O olhar do papai segue fixo em mim, aparentemente ele espera que eu diga algo. Para sua frustração, no entanto, não tenho nada a dizer. Ele está disposto a arriscar a própria vida por um garoto que mal conhece e, muito embora o garoto em questão seja seu filho, não consigo enxergar sua atitude como sendo menos do que estúpida.

Correndo o risco de soar como um puta egoísta, preferiria que Eliza Beene guardasse o seu segredo para si. Odeio a ideia de ter um irmão, de Liam Beene ser meu irmão. Não me importaria se ele tivesse sofrido morte instantânea, pelo menos meu pai nunca saberia que teve outro filho. O curso da nossa vida seguiria inalterado e eu não precisaria duvidar de tudo aquilo que um dia tive como certo. Não precisaria assistir à ruína da minha mãe, ou dividir o afeto do meu pai.

Vai ver a mamãe tem razão, e tanto ela quanto eu não passemos de um fardo que ele se sente na obrigação de carregar porque é covarde demais para largar pelo caminho. Talvez, o tal Liam possa ser tudo que eu jamais fui, o filho perfeito, com uma cabeça perfeita, mais esperto e menos problemático. O filho que ele esperava que eu fosse.

— Está me ouvindo? — sua voz sai chiada. Se inclinando na minha direção, ele põe a mão no meu ombro.

Fico quieto, sem saber o que dizer.

A verdade é que não tenho ideia de como reagir a isso, não fui feito para lidar com esse tipo de situação. Tudo parece tão confuso e fora de lugar, eu nem reconheço mais o homem à minha frente. Okay, ainda é o meu pai, embora pareça mais uma sombra, um fantasma, qualquer coisa, menos o homem que eu costumava conhecer. Pergunto-me qual é o Maximilian verdadeiro, se este que está diante de mim, ou aquele da minha infância. Pode ser que haja um terceiro, um quarto... Infinitos Maximilians. Quantas pessoas diferentes podem habitar um mesmo corpo, afinal?

— Você entende o porquê de eu estar fazendo isso, certo?

Pisco devagar, assentindo com um movimento de cabeça.

Não, eu não entendo, quero gritar. Por que não pode esquecer aquele idiota? Você já tem um filho. Eu. Por que precisa de outro? Eu deveria ser suficiente, cacete!

— Obrigado, filho. Sabia que entenderia. — Expira com força, como se tirasse um peso dos ombros.

Agora ele está falando do seu amor por mim, pelo menos é o que eu acho, suas palavras soam distantes, de forma que não absorvo a maioria delas. Ele reitera que seu amor por mim continua como sempre, inalterado. Que eu sou a melhor coisa que já lhe aconteceu, o melhor filho que ele poderia desejar.

Pode até ser verdade, mas é fácil ser o melhor quando se é o único. Até poucas horas, eu era o único, não sou mais. Liam Beene está às portas, pronto para roubar tudo de mim, inclusive o seu afeto.

Pra falar bem a verdade, preferiria que ele estivesse descansando na gaveta de um necrotério, em vez de no hospital. Que aquela porcaria de carro tivesse seguido capotando indefinidamente, até que ele fosse aniquilado pelas ferragens, esse é todo meu desejo. Mas então, penso na Beene, no seu amor pelo irmão e no que a perda dele faria a ela. Por um instante, quase me sinto grato por aquele infame ter sobrevivido. Posso suportar meu próprio sofrimento, mas não o dela.

Depois de perguntar ao meu pai como ele nunca soube que Liam Beene era seu filho mesmo vivendo em um cubículo onde todo mundo sabe da vida de todo mundo, ele decide abrir o jogo e me contar a história desde o início. Ele fala e fala, parando vez ou outra para checar o relógio. O dr. Karuma ficou de telefonar e, ao que parece, a espera o transformou em uma pilha de nervos.

Tão logo saiam os resultados dos exames, meu pai retornará ao Memorial para dar início aos tramites legais e se preparar para ser fatiado.

Não sei se ele considerou isso, mas viver com um pedaço do fígado a menos não é moleza. O tio do Arran perdeu uma parte do fígado anos atrás, a vida para ele não tem sido a mesma desde então. Não importa o que aconteça, meu pai nunca mais será inteiro de novo.

Viola e Rigel - Opostos 1Where stories live. Discover now