lucas Navarro. –disse a voz metálica, com frieza.

-Então diga logo o que você quer.

-Por aqui não. Hoje a noite, às 21 horas em ponto, vá até a cafeteria do campus da Universidade de Águas Cristalinas e me aguarde na mesa que fica encostada a janela. Vá sozinho! Seja pontual! E o mais importante, não sente em nenhuma outra mesa além da que estou indicando.

E desligou a ligação.