Capítulo XXII- O fim do começo ou começo do fim

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Kate

O frio ainda estava presente com toda a sua intensidade. Agora já não podíamos passar mais tanto tempo ao ar livre. Nossas idas à praia também ficaram restritas e até mesmo permanecer no jardim era um teste de resistência.

A grande maioria das flores estava coberta sob uma considerável camada de neve. As poucas sobreviventes não durariam muito mais do que alguns dias e ainda faltavam semanas para o inverno acabar.

Era adorável receber descrições minuciosas sobre o aspecto e a aparência das coisas ao redor. Embora eu gostasse bastante de escutar e perceber os esforços de Mary, Joseph e de Alec, as narrativas que mais se aproximavam da realidade eram as de Daniel. Era inacreditável a sensibilidade de um menino tão pequeno. A pureza e inocência dele não o impediam de captar a essência das coisas.

Ele conseguia me fazer visualizar na minha mente cada ínfimo detalhe dos lugares, da paisagem e dos acontecimentos diante de mim. Claro que ajudava muito o fato de eu ter gravado na memória o relevo, o clima e a disposição da decoração da casa e das mudanças sazonais da natureza de Lynton durante os anos de minha infância.

Mesmo tendo passado tantos anos eu podia perceber que as transformações ocorridas ao longo do tempo não significavam muito. Ainda haviam as mesmas árvores plantadas no bosque, elas continuavam produzindo seus frutos saborosos, a brisa marinha permanecia com o mesmo aroma de maresia, ainda existiam as mesmas trilhas que levavam a praia semi particular e quase deserta e certamente as variações de temperatura alteravam-se conforme o mesmo cronograma natural.

Portanto, meu lar não havia perdido sua magia. Eu ainda me sentia em casa, amparada e protegida como quando era uma garotinha. E testemunhar o contentamento de Daniel por poder fazer uma disputa de bolas de neve, uma corrida através da margem do pequeno lago no centro bosque e brincar de esconde-esconde permitindo que eu o encontrasse algumas vezes, mesmo que eu não precisasse de sua vantagem para ouvir seus passinhos ligeiros e sua risada infantil enquanto se esgueirava para o cômodo mais próximo ou atrás de um arbusto.

A verdade é que eu permitia que ele tivesse a sensação de que estava me ajudando a participar das brincadeiras. Por isso pedia-lhe que segurasse minha mão e me levasse aos seus cantinhos preferidos, que me mostrasse suas descobertas e me descrevesse cada um de seus brinquedos enquanto eu os tateava. Saber da confiança do pequeno e saber que o amor entre nós aumentava conforme passávamos tempo juntos era uma grata satisfação. A verdade é que eu faria tudo ao meu alcance para que ele tivesse os melhores momentos em família assim como tive na companhia dos meus pais e de Mary e Joseph.

Eu amava contar a ele sobre as minhas vivências quando estava com sua idade. Demostrar como foi construtivo para minha personalidade receber carinho, amor, atenção daqueles a quem eu devo minha vida e muito mais.

Afirmar  a todo momento o quanto Daniel era amado e importante, deixá-lo criar suas próprias aventuras e ajudá-lo a construir seus castelos de areia, montar seus cenários para as representações das histórias imaginárias, participar de suas conquistas e consolá-lo e ampará-lo em suas perdas, nos momentos de quedas soprando-lhe os arranhões, secando suas lágrimas, o ajudando a se levantar e continuar a brincadeira.

Isso era uma das coisas mais prazerosas da minha vida. Ter um filho, uma pessoinha totalmente dependente de mim, carecendo da minha atenção e sob a minha responsabilidade era algo novo, incrível e maravilhoso. Me fazia sentir mais útil, necessária e insubstituível. Para Daniel eu era o centro da sua atenção e de seu afeto assim como ele era o meu.

Como era bom estar entre pessoas amadas, queridas, acolhedoras, sinceras e maravilhosas, que fariam tudo ao seu alcance para me fazer sentir bem. Até mesmo tentar compensar minha falta de visão.

Além do que os Olhos Podem Ver...A Luz do teu olharWhere stories live. Discover now