— Eu... é que... Bom, estava com saudade de comer um bolo de chocolate. Perguntei por alto para a Elga se tinha os ingredientes, ela me falou que sim, mas, por favor, não brigue com ela. Provavelmente imaginou que a pergunta era para que ela fizesse o bolo para mim.



— Então, por que não pediu a ela? Elga é a cozinheira aqui.


— Sei disso, mas estava com saudades de fazer algo bom e prazeroso. Eu amo bolo de chocolate com morongo, mas não comi mais desde que a minha mãe morreu. Sei que, se eu dormir, vou voltar a ter pesadelos, preferi empenhar o meu tempo e meus esforços em algo melhor e menos aterrorizante.


— Entendi. — Não mudei a minha postura. Queria brigar com ela, dizer que não poderia simplesmente invadir a cozinha e fazer o que bem entendesse, porém, lembrei-me da forma como o pesadelo havia a deixado aterrorizada na noite anterior e desisti de repreendê-la. Que mal tinha querer fazer um bolo?

— Gosta de bolo de chocolate com morango?


— Prefiro os que têm calda.

— Você é sempre assim? — questionou-me, mas percebi que o seu sorriso havia aumentado.

— Assim como?


— Implicante com tudo.


— Não implico com tudo.


— Implica sim.


Dei de ombros, ignorando-a. Não iria ficar discutindo como se fossemos duas crianças. Terminei de entrar na cozinha e puxei uma banqueta de madeira, sentando-me nela.


— Vou fazer a calda de chocolate, também prefiro com.


— Okay! — Mantive os braços cruzados e o olhar firme nela.


Ela pegou uma panela em um dos armários e percebi que os ingredientes já estavam separados sobre o balcão. Será que Elga havia deixado para ela ou a própria Any havia ido buscar na dispensa?


— Não é solitário morar sozinho nesse castelo?

— Tenho vários empregados.

— E a sua família? Não é casado?

— Acha que eu estaria num lugar como aquele onde nos encontramos se eu fosse um homem casado? — Mantive o tom frio, mas, dessa vez, Any não se encolheu diante da minha resposta ríspida.


— Faz sentido. — Esboçou um sorriso. — Sabia que vendiam mulheres?


— Claro que não! Achei que eram apenas putas e um sexo diferente.


— Não sou uma puta.

— Não estou me referindo a você.

— Obrigada mais uma vez por ter me tirado deles.


Apenas dei de ombros, sem uma resposta objetiva. Não havia feito aquilo pela gratidão dela nem de ninguém, apenas por seguir um impulso idiota da minha consciência.


— Quantos anos você tem? — Era difícil não olhar para ela e pensar que era uma menina, por isso tantos idiotas naquele clube haviam ficado alvoroçados quando colocaram os olhos nela.


— Dezenove — respondeu sem ressalvas enquanto rebolava ao mexer levemente o conteúdo da panela. — E você?

— Eu?

— Sim! Perguntou a minha idade, eu quero saber qual é a sua.


— Vinte e nove.


— Dez anos mais velho que eu. Quando faz aniversário?

— Se concentra no seu bolo, menina. — Mostrei os dentes para que ela percebesse que não estava disposto a trocar informações íntimas.


— Está quase pronto. — Desligou o fogão, reservou a panela e pegou um garfo, fazendo alguns furos na massa fofa do bolo antes de despejar a calda. — Eu faço aniversário em Outubro. Dia nove de Outubro.


Não respondi, indiferente a informação que ela havia me fornecido. Não havia a comprado para ganhar a amizade de uma fedelha.



Any cortou um pedaço do bolo e serviu para mim em um pequeno prato. Era simples, sem muitos confeitos, apenas massa e uma fina camada de calda, mas estava saboroso o suficiente para que eu comesse todo o pedaço e tivesse vontade de repetir.

— Quer mais? — Parou na minha frente, estendendo as mãos.


Elevei o prato para ela e nossos dedos se tocaram. Ignorei a aproximação até perceber que as bochechas dela estavam coradas. Soltei o prato, por pouco ele não escorregou por entre os dedos dela e caiu. Levantei do banco e fui até a geladeira, lembrando-me do motivo pelo qual havia descido até a cozinha. Enchi um copo com água e tomei tudo de uma vez, depois coloquei o copo na pia.


— Não deixa a cozinha bagunçada. — Dei as costas e voltei para o meu quarto sem dar brecha para que ela pudesse conversar comigo, já havia falado demais sobre mim para uma desconhecida.



Só precisava dormir um pouco, e assim que Wallace desse um jeito, Any iria embora e minha vida voltaria a ter o sossego de antes.



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Comprada por JOSH ( ADAPTAÇÃO )Where stories live. Discover now