- Não quero que ela se prenda a mim desse jeito, ainda mais agora. - Confesso e sinto a pressão no meu peito dar uma aliviada.

- Ainda mais agora? - Ele pergunta e reviro os olhos quando vejo seu sorriso bobo olhando a tela que acendeu com o que acredito ser uma mensagem da namorada.

- Ainda mais agora que cortaria meu próprio braço para não entrar num relacionamento sério outra vez. - Resmungo e ele volta a mexer no maldito celular.

- Por que isso agora? Você ainda sente alguma coisa por Lilly? - Não posso deixar de notar que seu nariz enruga quando fala o nome da minha ex namorada.

- Sinto sim, nojo e vontade de colocar creme depilatório no vidro de shampoo dela. - Sento na cama esperando que ele olhe nos meus olhos e quando faz, sustento seu olhar e solto o que tem me perturbado há dias. - Lembrei porque saí descontrolado de moto e acabei debaixo daquele caminhão.

- O que?! Como assim?! - Sua expressão surpresa não me deixa dúvida de que ele realmente não sabia de nada.

- Você lembra que eu tinha sido aprovado para a fase de audições ao vivo daquele programa de tv, certo? - Pergunto e ele assente prestando total atenção em mim. Clareio a garganta e passo a mão no rosto nervosamente. - Eu não conseguia lembrar se tinha chegado até a casa de Lilly ou se sofri o acidente no meio do caminho até que há três semanas, mais ou menos, lembrei que cheguei sim na casa dela.

- E isso muda o que? O que isso tem a ver com sua situação com Melanie? - Ele questiona visivelmente confuso e esfrego os olhos com força.

- Tem a ver que eu soube que tinha sido aprovado e fui correndo até a casa de Lilly para dividir com ela a minha felicidade e quase enlouqueci quando vi minha doce namorada chupando o pau do diretor da agência de modelos onde ela tinha acabado de conseguir contrato.- Cuspo e Niall quase deixa o celular cair no chão.

- Puta que pariu, cara. - Niall sussurra e finalmente consigo respirar novamente. - Não vou perguntar se você tem certeza porque seria uma puta babaquice. É inacreditável.

- Agora consigo entender porquê ela foi tão insensível durante o tempo que eu fiquei internado. - Falo e ele assente silenciosamente.

- Eu só não entendo onde Melanie se encaixa nessa história toda. - Ele fala com sinceridade e quase jogo um travesseiro na sua cabeça.

- Não é óbvio? - Pergunto e ele dá ombros. - Se Lilly que estava comigo há mais de três anos foi capaz de me trair, se tornar indiretamente a causa do meu acidente e me largar no hospital, como vou confiar em alguém que mal me conhece e diz estar apaixonada por mim? - Fico encarando meu melhor amigo em silêncio e me surpreendo quando ele mesmo alcança uma almofada e joga no meu rosto.

- Só não te chamo de filho da puta porque amo muito a sua mãe. Cara, você enlouqueceu? Está usando algum tipo de droga ou ficou viciado nos remédios que tomou no hospital e agora está tendo crise de abstinência? - Seu sotaque se torna mais evidente e posso dizer que ele está absurdamente irritado. Coloco a almofada no canto da minha cama e fico esperando a enxurrada de ofensas que posso vê-lo criar em sua cabeça. - Harry, até um cego conseguiria enxergar o quão puro e o tamanho do amor que ela tem por você. Se está acontecendo alguma outra coisa e você não consegue abrir seu coração para ela, tudo bem. Só não coloque a garota no mesmo patamar que Lilian porque cara, elas estão em níveis absurdamente diferentes.

- Tá vendo? É isso que eu não entendo, fiquei anos com Lilly e ninguém nunca gostou dela mesmo sendo minha namorada. Aí de repente minha família inteira se apaixona por uma garota que surgiu do nada e não querem que ela seja machucada? - Pergunto com deboche e Niall respira fundo passando a mão no rosto.

- Não foi de repente que nos "apaixonamos" por Melanie. Ela passou nove meses, Harry, nove fodidos meses ao seu lado sem ao menos saber a porra da cor dos seus olhos. Ficou dias, noites e sei lá quantas madrugadas numa cadeira de plástico desconfortável e com uma esperança infindável de que você acordaria bem. Ela pediu para o tio dela que é médico, mas nem trabalhava naquele hospital, para se infiltrar naquele lugar e cobrar alguns favores para conseguir acesso a você em qualquer momento. Quando as coisas apertaram para tia Anne quem arcou com os gastos da cirurgia reparadora do seu tornozelo e sei lá quantas mais você precisou fazer foi ela, quem ficou com você após cada mínimo procedimento cirúrgico porque tia Anne precisava descansar foi ela, quem cuidou da sua irmã quando sua mãe precisou viajar em busca de novos clientes para imobiliária foi ela, quem esteve ao nosso lado sem pestanejar nem pedir nada em troca foi ela! Então meu amigo, não venha desdenhar de tudo o que aquela garota fez por você, por nós, durante esse tempo porque se teve alguém entregue de coração e alma a você, esse alguém foi ela. - Meu melhor amigo termina de falar com o rosto vermelho e tudo que posso fazer é respirar fundo tentando não chorar quando a verdade é exposta na minha cara feito a luz do sol.

- Eu não sabia disso. - Sussurro com um nó na garganta que quase me sufoca.

- Claro que não sabia! E nem deveria saber já que Melanie nos fez prometer que isso nunca seria colocado em mesa em hipótese alguma. Você precisa acordar, cara. Está perdendo uma garota maravilhosa porque está ressentido com uma pessoa que como você mesmo disse, foi capaz de te trair, ser causa do acidente que quase tirou a sua vida e te abandonar no hospital. - Ele levanta colocando o celular no bolso me olhando com o pior sentimento que um ser humano pode sentir por outro: pena. Ele põe a mão sobre o meu ombro dando um leve aperto e me olha diretamente nos olhos antes de falar. - Se depois disso tudo você ainda tiver alguma dúvida em relação aos sentimentos de Melanie por você e os seus por ela, como seu melhor amigo e alguém que aprendeu a respeitar e amar aquela garota, seja verdadeiro e deixe que ela siga a vida dela sem você.

Meu melhor amigo diz isso e me deixa no quarto de hóspedes sentado na cama encarando a chuva que começou a cair pela janela. Não demora dois minutos para que as primeiras lágrimas se forcem para fora dos meus olhos e o primeiro soluço suba até minha garganta me fazendo pensar em tudo o que já vi até agora. A sensação de perda é maçante e quase não consigo conter a culpa que volta a pressionar meu coração feito uma parede de concreto. Tenho vontade de destruir esse quarto em mil pedaços mas sei que isso não vai diminuir a dor que está me tirando o fôlego. Como eu fui capaz de duvidar de alguém que sempre demonstrou acreditar na minha melhora, teve paciência, demonstrou ter esperança e deu força mesmo quando tudo parecia perdido?

Não sou esse cara, me recuso a me tornar esse tipo de pessoa. Levanto da cama ainda chorando e visto um casaco de moletom antes de pegar meu celular. Digito com dificuldade uma mensagem para Iris e quando ela responde mesmo a contragosto, anoto o endereço num pedaço de papel e saio de casa debaixo da chuva torrencial esperando que ela seja capaz de lavar e levar para longe todo resquício de dúvida e sentimentos ruins que foram quebrados e transformados em cinzas com as palavras do meu melhor amigo.

A chuva gelada me atinge sem piedade e a lembrança vívida de uma conversa que eu tive com meu pai quando eu era um menino me faz querer gritar de ódio por mim mesmo. A cada passo que dou quase posso ouvir meu pai me respondendo com carinho quando perguntei o que era amor. Lembro de seus olhos brilhando enquanto ele recitava um versículo bíblico que dizia perfeitamente o que hoje finalmente consegui enxergar que Melanie sente por mim. Me permito chorar enquanto lido com o medo de ter perdido a única pessoa além da minha própria família que já demonstrou que realmente sentia aquele amor que meu pai me contou um dia.

"O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece. Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal; Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade; Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta." Repito incansavelmente até chegar na frente da casa iluminada de Melanie. Sem fôlego e com minha perna doendo até os ossos, apoio a testa na madeira escura esperando que o amor de Melanie seja realmente grande e forte o suficiente para me perdoar e me ensinar a amá-la da mesma forma que ela me ama.

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