Capítulo 34 - Rock

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Escuto alguém se aproximar e sem precisar olhar, eu sei que é Abby. É engraçada a forma como meu coração acelera e todo o meu corpo parece flutuar com a mera presença dela. Eu nunca pensei que pudesse ser o tipo de pessoa que se alegra em simplesmente estar perto de outra, mas recentemente descobri o contrário.

Assim que ela aparece em meu campo de visão eu sinto que há algo de errado. Ela me encara como se eu fosse um desconhecido. Seus olhos sempre tão gentis me encaram com certa hostilidade e eu me preparo para o que está por vir.

— Eu preciso falar com você — ela diz com dificuldade e desvia os olhos para a máquina de supino que eu estou usando.

O modo como sua voz sai frouxa me atinge e imediatamente eu libero a máquina sem me importar em terminar o exercício antes de guiá-la para um canto vazio próximo aos espelhos. Ninguém parece nos notar, mas não consigo ignorar a sensação de estar sendo observado. Eu deveria estar no campo treinando com meus amigos, porém ninguém demonstra saber o motivo de eu estar aqui ou simplesmente não se importam. Até essa manhã eu não fazia ideia do quanto me acostumei a estar sempre acompanhado por meus colegas de time e acabei percebendo que ao longo dos anos jogando juntos eles acabaram se tornando minha família.

— O que foi? — Pergunto ao mesmo tempo em que tento ignorar o fato de ela estar olhando para qualquer canto menos para mim. Tenho a sensação de que não vou gostar do que ela está prestes a dizer e quando ela finalmente ergue o rosto eu noto a expressão frustrada que carrega.

— Eu pensei em vir explicar o motivo de eu ter saído daquele jeito na sexta depois do que aconteceu... — Suas bochechas ganham um tom intenso de vermelho que a deixa adorável, mas eu me concentro no que ela diz ao invés de apreciar o rubor cada vez mais intenso em seu rosto. — Eu queria te dizer que você não teve nada a ver com aquilo, mas quando eu estava vindo para cá ouvi uma coisa e agora não consigo deixar de pensar que talvez eu tenha me enganado ao seu respeito.

Droga.

Após ouvir suas palavras eu finalmente compreendo o motivo dela parecer decepcionada. Ela sabe sobre o boato. De alguma maneira ela descobriu antes que eu tivesse a chance de lhe contar.

— Eu posso explicar...

— Não — ela ergue uma mão para me calar e se retrai ao encostar os dedos em minha boca. Pensando melhor, Abby puxa as mãos para trás das costas. — Eu não quero que você diga nada porque você vai encontrar alguma forma de me fazer acreditar que não tem culpa. Você vai achar o meu ponto fraco e se aproveitar disso como... como o Andrew fez várias vezes.

Dessa ver eu solto um palavrão alto o suficiente para atrair alguns olhares.

— Eu nunca faria isso — digo com convicção.

Procurando confirmação, Abby olha direto nos meus olhos e eu sustento o olhar o maior tempo possível. Deixo todas as barreiras que construí caírem e torço para que ela enxergue tudo que existe dentro de mim, incluindo os defeitos e as coisas que eu jamais falaria. Seus lábios se abrem, mas não emitem nenhum som.

— Abby, você precisa acreditar em mim. Eu nunca faria nada para te machucar e você também jamais iria permitir que eu o fizesse.

— Você não pode ter certeza — ela pisca algumas vezes e sua tentativa de evitar chorar acaba abafando sua voz. — Nós dois sabemos que eu fiz isso uma vez. Vai ser muito fácil que se repita.

Uma lágrima corre por seu rosto e ela rapidamente a enxuga. Apesar de soar frágil, Abby nunca pareceu mais confiante. Com os ombros eretos e o queixo erguido ela passa me passa a imagem de uma mulher pronta para enfrentar seus fantasmas e eu me surpreendo pelo simples fato de ela ser a única que não enxerga isso. Passo um dedo pelo rastro que a lágrima deixou, aproveitando a chance de tocá-la. O modo que sua pele esquenta debaixo de meu dedo revela que ela aprecia a proximidade tanto quanto eu e imediatamente sou inundado com lembranças da noite de sexta-feira.

Um olhar para o amorWhere stories live. Discover now