Os cegos pedintes

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Com a fome colando o estômago nas costas, um dia Pedro estava sentado no banco da praça. Em frente dele, havia dois cegos músicos e pedintes que, em vez de tocarem, só brigavam.
— Por que parou de tocar, Zé?
— Você desafinou, Raimundo.
— Eu?
— Você mesmo.
— Então toque, que eu acompanho.
O Zé pegava sua viola e começava a tocar.
— Raimundo!
— Que é, homem de Deus?
— Você não vai me acompanhar?
— Deus me livre! Você toca sem ritmo. Desse jeito ninguém nos dará esmola.
— Então, toque você essa viola sem corda.
— Pior é esse seu bumbo furado.
A briga sem-fim dos dois, mais a fome que sentia, começou a irritar o Pedro. Cansou tanto, a ponto de resolver dar um jeito naquilo. Aproximou-se dos músicos e blefou:
— Ei, pessoal, estou colocando aqui uma nota de dez para vocês. Mas quero ouvir música e não bate-boca.
Imediatamente os dois cegos começaram a tocar que foi uma beleza. Ao fim do repertório, o Zé passou a mão em sua baciazinha e, como não encontrou a nota, exigiu do Raimundo:
— Dê a minha parte da esmola.
— Tome vergonha, Zé! Foi na sua bacia que o homem colocou a nota.
— Foi na sua.
— Quer me roubar, Zé?
— Ladrão é o porqueira do seu pai, Raimundo.
— O vagabundo do seu.
— Não fale assim do meu pai!
— Digo quanto quero.
— Mas não vai dizer mesmo.
E a briga virou pancadaria. O Zé arrebentou a viola nas costas do Raimundo. O Raimundo vestiu o Zé com o bumbo, batendo-o com força em sua cabeça.
Em meio à confusão, o Pedro gritou para eles:
— Cuidado com a faca!
Cada um pensando que o outro estivesse armado, os dois saíram correndo para lados opostos. Então o Pedro foi até as baciazinhas esquecidas pelos dois, ajuntou os trocados, comprou um pão e matou a fome.

Aventuras de Pedro MalasartesOnde as histórias ganham vida. Descobre agora