2.2 Ideias

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            Eu não podia ficar no meu apartamento de jeito nenhum. Se ficasse, eu ia pensar, ia sentir, ia mergulhar na solidão e vazio que estavam à espreita, e nada daquilo me faria sair da cama para batalhar pelos meus problemas. Então assim que eu acordei, liguei para a casa de Papá, sendo atendido por Priscila, e solicitei que eles reunissem todos os funcionários no bordel o mais rápido possível.

            Claro, como pessoas da noite, fui obrigado a encontra-los quase na hora de almoço para que alguns deles ainda aparecessem atrasados, mas por fim estavam todos ali.

            Papá tinha me dado toda a liberdade de fazer o que eu achasse melhor, disse que confiava em mim e que, de fato, sua situação não era das melhores para se dar ao luxo de reclamar de uma medida ou outra. Então me aproveitei daquilo para já colocar em prática todas as melhorias que eu tinha anotado na noite anterior.

            - Minhas crianças, quero que conheçam Matteo. Ele também é como um filho para mim e vai ficar conosco algum tempo promovendo mudanças no Rendevouz. Vai nos trazer mais clientes e permitir que esse lugar continue de pé por muito tempo ainda, se Deus quiser! – Papá introduziu, fazendo a plateia começar uma roda de aplauso desconfiada. Era estranho ouvi-lo mencionar Deus naquelas condições, mas aquilo não era da minha conta. As pessoas me encaravam curiosas, questionando meus trajes, minha presença e de que forma eu poderia afetá-las. Não estavam me rechaçando, no entanto, apenas aguardando que eu mostrasse quem era e a que tinha vindo.

- Obrigado, Papá. – agradeci, então me voltando para a staff. – Bom, como ele disse, pretendo gerir as coisas por aqui da melhor forma possível para impactar na vida de todos nós de forma positiva. Vou precisar, portanto, promover algumas mudanças. Mas para que tudo aconteça de acordo, a ajuda de vocês será essencial e é para isso que estamos aqui hoje, para colocar a mão na massa e pensarmos juntos em soluções inovadoras. Já tenho algumas ideias depois de observar o movimento ontem e quero já compartilhar com vocês. – os rostos interessados que me olhavam atentamente pareciam me pedir para continuar, então eu o fiz. - Acredito que a primeira coisa que precisamos é de um segurança. Em se tratando de um estabelecimento que vende álcool, é um profissional essencial de se ter por perto. Alguém tem alguma indicação? – uma garota ruiva tingida levantou a mão e eu gesticulei para que ela falasse.

- Meu primo está desempregado e já trabalhou de guarda-costas. – ótimo, querida. Ele vai cobrar barato e deve ser um brutamontes 2x2.

- Me passe o contato dele quando acabarmos aqui, por favor. – ela acenou positivamente, me dando um sorrisinho charmoso. – Continuando, vou precisar que alguém se habilite a fazer uma playlist mais animada para usarmos de som ambiente. Com o que estamos tocando, logo só terão velhos barrigudos por aqui e tenho certeza que as meninas preferem presenças mais viris e sem alianças nos dedos, estou errado? – elas riram, discretas, e eu quase simpatizei.

- Eu faço. – uma negra exuberante disse, e eu me preocupei que pelo seu sorriso as músicas fossem um pouco a mais do que eu esperava.

- Ótimo, depois sentamos para discutir o estilo, pode ser? – ela deu de ombros e eu segui minha lista. – Vamos precisar de um palco também, ou de alguma forma de apresentação. Vocês hoje quem procuram os clientes, e isso não é certo. Eles precisam sentir que vocês são uma conquista e não uma escolha de cardápio. Fará com que estejam dispostos a pagar mais. – um burburinho animado começou enquanto todos falavam ao mesmo tempo, parecendo, em sua maioria, animados com a ideia. Escolhi uma índia para ter o poder de voz, em uma tentativa de controlar o barulho.

- Eu posso conseguir alguns holofotes! A gente os aponta para aquela parede do fundo e encena alguma dança mais sexy enquanto eles nos observam.

- E que tal se fizéssemos como um leilão? Enquanto a garota se apresenta, um narrador diz suas qualidades e habilidades no microfone para atrair ainda mais a atenção do público. – Lola disse, apesar de eu não ter lhe dado a fala, mas eu precisei admitir que era uma ideia interessante.

- Ótimo, você vai pegar as luzes, - apontei para a índia - e você me arranja um microfone e uma ficha de cada uma aqui. – então disse a meu objeto de estudo, e enquanto uma concordou prontamente, Lola só me encarou sem esboçar qualquer reação. Preferi acreditar que ela faria o que eu pedi para continuar com a reunião.

Era uma solução um tanto quanto improvisada, mas assim que conseguíssemos algum dinheiro eu diria a Papá para comprarmos um palco com pole e tudo ficaria menos amador. – Com essa nova organização, vocês vão precisar se comportar diferente. Continuarão com os flertes com os clientes, mas agirão como garçonetes o tempo inteiro que não estiverem sendo “leiloadas”. Vai dar um ar interessante de “você pode ver, mas não pode tocar”.

- Mas e os clientes já tradicionais? Eles estão acostumados a poder conversar com a gente e podem se irritar com a nova organização. – Lola se pronunciou novamente, e eu quis colocá-la em uma mordaça para esperasse minha autorização para abrir a boca.

- Tenho certeza que se fizerem charme, jogando a culpa em mim, eles só ficarão mais atiçados, querida. “Desculpe, seu Olavo, o malvado do novo gerente diz que eu só posso conversar com você no quarto...” – imitei o que uma delas poderia falar, já incorporando o nome de cliente com quem ouvi Papá conversando no dia anterior. A plateia caiu na risada e eu observei duas das putas se cutucando com olhares de águia em cima de mim.

Não, obrigado.

Lola mordeu os lábios, não parecendo satisfeita, mas eu não podia ligar menos nem se quisesse.

- Vou sentar com cada uma de vocês essa semana para passar o contrato e rever as porcentagens e preços que estão sendo praticados. Espero não ter problemas com a boa vontade de vocês em manter isso aqui funcionando. – a grande maioria não esboçou reclamação, provavelmente não entendendo que eu me meteria no quanto elas faturavam, mas Lola, sempre arisca, bufou e revirou os olhos. Aquela garota tinha um ar de revolta que era no mínimo interessante, mas estava começando a ameaçar minha liderança. – Por hoje é só, nos vemos às nove horas quando estivermos nos preparando para abrir. Por hoje o esquema continua o de sempre, mas amanhã já quero todas as tarefas cumpridas para começarmos a trabalhar no novo modelo. – a turma começou a dispersar, as meninas saindo pela porta de ferro e Lola, curiosamente, subindo as escadas que dariam para o segundo andar do bordel. Ali eram onde ficaram os quartos que elas usavam quando um cliente não estava interessado em ir a um motel melhor, e por serem usados apenas com esse propósito, achei muito peculiar que ela tivesse subido. Iria averiguar aquilo logo. - Martin, gostaria de vê-lo um instante no escritório. – chamei, antes que o barman latino também fosse embora. Ele acenou e eu indiquei a porta, pedindo que Papá não se metesse ao me trancar ali com ele.

Obriguei-o a assinar um contrato de confidencialidade, e o demiti dizendo que, no novo modelo, não haveria espaço para um barman, quando na verdade eu só queria substituí-lo pelas garotas da casa mesmo, que chamariam mais atenção.

[Degustação] BordelWhere stories live. Discover now