A bem da verdade

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— Nossa, bisa! E depois?
— Lembra que o Pedro ficou muito rico quando desenterrou o balde cheio de moedas de ouro da alma penada?
— Lembro muito bem. Ele ficou milionário, mesmo tendo distribuído metade do dinheiro aos pobres.
— Pois é! E, quando voltou do passeio no céu e no inferno, sua primeira providência foi dar a outra metade aos necessitados. 
— Virou pobre de novo, bisa?
— Pobre como sempre viveu.
— Bisa, a senhora está chorando?
— Estou — confirmou ela, enxugando as lágrimas com as pontas dos dedos.
— Por quê, bisinha linda?
— Porque a história do Pedro terminou.
— Ele morreu?
— Morreu nada, meu filho — disse ela, reanimando-se e afagando meus cabelos. — Ele sempre viverá como uma lenda viva, pois é o herói predileto dos simples. Ele é um personagem que encanta gerações e gerações. Vive há séculos enfeitiçando as pessoas, por meio de suas histórias, em muitos países do mundo. Inevitavelmente, quando uma pessoa conta ou conhece um caso de alguém muito astuto, logo atribui ao Pedro Malasartes o papel de protagonista da história.
— A senhora conheceu o Pedro de verdade, bisa?
— Não, meu amor! A bem da verdade, também somos personagens, que o escritor deste livro inventou para conduzir a história.
— Então, não sou o futuro escritor contando minhas memórias de menino, nem a senhora é minhá bisa?
— No mundo da ficção, sempre serei sua bisa e você meu bisneto querido. Mas este escritor nunca conheceu nenhuma das suas quatro bisavôs. Não teve esse privilégio. Sei que ele gostaria muito de ter conhecido pelo menos uma, que se chamava Ana Bárbara.
— Nome bonito, bisa!
— Se você quiser, esse pode ser o meu nome.
— Bisa, estou pensando...
— Pensando o quê, querido?
— Que o escritor se inspirou no Pedro Malasartes e enganou a gente.
— Não, meu amor. Os escritores são assim mesmo: inventam histórias. E as pessoas fantasiam que são verdadeiras.
— Bisa! — exclamou o menino com a voz presa de tristeza.
— Que foi, meu amor?
— Conte a história da bisa do escritor que se chamava Ana Bárbara.
— Essa é outra história. Agora, preciso entrar, que esse vento daqui da varanda desarrumou todos os meus cabelos. Se você se alegrar, faço pipoca.
— De verdade?
— Verdade verdadeira.
E foram os dois, deixando a varanda e a alma do escritor vazia.

Aventuras de Pedro MalasartesOnde as histórias ganham vida. Descobre agora