26 | Escolhas

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"Quando eu fiquei tão frio?
Quando fiquei com vergonha?
Onde está a pessoa que eu conheço?
Ela deve ter ido embora com
toda a minha fé."

——————

Merliah

TINHA NOJO DE MEUS PRÓPRIOS PENSAMENTOS. De como eu me reconfortava com a esperança de que Jacob, Seth e papai teriam uma vida longa enquanto eu planejava matar alguém. Alguém não, Calvin. Que apesar de ser um lobisomem, eu não conhecia, não sabia de sua índole e nem ao menos conseguia desprezar. A única pessoa que eu desprezava era a mim mesma, desprezava o suficiente para não conseguir parar de tremer desde que caí na real de que realmente teria que fazer isso.

— Você entendeu o que tem que fazer? — Hans repete, pela terceira vez, já que nas duas primeiras eu não respondi.

Minha cabeça estava em outro mundo, tudo o que eu conseguia pensar é no que eu estava prestes a fazer. Encaro seus olhos que agora estavam num tom mais escuro de vermelho, quase pretos.

— Eu entendi — murmuro em resposta, balançando a cabeça.

Hans se põe de pé e some com uma rapidez à qual eu já estava me acostumando. Já fazia mais de dois dias que eu estava aqui e me sentia minimamente sortuda por ele ser minha companhia. Tirando a parte de me manter refém ele era bem legal.

Faço careta quando ele volta e atira um pacote em meus pés. Com certeza nele havia hambúrguer e batata frita, conseguia sentir o cheiro agradável que saía de lá. Infelizmente meu estômago estava rejeitando qualquer alimento nas últimas horas, acho que ele já sabia o que me aguardava na noite de hoje.

— Precisa comer alguma coisa.

Dou de ombros.

— Eu não estou com fome.

Um suspiro escapa da boca de Hans e ele faz aquela expressão que o deixar um tanto maduro, como se ele tivesse mil anos. Talvez ele tenha.

— Senhorita, se não comer como vai ter forças para fazer o que lhe foi ordenado?

Não quero ter forças para fazer o que me foi ordenado mas se eu não fizer o que aconteceria com o Seth? Com o Jacob? Com a matilha e toda a reserva? Eu nem queria imaginar o que Isabel é capaz de fazer quando está inspirada, ela já me mostrou o suficiente.

— Por que ela faz isso? — pergunto, apertando meu estômago.

Talvez se eu o apertasse bem ele se lembrasse de que faz parte do meu corpo e voltasse a se comportar direito.

— Eu não sei, talvez ela tenha medo.

— Medo de quê?

— De uma situação em que ela não possa controlar.

Me dava um pouco de esperança saber que Hans não gostava do rumo que tudo isso estava tomando. Conseguia ver compaixão em seus olhos vermelhos de sangue, era reconfortante numa situação como a minha. Algo me diz que ele só estava aqui porque se sentia na obrigação de ajudar, suas conversas com Isabel eram sempre calmas, não parecia estar obrigado.

Ou talvez ele só fosse um ótimo ator e na verdade se divertia bastante me vendo definhar nesse quarto escuro.

De qualquer maneira ignoro meus pensamentos quando pergunto:

— Como assim?

— As vezes as coisas acontecem e não há nada que possamos fazer pra impedir. Essas coisas geram marcas e acho que esse é o jeito de Isabel de reverter isso.

𝐌𝐄𝐑𝐋𝐈𝐀𝐇, 𝘵𝘸𝘪𝘭𝘪𝘨𝘩𝘵Where stories live. Discover now