🩸 Capítulo 2

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Elisa

Ajeito as pastas debaixo do braço e tento procurar a chave do apartamento no meio da bagunça da minha bolsa. Enfio a mão bem no fundo, afastando diversos objetos, sem sucesso. A luz do sensor do corredor apaga e eu bufo antes de balançar o corpo para a direita buscando que se acenda novamente. O movimento faz com que duas pastas caiam no chão e os papeis se espalhem por todo lado.

— Ótimo jeito de terminar o dia, Elisa! — resmungo comigo, revirando os olhos para a minha sorte.

É impressionante como nos últimos meses o universo ri da minha cara em cada oportunidade que pode. Irritada, agacho-me e apanho tudo de qualquer jeito, aproveitando a posição para virar os itens da bolsa no carpete e procurar o que preciso.

O metal pequeno e amarelado desponta na minha visão e eu o pego com raiva, lembrando-me mais uma vez que preciso comprar um chaveiro grande para facilitar a busca. Assim que recolho tudo e consigo entrar, o silêncio da sala me invade em cheio.

Inspiro fundo, sentindo aquele aperto incômodo no peito. A verdade é que, se eu pudesse, passava as 24 horas do dia na universidade. Nunca gostei de ficar sozinha e essa tem sido uma realidade recorrente na minha vida agora.

Tudo está quieto e monótono do mesmo jeito que eu deixei hoje de manhã. Tiro meus sapatos e jogo a bolsa no aparador, caminhando com as pastas na direção da mesinha no canto da sala. Ainda vou reavaliar alguns relatórios antes de dormir.

O lugar é apertado, mas suficiente para alguém que não divide o ambiente com outra pessoa. Escolhi o apartamento por ser minimamente mobiliado e perto do meu trabalho, necessitando apenas que eu caminhe algumas quadras para chegar. Tem supermercado, farmácia, lavanderia, hospital... tudo próximo.

Quando vim de Nova York para Chicago, há um ano, não trouxe nenhum bem material fora as minhas roupas, meus livros e meu computador. Pelo estado em que me encontrava, seria mais sensato ter voltado ao Brasil, para perto da minha família, só que meu subconsciente implorou para aguentar firme e enfrentar meus medos aqui.

Não é como se meus pais fossem uma família normal, no final das contas.

Coloco os documentos em cima da mesa e sigo para a cozinha a fim de procurar alguma coisa para comer. Depois do almoço só forrei o estômago com uma maça e são quase 22h30 da noite. Sempre que a senhora Moore não está por perto, obrigando-me a descansar e ter uma vida fora da academia, eu perco a noção do tempo nas pesquisas.

Abro a geladeira e observo com certo desânimo as opções saudáveis que a dietista me passou a fim de ajudar na redução dos 20Kg que engordei nos últimos meses. Dietista seria o equivalente a nutricionista no Brasil, assim como a minha profissão de biomédica também é vista de outra forma por aqui.

Geralmente os profissionais que atuam na análise e pesquisa de doenças, para o desenvolvimento de medicamentos e vacinas nos Estados Unidos, não são formados em biomedicina, e sim em áreas de ciência básica, como química e biologia.

Eu terminei a graduação de cinco anos e me especializei em hematologia por dois antes de vir para cá. Passei por todo processo extenso e burocrático de validação do diploma, assim como do visto, e comecei a trabalhar na área de pesquisa, que é onde esse profissional é mais requisitado em solo americano – e também é a minha grande paixão.

Vai fazer seis anos que me mudei e me acostumei tanto que não pretendo voltar, mesmo depois de todas as memórias ruins que criei nesse país.

Pego alface, tomate, pepino e dois ovos da geladeira levando tudo para a pia. Coloco água para ferver a fim de cozinhar a proteína e começo a cortar os demais ingredientes da minha salada quando ouço o celular tocar.

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