○40. - Escotilhas

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(ilustração - Naomi)


 As aves voam baixo no céu noturno. O vento úmido traz o cheiro de chuva.

Aos poucos, o sentimento de guerra penetra no peito de cada um. Estão todos no mesmo barco. Os murmúrios em apoio à Alex vêm crescentes como uma onda prestes a quebrar. Não há tempo a perder.

Naomi escancara o mapa do bunker na terra úmida, iluminando apenas o papel com uma lanterna. Ela repassa todo o plano de Júlia para os que se dispõe a ouvir. Estratégias começam a ser formadas, armas improvisadas e forjadas. Os grupos vão consensualmente se formando em silêncio.

Luís, o homem do grupo de caça, distribui todo o armamento para aquelas pessoas, ensinando-os a manusear uma arma, uma faca, um rifle. Nas mãos de alguns, o acessório cai perfeitamente como se os completasse.

— Não deveria ir. - Diego se abaixa ao lado de Júlia, que até então encara a vegetação aos seus pés.

Ela sorri com ironia.

— Estou cansada disso, Diego. Ninguém quer que ninguém vá.

— Você não está com cabeça...

— Pelo contrário. Minha cabeça está exatamente onde deveria estar. - Ela não sustenta o olhar do amigo.

Ele pensa em parar por ali, dando o espaço que ela pede, mas insiste. Pega a mão da amiga, que finalmente o olha nos olhos.

— Você está grávida, Ju.

— Eu nem sei mais se estou. - Ela ameaça chorar de novo, mas suas lágrimas secaram. Deveriam ter sido o suficiente para encher uma piscina.

— Sabe sim.

Ela sabe. Coloca as mãos no ventre. De algum modo, sabe.

— Cuida dessa criança.

— Não vou deixar vocês irem sem mim, Diego.

—Não vamos sem você. - Ele tira o walk talk da mochila, o girando entre os dedos antes de estender a ela. - Consertei. Temos três agora. Fica do lado de fora, lidera seu povo, passe confiança. Quando o portão abrir, vocês partem pra ofensiva na linha de frente.

Ela respira fundo, mas concorda.

— Cuidado. - É seu jeito de agradecer pela preocupação. Por mais que queira apenas ficar sentada em seu canto esperando que tudo acabe logo, as pessoas daquele grupo esperam que ela se mantenha forte.

Ela se levanta, apoiando as costas no tronco do jatobá, e caminha no meio da multidão agitada, mostrando que nada a botará no chão de novo.

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Com os grupos separados, dois representantes de cada rondam o mapa no chão, escrevendo os códigos necessários com fracos cortes superficiais de faca no antebraço. Qualquer outro meio de escrevê-los, usando lama ou o que quer seja - seria frustrado pela chuva que se aproxima.

Júlia volta a tomar a liderança. Se encarrega do grupo A, o grupo que fará barulho. Do grupo B, Maia e Diego rabiscam os números no braço. Do C, Naomi e Alex fazem o mesmo.

Quando o mapa é finalmente guardado, o sentimento de estarem indo para a guerra aumenta. Cada um o sente de uma maneira.

Lídia puxa Maia de canto. Uma última conversa antes de se separarem.

— Ainda não agradeci por me ajudar com Miguel. - A ruiva sorri tristemente. - Vou deixá-lo aqui com um pessoal que vai ficar pra trás com as crianças e feridos.

Depois da RuínaWhere stories live. Discover now