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Tobio Kageyama...

No primeiro mês que se sucedeu ao acidente, eu fiquei no hospital, e era frequentemente atormentado por pesadelos horríveis, mesmo que as pessoas a minha volta tentavam ser positivas eu sabia a cada fim de fisioterapia, que nunca mais iria ter a mesma mobilidade de antes e que isso quebraria tudo que eu construí no vôlei. Mas claro, que eu não queria transparecer a dor que guardava no fundo da minha mente, mas pensamentos ruins são como uma pequena rachadura em uma represa, você ignora até que a negligência faz mais e mais rachaduras aparecerem, a água precisa sair de algum modo, assim como a dor e meus sonhos foram o meio que os demônios encontraram para despejar meus temores.
    
Eu repetia todos os dias o momento que fui atingido, as vezes sentia como se eu tivesse morrido e estivesse em uma das camadas do inferno, tendo como punição reviver meu pior pesadelo, pela eternidade, mas sempre que eu abria meus olhos, era recebido pelas paredes brancas do hospital, e um corpo inútil parado na cama... Meu próprio corpo inútil.
    
Por mais que as vezes eu passe semanas sem nenhum sinal desses pesadelos, de vez em sempre eles voltam em seu sussurro maléfico, me puxando para uma realidade que eu não queria estar. Não quero dormir, pois eu não quero lembrar... Por isso, me ocupei em continuar fazendo as anotações para treinar o Hinata, já que despertei no fim da tarde, consegui ficar tranquilamente a noite e a madrugada na frente do computador, sem cair nos braços de Morfeu.
    
Olho para o relógio e vejo que ainda tenho tempo para fazer um café da manhã e comer tranquilamente... respiro fundo e jogo minha cabeça para trás com os olhos fechados, a cadeira na qual estou sentado se mexe com meu movimento.
- Café... - abro os olhos  quando me vem na cabeça a cafeteria que fui com o Hinata aquele dia. Olho mais uma vez para o relógio.
    
Eu quero vê-lo... derrepente minha mente é preenchida pela vontade incontrolável de ver o Hinata, como se o sorriso dele nesse momento fosse o remédio mais potente contra tudo que me atormenta.
    
Se eu sair um pouco mais cedo de casa, eu posso esperar no meio do caminho que sei que ele faz... Mas, se eu convidá-lo para tomar café da manhã comigo, será que ele irá aceitar?
- Não... o que eu estou pensando?
    
Suspiro fundo. Sinto que estou sendo invadido por um sentimento estranho, que mexe com cada pequena parte minha, até aquelas que eu não sabia que existiam. Eu estou animado por poder passar um tempo com ele depois da aula, por mais que eu não seja capaz de dizer essas palavras em voz alta, meu peito se agita sem aviso prévio apenas de pensar nessa possibilidade, me pego pensando em vê-lo mesmo que eu tenha acabado de chegar em casa, ou na aula que sem querer meu olhar pousa no alaranjado, como uma brisa de outono que me faz arrepiar, seu olhar me faz tremer sempre que encontra meus olhos nos seus.
    
Balanço a cabeça em negação, tentando levar embora esses sentimentos e pensamentos indevidos. Passo a mão na minha perna que está com um leve desconforto antes de me levantar e seguir a passos lentos até a cozinha.

Shoyo Hinata...

Quando acordei já era um pouco mais tarde que o normal, e quando olhei em meu celular vi que o Nishinoya havia me ligado várias vezes e mandado mensagem, falando que cansou de me gritar na porta e já foi para a escola. Levantei rapidamente e tirei o pijama e coloquei o uniforme, escovei meus dentes rapidamente e logo peguei a mochila. Não vai dar tempo de tomar café da manhã, então apenas corro até a escola.
    
Passo pelo portão e corro pelas escadas, já estou quase chegando no corredor quando ouço a voz do professor de matemática que dará a primeira aula hoje na minha sala, olho para trás e vejo que ele está falando com um aluno do corredor debaixo. Agradeço mentalmente o estudante por pará-lo, me dando tempo de chegar na sala antes.
    
Olho para dentro da sala, onde todos já estavam sentados. Minha respiração está ofegante, e alguns olhares curiosos olham para mim, dentre esses olhares um chama a minha atenção em particular, o par de safiras delirantes queimam meu olhar do outro lado da sala, abro um sorriso e levanto a mão em um cumprimento.
- Vem logo para o seu lugar - escuto a voz do Tsukishima, olho para o mesmo e assinto, logo já estou no meu lugar, onde sento e coloco minha bolsa, tentando ao máximo normalizar minha respiração- O que aconteceu?
    
Dou de ombros.
- Perdi a hora.
- Irresponsável- me viro para o loiro e mostro a língua, o mesmo apenas revira os  olhos, me fazendo rir.
- Bom dia alunos- o professor acaba de entrar na sala, segurando uma xícara de café e está com uma expressão de cansaço,  que já é uma característica marcante dele.
    
Endireito minha postura e tiro algumas coisas da bolsa, quando sinto uma sensação de que estou sendo observado. Por instinto meu olhar se volta na direção do Kegeyama que me olhava, vejo seus lábios entreabertos como se ele quisesse me perguntar algo, mas logo se fecham. Franzo a testa... será que ele quer saber o porquê eu me atrasei?
    
Pego meu caderno e abro o mesmo. Acho improvável que ele esteja preocupado com algo assim... Mas, não posso deixar de desejar secretamente que ele tenha notado minha ausência e ficado preocupado, já que isso quer dizer que ele se importa comigo... Olho de relance para o moreno que está concentrado na aula  e sorrio... da mesma forma que eu me importo com ele.
   
A medida que a aula avança meu estômago parece se revirar cada vez mais, já que estou acostumado a tomar café da manhã todos os dias sem exceção, é natural que meu corpo sinta a falta do alimento. Apoio meu rosto em meu braço e viro meu rosto em direção ao outro lado da sala... espero que não demore para que esta aula acabe.

Do outro lado da rede *Kagehina*Onde as histórias ganham vida. Descobre agora