🐟 CAPÍTULO 20 - CAMARÃO DE CASTRO 🐟

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Metade dos bichos não come, e a outra metade não dorme, pois tem medo da que não come. A sabedoria do Dono do Mangue poderia desorganizar esta cadeia alimentar decadente, mas ao recomeçar a vida do zero, tudo aconteceria de novo, e de novo, e de novo...

Sábio Camarão

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26 de julho de 2009

O velho Garopo estava faminto. Todas as manhãs, ele desbravava o horizonte esverdeado das águas salobras em busca de algo para comer.

Nadou até as profundezas e abriu uma cortina de raízes. Teve a sorte de encontrar um camarão enorme, então se aproximou para abocanhar o crustáceo, porém, mudou de ideia quando ouviu a voz elegante do bicho.

— Por que você vai me devorar? — Perguntou o camarão.

O Peixe-velho ficou confuso. Nunca tinha visto um camarão usando óculos humanos.

— Porque tô com fome. *nago*

— É um bom motivo, de fato. Mas por que eu? Você poderia comer as folhas, ou a casca das raízes de mangue-vermelho... Comida no manguezal é o que não falta.

Garopo sentou-se sobre uma pedra, coçou a cabeça e respondeu:

— Sempre comi bicho. *nago*

— Isso não significa que está certo. Você também é um bicho, não é?

O camarão usou seus longos bigodes para endireitar os óculos; as lentes amplificavam os olhos.

— Não sou bicho. Meu nome é Garopo. Sei falar. *nago*

— Eu percebi. Também sei falar. E mesmo assim, você quer me comer.

O Peixe-velho observou os detalhes da carapaça do camarão e viu que havia várias manchas coloridas nela.

— Tu é o Dono do Mangue? *nago*

O camarão pensou um pouco antes de responder:

— Se eu disser que sim, você vai desistir de me usar para matar a sua fome?

— Sei não. *nago*

— Então eu não sei a resposta. Porém, sei que, assim como você, eu também tenho um Nome.

A barriga de Garopo roncou enquanto o camarão falava.

— Nomeei a mim mesmo como Camarão de Castro. Mas você também pode me chamar de Sábio Camarão.

O Peixe-velho engoliu um pouco de água e perguntou:

— Moro aqui faz tempo. Nunca te vi. Foi Nanã que te criou? *nago*

— Não. Eu sou a obra indesejada de uma humana chamada Maiara. Nasci da semente que ela cuspiu no manguezal e herdei a inteligência suprema dela.

O Sábio Camarão desafiou o instinto ao nadar para perto da boca do Peixe-velho.

— Tô com fome. *nago*

As pequenas bolhas que saíram da boca de Garopo se fixaram nos bigodes do Sábio Camarão.

— Eu sei que você vai me comer. Eu sei de tudo. Absolutamente tudo! Sei quem é você, quem é o Dono do Mangue... Minha sabedoria é tão transcendente que eu já existia na mente dos Seres Humanos antes mesmo de passar a existir nesta forma.

AFOGADORUM - O Dono do MangueOnde as histórias ganham vida. Descobre agora