i heard you on rádio.

140 16 21
                                    


Apenas não parecia real.

A voz, no rádio. Era... doce, calma, vinda de terras distantes onde sonhos foram apagados como cigarros na calçada — daqueles que desejamos tomar de novo, que em uma vez já foram olhos fluminescentes de demônios no breu que em uma, uma vez, já esquentaram os dedos frios e austeros perante o gélido do ar, e a premissa de que algo faltava, de que algo faltaria.

Era ele, apenas ele.

Voltando às suas memórias como um fantasma no batente da porta, os cílios que piscavam em cumprimento doce, doce, e o esquecimento nunca dado perante ao monótono cotidiano dos dias em que a única palavra perene era seu nome.

Taehyung parecia tão distante. Num véu de Maia sob suas memórias; era belo, encantador. O fazia querer estender suas mãos ao puro nada, às 6:30 de uma manhã morna e nada sã, monótona, fria, sem cor — como todos dias. Mas não, não.

Agora prevalecia a cor da falta dele.

Que se incrustava em cada mínimo canto e fresta, pousava em seus lábios secos mesmo após um gole amargo de café  — esquecera de pôr açúcar, por ele. Ele. Ele.

Se sentia desvanecer. Doente. Tudo por causa dele. Por uma maldita voz no rádio, por uma gloriosa voz no rádio que de repente lhe dera o vislumbre empoleirado de seus dias juvenis e adocicados, reminiscência adorada, adorada, adorada como o sol cálido que não se pode tocar, levar dedos à espreita por medo. Tanto medo. De lembrar, de esquecer. De não sentir nunca mais. De olhar para os olhos dele, e não ver nada. De não sentir nada. De sentir, e muito. De querer correr, e se paralisar enquanto sente tudo doer. De amor.

Como espécime de Petra Von Kant paralisado em meio a uma cozinha, já prevendo os passos a serem dados a uma varanda cinza e distinta de cor, observando a calçada suja ou limpa demais do dia, pensando em quando passara com ele e no modo em como ele tocava suas mãos — tão gentil, cuidadoso, palma com palma e uma vida genuína, diáfana, pulsando ali, como uma pluma suave, suave, e ele soubesse de todo o encanto subjacente de dar as mãos daquela forma tão vagarosa e majestosa, todo um requinte da natureza perfeita por ser e, sendo, lhe era como um beijo adocicado e genuíno na bochecha.

E tocou nela, naquela hora, na cozinha fria. Passou os dedos por ali, se perguntando se haveria de fato ocorrido. Se o véu de Maia não incrustara em suas pupilas e o que foi não era, não como era de verdade, não como haveria de ser se o visse novamente. Naquela cidade de ninguém. Ele estava lá. E iria falar, passar por lá para falar com ele, talvez?

De Jane, dele, dos shows, com sua voz grossa e melódica ressoando por seus ouvidos que apenas se deleitavam sem pressa alguma.

Céus.

Queria o ver.

Um querer de olhar para a janela e ver o mundo lá, lá fora, e erguer a mão — sempre erguendo a mão à espera de algo, tolo. — naquele ato intocado, etéreo por inteiro apenas pelo desejar não realizado.

Deve se aprender a Amar sem exigir, Petra disse, na cama, após uma ressaca de amor e sua ausência presente e dolente. A amar sem exigir.

Jimin nunca exigiu nada. Talvez esse fosse o problema.

E olhar para trás, olhar para o véu, para a fumaça velejante sob seus olhos com odor de amor amortecido sob a palma da mão — doía.

Fechou os olhos, talvez convicto demais que aquele mero ato tivesse todo o simbolismo restante perante ao suspiro da memória, de que ainda havia algo dentro de si inteiro, palpável, um cordão prateado com certo fulgor das estrelas que uma vez já insistira tanto para pararem nas calçadas para observar, enquanto um hálito cheio de álcool e precipitações juvenis de dois rapazes se misturavam no frio da noite. O riso, os olhos genuínos, a aproximação lenta e certa diante a ele, ele. E as bocas que se bateram naquele dia, e nas semanas que se passaram, no intervalo gasto em uma lanchonete, no cinema casual e nos fatídicos ensaios da banda em meio a uma garagem com odor de pó, mesmo que não tivesse nada a ver realmente com aquilo, mas sentia a suprema e imponente atração; de olhá-lo, de querê-lo junto a si, de tê-lo entre as mãos e ouvir aquela voz, aquela voz que era puro veludo cósmico para quem aspirava de sabores devaneantes a primeira vez. Inesquecível.

E ainda havia, ali, em meio a um certo lugar onde não se sabia aonde, que pertencia ainda ao Kim. Inteiramente, centímetro por centímetros aquela porção onde residia sua sanidade e o que denominava como saudade. Pertencia a ele.

E a quem mais seria?

Era... estrelas no céu, véu de veludo que era voz em terra, fumaças imaginarias sobre um alguém que ainda poderia-lhe tirar todo o respirar vitalício de si, seria apenas belo demais para que não se deslumbrasse em meio ao flutuar do feitiço, aquele maldito feitiço, aquela pequena porção de si que residia saudade, saudade e saudade que o fazia estender a mão às 6:50 da manhã e desejar.

Desejar que ele estivesse lá.

E que perguntas vagarosas pudessem ser feitas, que o véu se desvanecesse, ou então que não fizesse nunca, nunca, nunca e que acima de tudo pudesse olhá-lo. Que sua voz nunca mais saísse do rádio.

MY PLANTS ARE DEAD | VMINOnde histórias criam vida. Descubra agora