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Laura

Se eu falar que não gostei das mensagens que recebi ontem à noite, estarei mentindo a mim mesma. Gostei tanto que agora, enquanto tomo o café da manhã, estou relendo-as. Antes que a Didi venha me questionar sobre esse sorriso estampado na cara logo ao amanhecer, melhor eu me recompor – foi só pensar nisso que a própria já apareceu, com seu olhar de mistério, carregando um sorriso cheio de deboche.

- Bom dia, flor do dia! – me beijou o rosto – Sonhou com dentista, pra acordar assim, cheia de dentes?

- Bom dia! – sorri e revirei os olhos ao respondê-la – Eu também te amo, Didi.

Ela puxou uma cadeira, sentou-se e começou a se servir de café, olhando diretamente para meus olhos.

- E então?! Já estou sabendo de tudo que rolou ontem, da delegacia, do vídeo, de tudo – tomou um gole do café – Mas o que não consigo entender, é o que está causando esse brilho no olhar, junto com esse sorriso bobo, mesmo em meio a tanta notícia ruim?

- Eu é que não consigo entender, o por que eu teria que ficar resmungando e não ver a vida com bom humor – respondi arqueando a sobrancelha e tomando um gole do café, imitando-a.

Ela sorriu sem desviar o olhar do meu.

- Bom humor é sempre necessário, meu amor! – começou a comer um pão de queijo e falava enquanto mastigava – Mas.. o que eu estou falando ... não é sobre ... bom humor.

- Já que está tão cheia de respostas, porque então está me perguntando? – fiz uma careta, revirando os olhos.

Ela parou de comer e me olhou muito intensamente.

- Porque quero saber se você, já se respondeu! - e levantou as duas sobrancelhas.

- Eu me responder sobre o que, Didi? – apoiei os cotovelos na mesa e o queixo sobre as mãos.

- Se vai se permitir ser feliz, ou vai continuar se enganando?

Meu Deus!! Senti um iceberg nascer dentro do meu âmago com essas palavras. Essa minha mãe que a vida me deu, é muito sensitiva e sagaz. Está ligada em todos os mínimos detalhes, de tudo.

- Eu quero me permitir, Didi – baixei os olhos procurando as palavras corretas para dizer – Mas tenho muito medo.

- Entendi.. pois é – falava enquanto passava geleia no pão de queijo – Você tem mais medo de correr atrás da sua felicidade, do que ser infeliz.

- Nossa! – arregalei os olhos ao ouví-la – Acordou inspirada hoje, hein?!

Ela sorriu, comeu seu precioso pão de queijo, tomou um gole do café. Depositou a xícara sob a mesa e continuou.

- Sabe, Laurinha – me olhava carinhosamente nos olhos – Já são treze, quase quatorze anos que nos cuidamos. Eu de você e vice versa. Em todo esse tempo, eu presenciei você correndo atrás da sua carreira e realizações de vários desejos. Conquistou um complexo empresarial. É dona de várias casas, tem uma coleção de carros luxuosos. Tem até um hotel fazenda. Seu currículo é exemplar e, incorporou uma conduta profissional invejável – ela estendeu as mãos e segurou as minhas abaixo das dela - Mas esse brilho no olhar, e esse lindo sorriso estampado nessa face pintada de melanina, fazem poucos dias que vejo. E eu desejo, do fundo do meu ser, que isso sim, vire rotina para você.

- Obrigada, Didi – senti meus olhos se lacrimejarem – É muito bom te ouvir.

- Para além de me ouvir, você tem que se ouvir, Laura – ela continuou – O medo é bom e necessário! Mas você tem que ter medo, é de ser infeliz.

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